A organização dá força à luta
As duas unidades industriais em Portugal da multinacional japonesa Yazaki chegaram a empregar perto de 7500 trabalhadores mas, a partir de 1998, a produção começou a ser transferida para outros países e, em pouco anos, o número de postos de trabalho caiu para metade. Hoje restam cerca de 3200 trabalhadores distribuídos pelas fábricas de Ovar, no distrito de Aveiro, e de Gaia, no distrito do Porto. Tanto numa como noutra, mantêm-se as pressões para as rescisões «amigáveis», renovando-se a cada dia as ameaças de deslocalização do grupo e de sumários despedimentos colectivos. Porém, à medida que a organização dos trabalhadores se reforça dentro da empresa, tem aumentado a resistência e a determinação de lutar em defesa dos postos de trabalho e de melhores condições.
A resistência dos trabalhadores tem impedido a empresa de concretizar rapidamente os seus planos
Ana Valente, Benjamim Rodrigues e Cláudio Teixeira integraram a delegação que, na passada semana, dia 12, se deslocou ao Parlamento Europeu (ver peça) para denunciar o processo de deslocalização da Yazaki e exigir a adopção de medidas que condicionem a concessão de financiamentos públicos às empresas a compromissos de longo prazo que garantam o emprego e os direitos laborais.
Acompanhados na viagem a Estrasburgo por Miguel Viegas, membro da DORAV do PCP, e José Teixeira, dirigente do Sindicato das Indústrias Eléctricas do Norte (STIEN), estes três jovens trabalhadores são um bom exemplo da política de contratações da multinacional. Desde a sua instalação em Portugal, em 1986, aos candidatos era exigida escolaridade superior à obrigatória e dada preferência aos que procuravam o primeiro emprego. Invariavelmente, os contratos eram a prazo e sem direitos.
Ana tem 31 anos, mas já trabalha nas linhas de montagem da Yazaki de Gaia há 12 anos e meio, o que lhe valeu o direito a uma diuturnidade no valor de 26 euros. Cláudio, de 28 anos, entrou há nove anos para a unidade de Ovar, onde Benjamim, de 39 anos, já está há 12.
Todos têm responsabilidades no trabalho sindical, uns como dirigentes outros como delegados sindicais. Mas a actividade sindical é quase uma novidade na Yazaki. Durante muito tempo a empresa soube utilizar a legislação e manobrar em seu favor com a estrutura da UGT para impedir a realização de plenários.
«A lei exigia acordo entre as diferentes estruturas sindicais para a convocação de plenários, o que permitia ao sindicato da UGT bloquear sistematicamente a nossa intervenção». Por isso, recorda Benjamim, «o primeiro plenário na fábrica de Ovar realizou-se em Dezembro passado». Este acontecimento revelou-se de uma importância decisiva: «A partir daí algumas coisas começaram a mudar.»
Os primeiros sinais
de resistência
No final do Verão de 2004, a empresa de Ovar anunciou que o segundo turno, das 17 à uma da madrugada, seria encerrado até final do ano, o que implicava a alteração de horário de 400 trabalhadores com consequentes perdas salariais. O sindicato interveio de imediato, esclarecendo que a empresa não podia impor unilateralmente a mudança de turno, uma vez que este está consagrado no contrato.
Apesar disso, relata Benjamim, ele próprio um operário do turno da noite, «os trabalhadores de duas linhas de montagem foram chamados em grupos a uma sala, onde lhes disseram que a partir de uma determinada data passariam para o turno diurno».
Alertados previamente pelo sindicato, desta vez os trabalhadores não acataram as ordens e exigiram uma comunicação por escrito, mostrando-se determinados a fazer valer os seus direitos.
Surpreendidos com tal atitude, os responsáveis mudaram subitamente de táctica. Negaram-se a dar a ordem por escrito, mas ameaçaram despedir aqueles que não aceitassem mudar voluntariamente. O facto é que a empresa tive de recuar e adiar os seus planos. O turno nocturno continua em laboração.
Na opinião de Benjamim e dos seus camaradas, este episódio foi mais uma tentativa para obter rescisões por mútuo acordo. «Quem está no turno da noite dificilmente aceitará mudar de horário, uma vez que isso representa a perda de 50 por cento do seu salário. O objectivo da empresa era arranjar um pretexto para propor rescisões. Mas os rumores continuam. Dizia-se que o turno ia encerrar até fins Abril, agora já ouvimos que afinal é em Agosto. Enfim, vive-se numa permanente instabilidade. O ambiente na empresa é de autêntico terrorismo psicológico. Estão sempre a lançar novos boatos».
No entanto, os resultados do reforço da organização sindical são notórios: «a própria empresa reconhece que não tem conseguido concretizar os seus planos como pretendia. Ou seja, não têm conseguido mandar as pessoas embora nos prazos que tinha previsto. Está a demorar mais um pouco».
Um plenário
à porta da empresa
Em Janeiro passado, a Comissão Sindical foi confrontada com a proibição de um plenário que tinha sido marcado para dia 20. «Foi então que soubemos que, nessa data, esperavam a visita do filho do presidente do grupo à fábrica de Ovar», conta Benjamim.
Apesar das pressões e da recusa de cedência de instalações, a Comissão Sindical manteve o plenário, convocando os trabalhadores para a porta da empresa. A directora dos recursos humanos ameaçou marcar faltas injustificadas, o que veio a acontecer, mas as pessoas não se deixaram intimidar e a iniciativa teve grande repercussão na comunicação social. Estiveram lá as televisões e a deputada Ilda Figueiredo.
Mais tarde a empresa chamou os representantes sindicais e informou-os de que, afinal, as faltas marcadas seriam justificadas. Entretanto, já se realizaram mais dois outros plenários sem que a empresa colocasse entraves. «Não ganharam nada com a tentativa de proibir o plenário», lembra Benjamim com um sorriso de satisfação no rosto.
A dinamização do trabalho sindical tem igualmente contribuído para uma mudança de atitude em relação às rescisões. Em Novembro do ano passado, recorda José Teixeira,
a empresa de Gaia encerrou a produção de uma marca, intimando 300 trabalhadores a rescindirem voluntariamente. A alternativa era o despedimento colectivo.
«Alguns aceitaram de imediato. Porquê? Para muitos é a oportunidade de se libertarem do inferno. É um trabalho altamente desgastante. Devido aos elevados ritmos, há trabalhadores já com grandes incapacidades, muitas mães que já não conseguem pegar nos filhos. As pessoas fazem contas e a empresa joga com todas as suas fragilidades. Uns resistem, outros preferem aceitar o que lhes oferecem, evitando um despedimento em piores condições, designadamente com um subsídio de desemprego inferior, caso venham a ser forçados a mudar de turno.»
A isto soma-se o que José Teixeira qualifica de autêntico «terrorismo psicológico»: «No início deste mês, a empresa em Gaia começou a chamar individualmente trabalhadores, propondo-lhes a rescisão. Pediu-lhes que analisassem a proposta em casa e que pensassem não só nos seus interesses pessoais mas também no bem de toda a família Yazaki.»
Mas esta dedicação total à família Yazaki (exigida até no momento da rescisão!..) não tem qualquer contrapartida para os trabalhadores. «Há duas semanas recebemos uma associada do STIEN na fábrica de Gaia que nos confessou nunca ter aderido às lutas do sindicato. Era daquelas que estava 24 horas disponível para a empresa. Veio ter connosco porque tinha sido chamada para rescindir o contrato. O choque foi grande. Dizia, para que é que eu andei a fazer isto tudo? Pela sua dedicação, abnegação, por nunca terem faltado ao trabalho, estas pessoas nunca pensaram que podiam ser despedidas», relata o dirigente sindical.
A afirmação do Partido
Miguel Viegas, membro da DORAV do PCP, sublinha que «o Partido esteve sempre ao lado dos trabalhadores da Yazaki, só que estava à porta. Com muito esforço e persistência conseguimos ultrapassar essa barreira, fizemos o primeiro recrutamento há cerca de cinco anos, e hoje contamos com um núcleo de camaradas que estão organizados no Partido e participam na actividade sindical».
«Esta organização, que está a dar ainda os seus primeiros passos, tem permitido organizar a luta de forma mais eficaz, em coordenação com a organização sindical e com o trabalho institucional no Parlamento Europeu e na Assembleia da República.»
Por outro lado, «o trabalho nas empresas contribuiu inegavelmente para o reforço da CDU nas últimas eleições», sublinha Miguel Viegas, explicando que «para além da luta por objectivos reivindicativos de melhores condições e melhores salários, a actividade do Partido tem como objectivo abrir horizontes políticos aos trabalhadores».
Em simultâneo, acrescenta, «a intervenção na Assembleia da República e no Parlamento Europeu precisa de estar ligada aos problemas do mundo do trabalho. Para tudo isto é essencial que estejamos presentes e organizados nas empresas».
Também na fábrica de Gaia, o núcleo comunista surgiu quase do nada há cerca de cinco anos. Ana e outra camarada começaram por elaborar e distribuir documentos sobre os problemas da empresa em nome da célula do Partido. Depois o núcleo alargou-se e passou a ser uma presença constante na fábrica.
«Inicialmente tínhamos o problema dos autocarros que entravam e saiam cheios, o que impedia o contacto directo. Mas, com o tempo, os autocarros começaram a parar. Na última campanha eleitoral, os trabalhadores vinham ter connosco, questionavam-nos sobre as nossas propostas e os próprios motoristas, que pertencem a várias empresas, abriam a porta para que colocássemos lá dentro a propaganda que eles próprios distribuíam pelos assentos. Somos ainda poucos, mas o trabalho avança.
A admiração do senhor Yazaki
No final de 2004, o presidente do Grupo, o senhor Yazaki, visitou as fábricas em Portugal. Visivelmente impressionado com os ritmos de trabalho que observara (não é por acaso que as fábricas portuguesas são as mais produtivas da Europa e estão em terceiro lugar numa lista de mais de 100 unidades em todo o mundo), o ilustre visitante perguntou, nos escritórios de Gaia, se os operários não desmaiavam com tal velocidade das linhas de montagem.
«O pessoal do escritório veio logo informar-nos e nós decidimos enviar uma carta ao presidente, explicando-lhe que, nesse dia, devido à sua visita, a velocidade das linhas era inferior à habitual.» A missiva acrescentava ainda que «os doentes profissionais e os trabalhadores mais velhos tinham sido retirados da linha e escondidos numa sala a pretexto de receberem formação».
A denúncia irritou os responsáveis da empresa: «Caíram-nos em cima e emitiram um comunicado aos trabalhadores afirmando que se a fábrica encerrasse a culpa era nossa».
Este incidente, relatado por Ana, reflecte as duras condições de trabalho na Yazaki, os elevados ritmos impostos que acabam por provocar doenças profissionais graves, as temidas tendinites.
«Ao meu lado trabalha uma colega que contraiu a doença profissional. Adormecem-lhe as mãos, anda com os pulsos ligados. Temos pessoas que já foram operadas duas e três vezes», refere Ana, que integrou a comissão de higiene e segurança criada em 2001.
A sua experiência diz-lhe que os casos de doenças profissionais são muito mais numerosos do que os declarados oficialmente. O último balanço social na empresa apenas registava 18 casos. No entanto, um inquérito realizado pela Federação da Indústrias Eléctricas dá conta de uma realidade diferente. «Das 500 respostas recebidas, apenas 13 pessoas tinha doença profissional declarada, mas mais de uma centena apresentaram queixas. Uns dos pulsos, outros dos cotovelos, outros das pernas.»
A verdade, como explica Ana, é que «os médicos nas empresas e nos próprios centros de saúde recusam-se a fazer a participação obrigatória à Caixa e a Inspecção do Trabalho nada faz para verificar o cumprimento da lei».
Penalizar as deslocalizações
O encontro no Parlamento Europeu, promovido pelo Grupo da Esquerda Unitária Europeia/ Esquerda Verde Nórdica, visava reunir trabalhadores das várias empresas do grupo Yazaki na União Europeia com deputados das diferentes forças políticas.
Porém, o grupo japonês empenhou-se em diminuir o sucesso da iniciativa e limitar ao máximo a participação de trabalhadores, exercendo pressões e ameaçando com represálias nos diferentes países.
A única delegação que se fez representar foi a portuguesa, mas também aqui a administração tentou boicotar a deslocação, marcando uma reunião com a estrutura sindical para o dia em que se realizava o encontro no Parlamento Europeu. Com essa manobra, conseguiu por impedir a presença do dirigente sindical, Américo Rodrigues, mas os restantes membros da delegação seguiram viagem.
No Parlamento, pretendiam sensibilizar os deputados para a questão das deslocalizações e para a necessidade aprovarem legislação que penalize a transferência da produção dentro do espaço da União Europeia.
De resto, é esse o objectivo do relatório que a deputada Ilda Figueiredo está a preparar no âmbito no âmbito da Comissão do Emprego e Assuntos Sociais. O documento, ainda em projecto, chama a atenção para as consequências das deslocalizações no desenvolvimento regional, «que afectam mais gravemente as regiões mais desfavorecidas» e exige designadamente «que sejam recusados apoios» às empresas que se deslocalizem, após terem beneficiado de ajudas comunitárias num Estado-membro.
Acompanhados na viagem a Estrasburgo por Miguel Viegas, membro da DORAV do PCP, e José Teixeira, dirigente do Sindicato das Indústrias Eléctricas do Norte (STIEN), estes três jovens trabalhadores são um bom exemplo da política de contratações da multinacional. Desde a sua instalação em Portugal, em 1986, aos candidatos era exigida escolaridade superior à obrigatória e dada preferência aos que procuravam o primeiro emprego. Invariavelmente, os contratos eram a prazo e sem direitos.
Ana tem 31 anos, mas já trabalha nas linhas de montagem da Yazaki de Gaia há 12 anos e meio, o que lhe valeu o direito a uma diuturnidade no valor de 26 euros. Cláudio, de 28 anos, entrou há nove anos para a unidade de Ovar, onde Benjamim, de 39 anos, já está há 12.
Todos têm responsabilidades no trabalho sindical, uns como dirigentes outros como delegados sindicais. Mas a actividade sindical é quase uma novidade na Yazaki. Durante muito tempo a empresa soube utilizar a legislação e manobrar em seu favor com a estrutura da UGT para impedir a realização de plenários.
«A lei exigia acordo entre as diferentes estruturas sindicais para a convocação de plenários, o que permitia ao sindicato da UGT bloquear sistematicamente a nossa intervenção». Por isso, recorda Benjamim, «o primeiro plenário na fábrica de Ovar realizou-se em Dezembro passado». Este acontecimento revelou-se de uma importância decisiva: «A partir daí algumas coisas começaram a mudar.»
Os primeiros sinais
de resistência
No final do Verão de 2004, a empresa de Ovar anunciou que o segundo turno, das 17 à uma da madrugada, seria encerrado até final do ano, o que implicava a alteração de horário de 400 trabalhadores com consequentes perdas salariais. O sindicato interveio de imediato, esclarecendo que a empresa não podia impor unilateralmente a mudança de turno, uma vez que este está consagrado no contrato.
Apesar disso, relata Benjamim, ele próprio um operário do turno da noite, «os trabalhadores de duas linhas de montagem foram chamados em grupos a uma sala, onde lhes disseram que a partir de uma determinada data passariam para o turno diurno».
Alertados previamente pelo sindicato, desta vez os trabalhadores não acataram as ordens e exigiram uma comunicação por escrito, mostrando-se determinados a fazer valer os seus direitos.
Surpreendidos com tal atitude, os responsáveis mudaram subitamente de táctica. Negaram-se a dar a ordem por escrito, mas ameaçaram despedir aqueles que não aceitassem mudar voluntariamente. O facto é que a empresa tive de recuar e adiar os seus planos. O turno nocturno continua em laboração.
Na opinião de Benjamim e dos seus camaradas, este episódio foi mais uma tentativa para obter rescisões por mútuo acordo. «Quem está no turno da noite dificilmente aceitará mudar de horário, uma vez que isso representa a perda de 50 por cento do seu salário. O objectivo da empresa era arranjar um pretexto para propor rescisões. Mas os rumores continuam. Dizia-se que o turno ia encerrar até fins Abril, agora já ouvimos que afinal é em Agosto. Enfim, vive-se numa permanente instabilidade. O ambiente na empresa é de autêntico terrorismo psicológico. Estão sempre a lançar novos boatos».
No entanto, os resultados do reforço da organização sindical são notórios: «a própria empresa reconhece que não tem conseguido concretizar os seus planos como pretendia. Ou seja, não têm conseguido mandar as pessoas embora nos prazos que tinha previsto. Está a demorar mais um pouco».
Um plenário
à porta da empresa
Em Janeiro passado, a Comissão Sindical foi confrontada com a proibição de um plenário que tinha sido marcado para dia 20. «Foi então que soubemos que, nessa data, esperavam a visita do filho do presidente do grupo à fábrica de Ovar», conta Benjamim.
Apesar das pressões e da recusa de cedência de instalações, a Comissão Sindical manteve o plenário, convocando os trabalhadores para a porta da empresa. A directora dos recursos humanos ameaçou marcar faltas injustificadas, o que veio a acontecer, mas as pessoas não se deixaram intimidar e a iniciativa teve grande repercussão na comunicação social. Estiveram lá as televisões e a deputada Ilda Figueiredo.
Mais tarde a empresa chamou os representantes sindicais e informou-os de que, afinal, as faltas marcadas seriam justificadas. Entretanto, já se realizaram mais dois outros plenários sem que a empresa colocasse entraves. «Não ganharam nada com a tentativa de proibir o plenário», lembra Benjamim com um sorriso de satisfação no rosto.
A dinamização do trabalho sindical tem igualmente contribuído para uma mudança de atitude em relação às rescisões. Em Novembro do ano passado, recorda José Teixeira,
a empresa de Gaia encerrou a produção de uma marca, intimando 300 trabalhadores a rescindirem voluntariamente. A alternativa era o despedimento colectivo.
«Alguns aceitaram de imediato. Porquê? Para muitos é a oportunidade de se libertarem do inferno. É um trabalho altamente desgastante. Devido aos elevados ritmos, há trabalhadores já com grandes incapacidades, muitas mães que já não conseguem pegar nos filhos. As pessoas fazem contas e a empresa joga com todas as suas fragilidades. Uns resistem, outros preferem aceitar o que lhes oferecem, evitando um despedimento em piores condições, designadamente com um subsídio de desemprego inferior, caso venham a ser forçados a mudar de turno.»
A isto soma-se o que José Teixeira qualifica de autêntico «terrorismo psicológico»: «No início deste mês, a empresa em Gaia começou a chamar individualmente trabalhadores, propondo-lhes a rescisão. Pediu-lhes que analisassem a proposta em casa e que pensassem não só nos seus interesses pessoais mas também no bem de toda a família Yazaki.»
Mas esta dedicação total à família Yazaki (exigida até no momento da rescisão!..) não tem qualquer contrapartida para os trabalhadores. «Há duas semanas recebemos uma associada do STIEN na fábrica de Gaia que nos confessou nunca ter aderido às lutas do sindicato. Era daquelas que estava 24 horas disponível para a empresa. Veio ter connosco porque tinha sido chamada para rescindir o contrato. O choque foi grande. Dizia, para que é que eu andei a fazer isto tudo? Pela sua dedicação, abnegação, por nunca terem faltado ao trabalho, estas pessoas nunca pensaram que podiam ser despedidas», relata o dirigente sindical.
A afirmação do Partido
Miguel Viegas, membro da DORAV do PCP, sublinha que «o Partido esteve sempre ao lado dos trabalhadores da Yazaki, só que estava à porta. Com muito esforço e persistência conseguimos ultrapassar essa barreira, fizemos o primeiro recrutamento há cerca de cinco anos, e hoje contamos com um núcleo de camaradas que estão organizados no Partido e participam na actividade sindical».
«Esta organização, que está a dar ainda os seus primeiros passos, tem permitido organizar a luta de forma mais eficaz, em coordenação com a organização sindical e com o trabalho institucional no Parlamento Europeu e na Assembleia da República.»
Por outro lado, «o trabalho nas empresas contribuiu inegavelmente para o reforço da CDU nas últimas eleições», sublinha Miguel Viegas, explicando que «para além da luta por objectivos reivindicativos de melhores condições e melhores salários, a actividade do Partido tem como objectivo abrir horizontes políticos aos trabalhadores».
Em simultâneo, acrescenta, «a intervenção na Assembleia da República e no Parlamento Europeu precisa de estar ligada aos problemas do mundo do trabalho. Para tudo isto é essencial que estejamos presentes e organizados nas empresas».
Também na fábrica de Gaia, o núcleo comunista surgiu quase do nada há cerca de cinco anos. Ana e outra camarada começaram por elaborar e distribuir documentos sobre os problemas da empresa em nome da célula do Partido. Depois o núcleo alargou-se e passou a ser uma presença constante na fábrica.
«Inicialmente tínhamos o problema dos autocarros que entravam e saiam cheios, o que impedia o contacto directo. Mas, com o tempo, os autocarros começaram a parar. Na última campanha eleitoral, os trabalhadores vinham ter connosco, questionavam-nos sobre as nossas propostas e os próprios motoristas, que pertencem a várias empresas, abriam a porta para que colocássemos lá dentro a propaganda que eles próprios distribuíam pelos assentos. Somos ainda poucos, mas o trabalho avança.
A admiração do senhor Yazaki
No final de 2004, o presidente do Grupo, o senhor Yazaki, visitou as fábricas em Portugal. Visivelmente impressionado com os ritmos de trabalho que observara (não é por acaso que as fábricas portuguesas são as mais produtivas da Europa e estão em terceiro lugar numa lista de mais de 100 unidades em todo o mundo), o ilustre visitante perguntou, nos escritórios de Gaia, se os operários não desmaiavam com tal velocidade das linhas de montagem.
«O pessoal do escritório veio logo informar-nos e nós decidimos enviar uma carta ao presidente, explicando-lhe que, nesse dia, devido à sua visita, a velocidade das linhas era inferior à habitual.» A missiva acrescentava ainda que «os doentes profissionais e os trabalhadores mais velhos tinham sido retirados da linha e escondidos numa sala a pretexto de receberem formação».
A denúncia irritou os responsáveis da empresa: «Caíram-nos em cima e emitiram um comunicado aos trabalhadores afirmando que se a fábrica encerrasse a culpa era nossa».
Este incidente, relatado por Ana, reflecte as duras condições de trabalho na Yazaki, os elevados ritmos impostos que acabam por provocar doenças profissionais graves, as temidas tendinites.
«Ao meu lado trabalha uma colega que contraiu a doença profissional. Adormecem-lhe as mãos, anda com os pulsos ligados. Temos pessoas que já foram operadas duas e três vezes», refere Ana, que integrou a comissão de higiene e segurança criada em 2001.
A sua experiência diz-lhe que os casos de doenças profissionais são muito mais numerosos do que os declarados oficialmente. O último balanço social na empresa apenas registava 18 casos. No entanto, um inquérito realizado pela Federação da Indústrias Eléctricas dá conta de uma realidade diferente. «Das 500 respostas recebidas, apenas 13 pessoas tinha doença profissional declarada, mas mais de uma centena apresentaram queixas. Uns dos pulsos, outros dos cotovelos, outros das pernas.»
A verdade, como explica Ana, é que «os médicos nas empresas e nos próprios centros de saúde recusam-se a fazer a participação obrigatória à Caixa e a Inspecção do Trabalho nada faz para verificar o cumprimento da lei».
Penalizar as deslocalizações
O encontro no Parlamento Europeu, promovido pelo Grupo da Esquerda Unitária Europeia/ Esquerda Verde Nórdica, visava reunir trabalhadores das várias empresas do grupo Yazaki na União Europeia com deputados das diferentes forças políticas.
Porém, o grupo japonês empenhou-se em diminuir o sucesso da iniciativa e limitar ao máximo a participação de trabalhadores, exercendo pressões e ameaçando com represálias nos diferentes países.
A única delegação que se fez representar foi a portuguesa, mas também aqui a administração tentou boicotar a deslocação, marcando uma reunião com a estrutura sindical para o dia em que se realizava o encontro no Parlamento Europeu. Com essa manobra, conseguiu por impedir a presença do dirigente sindical, Américo Rodrigues, mas os restantes membros da delegação seguiram viagem.
No Parlamento, pretendiam sensibilizar os deputados para a questão das deslocalizações e para a necessidade aprovarem legislação que penalize a transferência da produção dentro do espaço da União Europeia.
De resto, é esse o objectivo do relatório que a deputada Ilda Figueiredo está a preparar no âmbito no âmbito da Comissão do Emprego e Assuntos Sociais. O documento, ainda em projecto, chama a atenção para as consequências das deslocalizações no desenvolvimento regional, «que afectam mais gravemente as regiões mais desfavorecidas» e exige designadamente «que sejam recusados apoios» às empresas que se deslocalizem, após terem beneficiado de ajudas comunitárias num Estado-membro.