Privatizações na Turquia

SEKA: símbolo da resistência

Em luta desde há anos contra repetidas tentativas de encerramento, os 734 operários da fábrica de celulose e papel SEKA, propriedade do Estado turco, obtiveram na passada sexta-feira, dia 10, a garantia do governo de que a unidade continuará a laborar.

Uma onda de solidariedade com os operários da SEKA alastrou no país

Esta importante vitória foi conseguida na sequência de uma prolongada resistência, iniciada em 19 de Janeiro, data em que os operários da SEKA, perante a iminência do fecho da empresa, decidiram ocupar em permanência as instalações, onde passaram a viver, noite e dia, com as suas mulheres e filhos.
A SEKA foi a primeira fábrica de papel criada na Turquia, em 1936, tendo atingido a sua capacidade máxima em 1980, com uma produção de 150 mil toneladas ano. A partir daí, seguindo as orientações do FMI, o Estado turco não só deixou de investir na unidade como, pelo contrário, começou a desmantelá-la gradualmente, vendendo os seus equipamentos. Mesmo assim, a SEKA ainda hoje consegue produzir 73 mil toneladas de papel e a sua viabilização económica poderia ser facilmente assegurada mediante um investimento de cinco milhões de dólares.
Porém, o governo insistiu no encerramento e, perante a firme oposição dos operários, ordenou, em 18 de Fevereiro, um ataque das forças policiais equipadas com blindados de militares com o objectivo de expulsar das instalações os trabalhadores e as suas famílias.
A operação acabou, no entanto, por fracassar já que, nas imediações da fábrica, concentram-se cerca de cinco mil pessoas, manifestando solidariedade com a luta dos operários. Obrigado a retirar o dispositivo militar, o governo estabeleceu novo prazo, até 1 de Março, para a evacuação dos «ocupantes».
Mas estes não se intimidaram e mantiveram-se barricados ainda com maior determinação. Por todo o país recebiam sinais de solidariedade activa e o seu heroísmo tornou-se num exemplo para outros sectores da sociedade, em especial para os trabalhadores das grandes empresas públicas como a TEKEL (empresa de tabacos), Telekom (telecomunicações), Tupras (petrolífera), Petkim (petroquímica) e THY (a transportadora aérea ainda parcialmente do Estado), todas alvos de processos de privatização.

Solidariedade activa

Mesmo os pequenos produtores de tabaco, tradicionalmente avessos a manifestações, juntaram-se aos trabalhadores da TEKEL numa manifestação realizada em Malatya (província do Kurdistão), que juntou mais de 10 mil pessoas. Mais tarde, outra grande acção de trabalhadores, agricultores e pequenos comerciantes, reuniu 15 mil manifestantes na província de Tokat (região do Mar Negro). Um dos slogans utilizados referia que «A SEKA não pode encerrar; a SEKA está em todo o lado; em todo o lado há resistência».
Foi com este slogan que os trabalhadores da TEKEL receberam a visita do primeiro-ministro, Tayyip Erdogan, recentemente efectuada a Adana (província do Sul da Turquia), sendo brutalmente reprimidos pelas forças policiais.
No dia em que os operários da SEKA foram atacados (18 Fevereiro), os trabalhadores da tabaqueira turca, que aguardam o anúncio da privatização, decidiram também eles ocupar durante a noite as fábricas da TEKEL. Muitas outras manifestações se realizaram nos dias seguintes, alastrando a todo o país um onda de solidariedade com os operários da SEKA.
As próprias centrais sindicais, que inicialmente estavam hesitantes, acabaram por se juntar numa convocatória de greve geral de 24 horas, no passado dia 4, cuja adesão maciça forçou o governo a alargar o prazo para o fecho da SEKA, que expirava hoje, quinta-feira, 17.
Contudo, na passada sexta-feira, 10, no decorrer de negociações entre os operários e o governo, foi acordado que a SEKA será transferida para o município de Koceeli, mantendo-se assim em laboração sem perda de postos de trabalho. Os operários aprovaram a decisão, mas continuam vigilantes e prontos para reagir à mínima tentativa de violação dos termos acordados.
Para o Partido do Trabalho da Turquia, que desde 1998 apoia activamente a luta dos operários da SEKA, a sua determinação constitui um «importante» e «oportuno» exemplo para «todas as classes trabalhadores e movimento sindical» num momento em que «o governo intensificou imensamente a ofensiva privatizadora. É indubitável que a partir de agora o governo enfrentará uma oposição muito mais forte na aplicação das políticas do FMI».


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