Tortura e massacre

José Casanova
No Iraque, as tropas ocupantes preparam uma ofensiva visando, segundo dizem e o Diário de Notícias cita, «‘limpar’ Fallujah de extremistas». Dado tratar-se de uma operação perigosa, os ocupantes decidiram «entrincheirar-se à entrada da cidade» e proceder a uma vaga de bombardeamentos aéreos com os quais procuram «debilitar a capacidade bélica da resistência» e não correr, eles próprios, quaisquer riscos. É esta preocupação de anular riscos que está na origem da decisão de, desta vez, ao contrário do que aconteceu em Abril passado, «os marines deixarem a cargo dos soldados iraquianos a ofensiva terrestre» - e há-de ser por razões semelhantes que o intrépido Blair decidiu, também, não envolver soldados britânicos nesta ofensiva: morrer por morrer, que morram os iraquianos que estão habituados a isso... Mas, voltando às bombas: dizem os norte-americanos que elas estão a ser lançadas apenas e só sobre locais habitados por «extremistas» e que são falsas as notícias que falam de mortos não-extremistas, como é o caso daqueles «seis membros de uma família – um casal e quatro filhos» e outros casos semelhantes... E é bem possível que os ocupantes falem verdade, já que, segundo um jovem camionista, também citado pelo DN, «aqui, todas as pessoas fazem parte da resistência»: ora, se assim é, toda a população da cidade é composta por extremistas e caiam as bombas onde caírem e matem quem matarem, cumprirão sempre a democrática missão de apenas atingir locais habitados por extremistas e de, portanto, apenas matarem extremistas (mesmo que disfarçados de «um casal com quatro filhos»).
Entretanto, todos os dias e em todo o país, a resistência, por um lado, e a carnificina de iraquianos, por outro, continuam. Legítima, digna e heróica, a primeira, porque se trata da luta de um povo contra a ocupação do seu país pelo mais poderoso exército do planeta; ilegítima, criminosa e cobarde, a segunda, porque se trata da ocupação brutal de um país soberano e da perpetração de um hediondo massacre.
Há dias, o Presidente Jorge Sampaio afirmou que a tortura de prisioneiros praticada pelos EUA, «desprestigia a prática democrática no mundo». É claro que sim: a tortura é hedionda, nada tem a ver com democracia, antes pelo contrário, e exige denúncia e verberação públicas. Tal como o massacre de dezenas de milhares de seres humanos. Até agora infelizmente silenciado.


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