Em defesa do aborto

Marcha histórica em Washington

Cerca de um milhão de pessoas desfilou em Washington, no passado domingo, em protesto contra a política de Bush visando proibir o direito ao aborto.

«As americanas estão “a um voto” de voltar ao aborto clandestino»

A capital dos EUA foi palco da maior manifestação da sua história, segundo os organizadores da Marcha em defesa do direito ao aborto, que estimam em mais de um milhão de pessoas (entre 500 mil e 800 mil, segundo a polícia) os que acorreram a Washington para repudiar a política de Bush visando restringir os direitos das mulheres.
Sob o lema «Marcha pela Vida das Mulheres», o protesto promovido por 1400 organizações juntou pessoas, sobretudo mulheres, de todos os extractos sociais e políticos, e contou com o apoio de mais de meia centena de organizações internacionais. Também o movimento «Republicanos pela Escolha» se juntou ao desfile, onde participaram personalidades da vida política dos EUA como Hillary Clinton, senadora por Nova Iorque; Madeleine Albright, secretária de Estado no governo Clinton; e artistas famosas como Uma Thurman, Charlize Theron, Helen Hunt, Salma Hayek, Demi Moore, Sharon Stone, Julia Stiles, Susan Sarandon, Ashley Judd, Kathleen Turner, Cybill Shepherd e Whoopi Goldberg.
A marcha surge na sequência de vários revezes sofridos pelos grupos defensores do aborto, em que se destaca a nova legislação aprovada por Bush no início do mês, segundo a qual o feto passa a ter estatuto jurídico, o que leva, por exemplo, a que no caso de assassinato de uma mulher grávida o assassino possa ser acusado de duplo homicídio. Os grupos anti-aborto consideraram a medida um passo para criminalizar a interrupção voluntária da gravidez.
Bush já aprovara no final do ano passado outra lei condicionando a prática de aborto, e proibiu o financiamento de qualquer instituição de planeamento familiar, nacional ou estrangeira, que não repudie a prática do aborto.
O direito ao aborto, reconhecido pelo Supremo Tribunal desde 1973, divide praticamente ao meio a sociedade norte-americana. Uma sondagem levada a cabo pela cadeia de televisão NBC e pelo diário The Wall Street Journal, em Novembro último, revelou que 53 por cento dos norte-americanos são a favor da manutenção do direito ao aborto, contra 47 por cento que defendem a sua proibição.

Uma frente contra Bush

Apesar do seu carácter unitário, a Marcha ganhou um cunho marcadamente político, com os partidários do candidato democrata à Casa Branca, John Kerry - favorável ao direito ao aborto, apesar de católico - a esgrimirem a questão como mais um factor contra Bush, acusado de pretender limitar os direitos conquistados pelas mulheres norte-americanas.
«A administração está cheia de gente que acredita que a sentença do caso Roe contra Wade é a pior abominação na história das leis constitucionais», afirmou Hillary Clinton, referindo-se à posição do Supremo Tribunal que legalizou o aborto há três décadas. A senadora sublinhou ainda que durante 12 anos as mulheres não se viram obrigadas a fazer manifestações porque o país tinha «um governo que respeitava os direitos das mulheres», pelo que «a única maneira de evitar novas e repetidas marchas é elegendo John Kerry presidente».
«Se o governo proíbe as mulheres de fazer abortos legais, limpos e seguros, está a tirá-las para a morte, porque as mulheres continuarão a ter necessidade de abortar», disse por seu turno a actriz Whoopi Goldberg, uma das organizadoras da Marcha, alertando que as norte-americanas estão «a um voto» de voltar ao aborto clandestino.
«A nossa mensagem de hoje é clara: os direitos sobre a reprodução são direitos humanos e não podem deixar de ser escutados», declarou Gloria Feldt, presidente da Planned Parenthood, uma importante organização patrocinadora do protesto, que já manifestou o seu apoio à candidatura de Kerry.
A questão do aborto, considerada pelos democratas uma peça central da campanha eleitoral, transformou-se com a Marcha de Washington numa frente de batalha que pode vir a ser decisiva na escolha do futuro inquilino da Casa Branca.

Os terroristas

Ausente de Washington, Bush entregou a defesa da sua política em relação ao aborto a uma assessora, Karen Hughes, que apareceu nos écrans da CNN a agitar mais uma vez os fantasmas do terrorismo e a afirmar que os activistas pró-aborto não estão em sintonia com a alegada tendência de valorização da vida que se vive nos EUA desde os atentados do 11 de Setembro.
«Acho que depois do 11 de Setembro os americanos estão a valorizar mais a vida e precisamos de políticas para valorizar a dignidade e a riqueza de cada vida», disse Hughes, garantindo que esse é o sentido das políticas de Bush quando se propõe «reduzir o número de abortos e incentivar adopções».
A assessora presidencial considera que «estas são políticas que os americanos podem apoiar, particularmente num momento em que enfrentamos um inimigo», e advoga que «a diferença fundamental entre nós e a rede terrorista contra a qual lutamos é que valorizamos cada vida».
Mais um pouco e os defensores do direito ao aborto acabam rotulados de terroristas.


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