Conferência do belicismo

Rui Paz

Esta forma brutal e criminosa de «instaurar a democracia»

No último fim-de-semana, sob os protestos de milhares de manifestantes, realizou-se em Munique o já habitual encontro dos ministros da Defesa da NATO onde se planeiam novas guerras e se definem as variantes ideológicas da propaganda belicista e da guerra psicológica.
A cimeira é organizada por Horst Teltschik, presidente da filial alemã da BOEING, um dos maiores gigantes mundiais da produção e negócio de armas. O ex-membro do conselho de administração da BMW e antigo conselheiro do ex-chanceler Helmut Kohl, consegue atrair anualmente à capital da Baviera a fina flor do belicismo transatlântico. Desde os Verdes de Fisher, aos social-democratas partidários ou não de «uma Europa Federal independente dos EUA», passando pelos sectores mais reaccionários da democracia-cristã e pelos militaristas norte-americanos, democratas ou republicanos, todos se dedicam à tarefa comum de ajudar o imperialismo a encontrar a melhor estratégia para a imposição do seu domínio mundial.

Em 1999 e 2000 o concílio desta elite guerreira da „civilização ocidental“ ocupou-se com os preparativos da agressão contra a Jugoslávia e com o destino a dar aos restos daquele Estado balcânico que a NATO acabava de destruir. Em 2003 a chamada «comunidade internacional» – expressão com que a NATO costuma cobrir-se quando se prepara atacar povos indefesos – emperrou com os desentendimentos verificados entre os EUA, a França e a Alemanha sobre a melhor maneira de liquidar a soberania iraquiana e de controlar o petróleo no Tigre e no Eufrates. E porque o imperialismo aprende depressa, este ano, como explicou o presidente da BOEING-ALEMANHA, o encontro decorreu sob o lema: «como é que no futuro americanos e europeus poderão repartir as suas tarefas?»
E como os povos a quem é roubada a soberania e a independência pelo banditismo de Estado do chamado «mundo livre» resistem, Bush acha que a melhor maneira de continuar a sua cruzada pela «democracia» consiste em envolver cada vez mais a NATO na ocupação do Iraque e do Afeganistão.

Ainda recentemente, os exércitos do Pentágono dispersaram a tiro uma manifestação curda em Kirkuk, uma das minorias étnicas que Bush se propunha «libertar» da ditadura de Sadam Hussein, fazendo mais de uma dezena de mortos. Em Bassora foi a vez dos ingleses assassinarem os participantes numa iniciativa Xiita. E até em Bagdad e no sul do país, os desempregados das ex-Forças Armadas e da Função Pública iraquianas são varridos com rajadas de metralhadora quando desfilam pacificamente e protestam contra a sua situação. Também não é por acaso que os exercícios dos soldados da Bundeswehr que às ordens da social-democracia protegem o regime de Karsai no «Afeganistão» incluem a dispersão a tiro de manifestantes.
Este tipo de «missões humanitárias» é ainda mais macabro se for executado pelos esquadrões da morte das tropas especiais alemãs KSK, um corpo militar que pode atacar anonimamente em qualquer país e à margem da legalidade. O deputado social-democrata alemão Gerd Höfer ameaçou com um processo o dirigente pacifista Tobias Pflüger por este ter revelado que os poucos prisioneiros sobreviventes das acções da KSK no Afeganistão, são entregues aos americanos em flagrante violação da Constituição alemã e das normas do direito internacional. Esta forma brutal e criminosa de «instaurar a democracia», utilizada pelas potências da NATO, é hoje uma realidade.
No ano em que celebramos os 30 anos do 25 de Abril é vergonhoso verificar como o Governo português retomando o rumo das guerras coloniais se prepara para submeter novamente as Forças Armadas às ordens de uma Organização Militar, que durante décadas, foi um dos sustentáculos do regime que durante meio século aterrorizou Portugal.


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