As «aspas» do materialismo histórico
Há aspas que desqualificam quem as usa. Foi o que pensei, quando li uma crónica que tentando ridicularizar a Festa do «Avante!», escrevia:
- Deve ser a isto que chamam «materialismo histórico».
Suporia o autor da crónica, Prado Coelho, que com aspas achincalhava esse conceito? Se não causassem pena, essas aspas fariam sorrir de ironia.
Na sua crónica P. Coelho aborda ideias como se, pegando num baralho de cartas, procurasse um parceiro ingénuo para jogar ao «burro-em-pé» (com aspas e hífens). E baralhou-se tanto no seu infeliz comentário que acabou por deitar abaixo todo o baralho. Não consta que o materialismo histórico se tenha dado conta do ilustre ensaísta, mas para quem exerça funções intelectuais de responsabilidade, a gaffe merece reparo.
Parece que P. Coelho teve uma vertiginosa fase revolucionária, onde entrou ardorosamente na onda do 25 de Abril e de onde se raspou na maré baixa do 25 de Novembro. Poderá esse tão breve percurso dever-se a pesada reflexão teórica? Ou a simples leveza de ideias? Do seu trajecto revolucionário o que resta, pelos vistos, é o benefício de uma dúvida: terá ele pensado alguma vez, compreender o que é o materialismo histórico - e, aventuremos, talvez até o materialismo dialéctico?
Pelos vistos, não. Sem ter posto na Festa nem sequer um dos seus filosóficos pés (imaginem o que seria se lá pousasse o que pensa da sua potencialidade mental) P. Coelho caminha no seu comentário como um roedor de notas de rodapé a afiançar ter lido o tratado todo. É tão descaradamente cábula que merece uma observação:
— Sabe, isso de pensar (sobretudo em teorias tão elaboradas como as do materialismo histórico) faz trabalhar os miolos mais preguiçosos e até rever caminhos de pensamento. Anda atrasado há dois séculos (até diz que a Festa se poderia ter realizado no século XIX)! E se a sua acutilante perspicácia lhe permitir reparar, não há hoje historiador que se preze que não aborde a História sem ter em conta as contribuições do materialismo histórico. E a ideia nuclear é esta (tente fixá-la bem, se não a compreender): «não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é inversamente a sua existência social que determina a sua consciência».
Marx escreveu esta reflexão, que revolucionou o pensamento sobre a História, em 1859. Com o seu conturbado calendário de raciocínio sobre datas, admito que possa atribuir a frase a Confúcio, que viveu aí uns 3.000 anos antes de Cristo, confirmando o seu «confusionismo-histórico» (com s, com aspas e com hífen).
Ó professor, tente compreender coisas grandes que silhuetas mentalmente trinca-espinhas em regra não alcançam. Para não vir dizer, nalguns dos seus artigos de 2004, que a Festa do «Avante!» não se alterou desde a revolução de ... 1383/85.
Aceita uma sugestão mais? Escreva um tratado de 20 volumes com três prefácios e quatro post-fácios intitulado: «O tremoço post-moderno e o desabar do marxismo». Desde que seja para dizer mal do marxismo-leninismo, poderá ser um seguro (entre aspas) «best-seller».
- Deve ser a isto que chamam «materialismo histórico».
Suporia o autor da crónica, Prado Coelho, que com aspas achincalhava esse conceito? Se não causassem pena, essas aspas fariam sorrir de ironia.
Na sua crónica P. Coelho aborda ideias como se, pegando num baralho de cartas, procurasse um parceiro ingénuo para jogar ao «burro-em-pé» (com aspas e hífens). E baralhou-se tanto no seu infeliz comentário que acabou por deitar abaixo todo o baralho. Não consta que o materialismo histórico se tenha dado conta do ilustre ensaísta, mas para quem exerça funções intelectuais de responsabilidade, a gaffe merece reparo.
Parece que P. Coelho teve uma vertiginosa fase revolucionária, onde entrou ardorosamente na onda do 25 de Abril e de onde se raspou na maré baixa do 25 de Novembro. Poderá esse tão breve percurso dever-se a pesada reflexão teórica? Ou a simples leveza de ideias? Do seu trajecto revolucionário o que resta, pelos vistos, é o benefício de uma dúvida: terá ele pensado alguma vez, compreender o que é o materialismo histórico - e, aventuremos, talvez até o materialismo dialéctico?
Pelos vistos, não. Sem ter posto na Festa nem sequer um dos seus filosóficos pés (imaginem o que seria se lá pousasse o que pensa da sua potencialidade mental) P. Coelho caminha no seu comentário como um roedor de notas de rodapé a afiançar ter lido o tratado todo. É tão descaradamente cábula que merece uma observação:
— Sabe, isso de pensar (sobretudo em teorias tão elaboradas como as do materialismo histórico) faz trabalhar os miolos mais preguiçosos e até rever caminhos de pensamento. Anda atrasado há dois séculos (até diz que a Festa se poderia ter realizado no século XIX)! E se a sua acutilante perspicácia lhe permitir reparar, não há hoje historiador que se preze que não aborde a História sem ter em conta as contribuições do materialismo histórico. E a ideia nuclear é esta (tente fixá-la bem, se não a compreender): «não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é inversamente a sua existência social que determina a sua consciência».
Marx escreveu esta reflexão, que revolucionou o pensamento sobre a História, em 1859. Com o seu conturbado calendário de raciocínio sobre datas, admito que possa atribuir a frase a Confúcio, que viveu aí uns 3.000 anos antes de Cristo, confirmando o seu «confusionismo-histórico» (com s, com aspas e com hífen).
Ó professor, tente compreender coisas grandes que silhuetas mentalmente trinca-espinhas em regra não alcançam. Para não vir dizer, nalguns dos seus artigos de 2004, que a Festa do «Avante!» não se alterou desde a revolução de ... 1383/85.
Aceita uma sugestão mais? Escreva um tratado de 20 volumes com três prefácios e quatro post-fácios intitulado: «O tremoço post-moderno e o desabar do marxismo». Desde que seja para dizer mal do marxismo-leninismo, poderá ser um seguro (entre aspas) «best-seller».