O velho truque

Vitor Dias
Em crónica inserta na edição de sábado passado, uma jornalista do «Público» veio dar um novo testemunho de como alguns (muitos?) órgãos de informação e alguns (muitos?) jornalistas falam de cátedra sobre o que os partidos fazem ou não fazem e nem sequer ainda perceberam que as sentenças que debitam são elas próprias tributárias dos silêncios, lacunas e desatenções dos «media» sobre a acção dos partidos.
Com efeito, a referida jornalista opinou sem hesitação que «enquanto o país ardia e o Governo tardava em dar sinais de que, pelo menos, via televisão, a oposição também não existia» e que «Ferro Rodrigues conseguiu ainda acordar mais tarde para os incêndios que Durão Barroso».
No que toca à oposição, a crónica só zurzia no PS mas, como se viu, por estranhíssimos silogismos, a conclusão tirada foi que – repare-se outra vez - «a oposição» - o que é suposto incluir o PCP - «não existia».
Assim sendo, e a propósito de não existências, talvez seja adequado lembrar que, quando o Secretário-geral do PCP esteve na Lousã, em 16 de Novembro do ano passado, a participar num debate sobre «Florestas, fogos florestais e desenvolvimento da Serra», essa iniciativa não existiu para o «Público» do dia seguinte.
É adequado lembrar que também não foi possível ler no «Público» nem uma linha sobre o assunto no dia a seguir a Carlos Carvalhas ter-se encontrado com os Bombeiros Voluntários de Almoçageme (em 17 de Dezembro do ano passado) e ter na ocasião divulgado um conjunto de medidas e propostas legislativas do PCP sobre prevenção e combate aos fogos florestais.
É adequado lembrar que, tendo estas questões e propostas sido debatidas na AR em 22 de Janeiro deste ano e por iniciativa do PCP, nem uma palavra sobre o tema se encontrará na crónica parlamentar do «Público» do dia seguinte.
E, já com a vaga de incêndios declarada, também as acutilantes conferências de imprensa realizadas sobre o problema pelo PCP em 30 de Julho e 4 de Agosto igualmente nos dias a seguir não tinham existido para o «Público».
Assim tendo sido, talvez não seja de admirar que a jornalista do «Público» tenha entendido que «a oposição» - incluindo portanto o PCP - «não existia» em termos de abordagem do drama dos incêndios, até porque pode não ter reparado na gloriosa meia dúzia de linhas que o seu jornal dedicou à visita de uma delegação do PCP com o seu Secretário-geral, em 5 de Agosto, a concelhos devastados pelos incêndios.
Já aqui o escrevemos mas voltamos a repetir: não seria mais que tempo de terminar com este velho truque de discriminar, silenciar ou amordaçar alguém e depois acusá-lo de estar calado ou de não se fazer ouvir?


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