Respeitar a História

Aurélio Santos

Passos Coelho tentou fazer passar a ideia de que o seu Governo era constituído por pessoas tecnicamente de alto gabarito e, como tal, as suas decisões seriam sempre inquestionáveis.

A trapaça tem vindo a desmoronar-se. A começar no ministro da Economia que de manhã diz uma coisa e à tarde o seu contrário. E que dizer da ministra da Agricultura que espera resolver o problema da seca com fé? Não tardará com certeza a propor-nos rituais e oferendas para aplacar os deuses.

As decisões têm sido obviamente políticas.

E sem tibiezas este Governo tem mostrado a sua opção de classe pelos interesses do grande capital (que modernamente se esconde por detrás do rótulo «empresas de rating»), do qual espera, por certo, recompensa pessoal futura, como temos vindo a assistir nos últimos anos, com os governos anteriores.

Mas existe uma condição essencial para se ocupar um cargo de soberania num país com História. E essa condição é conhecer a história do país que se governa. E Passos Coelho não conhece a história de Portugal.

Não foram piegas os que desembarcaram no Mindelo e fizeram as revoluções liberais. Não foram piegas os que em 1910 implantaram uma das primeiras repúblicas europeias. Não eram piegas os que em 1934 se revoltaram na Marinha Grande, ou 1936, no Tejo. Muitos deles pagaram com a vida, nas masmorras da prisão e no Campo de Concentração do Tarrafal a sua não pieguice. Não fomos piegas quando enfrentando uma ditadura fizemos em Abril uma revolução, também porque não queríamos continuar uma guerra de colonizadores, e não seremos piegas a recusar ser colonizados.

Cícero dizia que «A História era a mestre da vida». Distorce-la é grave, ignora-la é perigoso. Distorce-se a História quando se reduz a 2.ª Guerra Mundial a Hitler, e se diz que esse erro não voltará a repetir-se, e quando se branqueia 48 anos de fascismo em Portugal. Ignora-se a História quando se chamam os portugueses de piegas.

Um velho provérbio africano diz que enquanto os leões não tiverem os seus próprios historiadores, a história das caçadas será sempre feita das gloriosas histórias dos caçadores.

Não vamos deixar que a História deste país seja escrita pelos colonizadores.



Mais artigos de: Opinião

O caminho da fome

Com tudo o que os números e a informação estatística ocultam, mas também com aquilo que revelam, os dados divulgados pelo INE na semana passada, referentes às contas nacionais do 4.º trimestre de 2011, devem ser conhecidos. Se dúvidas existissem confirma-se que...

Previsões macabras

Diz a notícia que «morreram 6110 pessoas nas duas primeiras semanas de Fevereiro, mais 1400 do que em igual período de 2011». E diz ainda que «o grupo etário acima dos 75 anos foi o mais afectado pelo acréscimo de mortalidade». Se a estes dados dramáticos...

As panelas

Quando se ultimava a entrada de Portugal na CEE, o PCP advertia que tal entrada do nosso País nesta agremiação dos poderosos da Europa era como a história da panela de barro a juntar-se às panelas de ferro – ao primeiro chocalhar, a de barro ficava em cacos. O PCP acrescentava...

Tarefa principal de todo o Partido

O Governo apresentou na Assembleia da República um projecto de lei de alteração às leis laborais, que visa intensificar a exploração e que, se for aprovado e concretizado, agravará as condições de vida dos trabalhadores e suas famílias e aumentará os lucros do grande capital. Um projecto lei que sendo dirigido aos trabalhadores do sector privado, o Governo quer aplicar também aos trabalhadores da Administração Pública.

Falência de classe

Durante meses disseram-nos que não se podia mencionar uma renegociação da dívida e que qualquer desvio ao cumprimento dos programas da troika levaria inexoravelmente à falência e à catástrofe. E eis que na semana passada a Grécia formalizou a sua incapacidade...