Previsões macabras

José Casanova

Diz a no­tícia que «mor­reram 6110 pes­soas nas duas pri­meiras se­manas de Fe­ve­reiro, mais 1400 do que em igual pe­ríodo de 2011». E diz ainda que «o grupo etário acima dos 75 anos foi o mais afec­tado pelo acrés­cimo de mor­ta­li­dade».

Se a estes dados dra­má­ticos acres­cen­tarmos os que de­correm do cres­cente nú­mero de idosos que, vi­vendo so­zi­nhos, so­zi­nhos morrem, por vezes sem que al­guém se aper­ceba da sua morte du­rante dias, se­manas ou meses, fi­camos com uma ideia mais apro­xi­mada da gra­vi­dade da si­tu­ação – uma si­tu­ação que es­pelha bem o es­tado a que chegou o País após quase trinta e seis anos de po­lí­tica de di­reita per­pe­trada por su­ces­sivos go­vernos PS/​PSD/​CDS e agora com­ple­men­tada pela acção mor­tí­fera da troika ocu­pante.

As causas deste au­mento de mortes – dizem vá­rios es­pe­ci­a­listas – ra­dicam nas «me­didas de aus­te­ri­dade» e na «po­breza» por elas pro­vo­cada, ou seja: parte grande destas mortes tem a ver com «ali­men­tação má que deixa as pes­soas mais vul­ne­rá­veis ao vírus da gripe»; com a im­pos­si­bi­li­dade de «pagar a elec­tri­ci­dade e os trans­portes»; com as «di­fi­cul­dades de acesso aos cui­dados de saúde e aos me­di­ca­mentos», ha­vendo «quem vá à far­mácia e só avie parte da re­ceita»... – e mais todo o vasto con­junto de males que, afec­tando im­pi­e­do­sa­mente a imensa mai­oria dos por­tu­gueses, in­cidem de forma agra­vada sobre essa ca­mada mais frágil da po­pu­lação que são os idosos, sis­te­ma­ti­ca­mente hu­mi­lhados e ofen­didos por go­ver­nantes des­pro­vidos da mais ele­mentar sen­si­bi­li­dade hu­mana.

Es­tamos, então, pe­rante uma au­tên­tica acção de ex­ter­mínio de idosos le­vada a cabo por um go­verno que, tendo como pre­o­cu­pação ex­clu­siva a de­fesa dos in­te­resses dos grandes grupos eco­nó­micos e fi­nan­ceiros, se está nas tintas para Por­tugal e para os por­tu­gueses.

Co­men­tando os trá­gicos nú­meros acima re­fe­ridos, um res­pon­sável mi­ni­mizou a si­tu­ação afir­mando que «não está a acon­tecer nada fora do pre­visto».

Se é assim, se tudo isto e o mais que aí vem es­tava e está pre­visto, então é mais do que certo que tratar-nos da saúde, a todos, está nas pre­vi­sões ma­ca­bras do Go­verno e da troika.

E assim sendo, só nos resta, em le­gí­tima de­fesa, tratar-lhes da saúde, cor­rendo de­fi­ni­ti­va­mente com eles.



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