Asteróides
Em 2021, o astrofísico português Nuno Peixinho viu o seu nome baptizar um dos muitos asteróides que orbitam o nosso Sol: com cerca de 10 quilómetros de diâmetro, o corpo celeste descoberto em 1998 chama-se desde essa altura (40210) Peixinho, premiando assim um intenso e qualificado labor científico do investigador português, então sediado no Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço da Universidade de Coimbra, depois de uma já longa carreira, que incluiu três anos passados no Observatório Astronómico de Antofagasta, no Chile.
Reagindo à distinção (que com ironia comparou aos Oscars do cinema), Nuno Peixinho lamentava que em Portugal fosse mais fácil ter o nome num asteróide do que num contrato de trabalho permanente. E confessou temer pelo seu futuro quando terminasse a vigência do seu último contrato – que foi precisamente o que aconteceu há dias. Agora, o nome de Nuno Peixinho já não está apenas num longínquo corpo celeste; figura também na lista do Centro de Emprego de Coimbra, no qual se inscreveu a 17 de Dezembro. «Vou ficar à espera dos concursos que abram por aí», revelou ao Diário de Coimbra.
Quão vasta será a procura por astrofísicos no mercado de trabalho português? Fica a questão, que suscita tantas outras. Quantos investigadores portugueses estão hoje a trabalhar no estrangeiro e a contribuir para o desenvolvimento de outros países, porque o seu não criou condições para que aqui se fixassem? E, dos que cá ficaram, quantos não abandonaram a actividade científica, interrompendo projectos em curso e alienando anos e anos de conhecimento acumulado, apenas porque o contrato “acabou”, a bolsa “não foi renovada”, o salário é curto e nula a perspectiva de carreira? Ou, simplesmente, porque tiveram de escolher entre o trabalho científico e a constituição de família?
Asteróides à parte, onde se lê Nuno podia ler-se Joana, António, Alice, Rui, Catarina, João… E quando se fala de Astrofísica podia falar-se de Química, de História, de Biologia, de Sociologia, de Física Quântica e de tantas outras áreas das Humanidades e das Ciências, fundamentais ou aplicadas. O problema é o mesmo e está identificado: se Portugal tem dificuldades em reter e aproveitar os seus cientistas e investigadores, tal deve-se à precariedade e ao desinvestimento que perpassam por todo o sistema científico e tecnológico nacional – assente em bolsas, contratos temporários, concursos consecutivos e cada vez mais restritivos, e na negação de elementares direitos laborais e sociais.
De pouco vale, depois, falar em aposta na “inovação”, em políticas de “I&D” ou em estratégias de “desenvolvimento nacional”, pois não há ciência sem cientistas nem investigação sem investigadores.