Situação dramática no sector do vinho requer medidas urgentes do Governo
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) enviou, quinta-feira, um pedido de audiência urgente ao Ministério da Agricultura para abordar a crise que se vive em todo o sector do vinho. PCP chama ministro à Assembleia da República e apresenta propostas.
«A dramática situação do sector não se compadece com paliativos»
Na manifestação que juntou milhares de viticultores na Régua no dia 7 de Agosto, promovida pela CNA e pela AVADOURIENSE, foi entregue ao presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP) – e enviado ao Governo – um documento com propostas e medidas concretas a adoptar pelo Executivo PSD-CDS para travar a perda de rendimento dos agricultores e impedir o encerramento forçado de muitas explorações.
Sem respostas por parte da tutela, a CNA solicitou, na passada semana, uma audiência urgente ao ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, para reiterar as suas propostas e reclamar a adopção de medidas urgentes para reverter a situação de crise que enfrentam os pequenos e médios viticultores, principalmente os da Região Demarcada do Douro (RDD).
«Se nada for feito, os agricultores serão obrigados a entregar as suas uvas ao senhor ministro da Agricultura e ao Governo», anuncia a CNA em comunicado, referindo que a «dramática situação» do sector «não se compadece com paliativos, adiamentos ou silenciamentos ensurdecedores» e «exige uma resposta urgente e eficaz por parte do Ministério da Agricultura».
Com a vindima «à porta», os pequenos e médios produtores «estão em desespero», face às «ameaças dos grandes agentes da transformação e do comércio de não comprarem as uvas», alerta a Confederação, informando que «a situação é mais dramática na RDD, já que os agricultores ficaram ainda mais desamparados com o corte no benefício [a quantidade de mosto que cada produtor pode destinar à produção de vinho do Porto] anunciado pelo IVDP a 27 de Julho (menos 14 mil pipas em 2024, a somar ao corte de 12 mil pipas no ano anterior)». Até ao momento, apenas a destilação para combater a crise foi desencadeada, medida que não chega aos produtores de uva.
«Também não é com cadernos de intenções que se resolve a insustentável situação de milhares de agricultores durienses que tanto trabalharam e agora não têm a quem vender as uvas», acrescenta a CNA, avançando que «para salvar milhares de pequenas e médias explorações vitícolas são necessárias medidas extraordinárias de apoio directo aos pequenos e médios produtores da região que mitiguem, no imediato, a sua enorme perda de rendimentos», que «têm de chegar aos agricultores até ao final deste ano».
Audição ao ministro
Sexta-feira, 30, durante uma visita à AgroSemana – Feira Agrícola do Norte no Espaço Agros, na Póvoa de Varzim, Paulo Raimundo anunciou que os deputados comunistas na Assembleia da República (AR) vão pedir a realização de uma audição urgente do ministro da Agricultura e Pescas sobre as medidas necessárias para apoiar os pequenos e médios produtores de uva face à situação de emergência na viticultura portuguesa. A iniciativa contou com a participação – entre outros – de Alfredo Maia, deputado do PCP à AR, Jaime Toga e João Frazão, ambos da Comissão Política do Comité Central do PCP.
No requerimento refere-se que «os preparativos para as vindimas deste ano, incluindo os contactos com vista à aquisição de uvas juntos dos viticultores, mormente da Região Demarcada do Douro mas não só, vieram confirmar o pior dos receios dos pequenos e médios produtores».
«Milhares de produtores não conseguem garantir a venda das suas uvas ou do seu mosto, face ao alegado excesso de vinho ainda por escoar e à falta de capacidade de armazenamento, o que representará impactos económico-financeiros e sociais brutais. De resto, tais alegações entram em contradição com os relatos de viticultores, confrontados com ofertas de compra de uvas a valores muito inferiores aos custos de produção, numa intolerável atitude de oportunismo e chantagem», denunciam os comunistas.
Ainda segundo o PCP, a «destilação de emergência afigura-se insuficiente, e em certos aspectos desajustada, designadamente em termos de recursos financeiros a afectar, impondo-se, para além das necessárias medidas de fundo, a ajuda imediata e directa aos agricultores, isto é, aos pequenos e médios produtores».
Solidariedade do PCP
Na Póvoa do Varzim, o Secretário-Geral do PCP afirmou a importância da produção nacional e adiantou que a produção vitivinícola não está «em melhores lençóis» que o sector leiteiro, que, nos últimos anos, viu serem destruídas 90 por cento das explorações. Manifestou, por isso, solidariedade com os produtores de leite, em particular aos que fornecem actualmente a marca Pingo Doce, através da empresa «Terra Alegre», que foram surpreendidos com a informação de que serão dispensados e terão de procurar novo comprador de leite a partir de Janeiro de 2025.
Segundo a APROLEP – Associação dos Produtores de Leite de Portugal a situação não resulta de qualquer falha por parte dos produtores, tendo estes sido informados apenas que o comprador pretende reduzir a quantidade de leite que adquire.
«Esta atitude é surpreendente porque passaram apenas dois anos desde que estes produtores foram convidados a fornecer esta cadeia alimentar com a expectativa de um contrato de longa duração e perspectivas de crescimento», tendo arriscado «mudar de comprador para poderem aumentar a produção e ganharem uma dimensão sustentável para encarar os desafios do futuro. Fizeram investimentos e têm créditos para amortizar», informa a APROLEP, referindo que «esta situação é preocupante» e «será grave para todo o sector se não surgirem indústrias ou cooperativas com capacidade para comprar e valorizar esse leite de forma estável e com um preço sustentável, capaz de cobrir os custos de produção».
Sendo «difícil perceber a dificuldade em escoar e valorizar o leite português, quando Portugal continua a ser deficitário no sector dos lacticínios, sobretudo devido à importação de milhões de euros em queijos e iogurtes», a Associação lança um alerta e um apelo aos responsáveis políticos, ao sector da distribuição, à indústria de lacticínios e ao sector cooperativo «para uma análise conjunta desta situação com cuidado e responsabilidade, procurando as melhores soluções para o destino deste leite, destes produtores, dos seus funcionários e das suas famílias, de forma a não criar um desequilíbrio no mercado que desvalorize o leite português e coloque em causa todo o sector».
PCP avança com propostas necessárias
As direcções das organizações regionais (DOR) de Vila Real, Bragança, Viseu e Guarda do PCP realizaram uma conferência de imprensa, no dia 29 de Agosto, frente à sede da Casa do Douro, no Peso da Régua, para exigir do Governo «medidas excepcionais, dado o carácter excepcional da situação da Região Demarcada do Douro (RDD)».
Do Executivo PSD/CDS reclama-se que autorize um benefício de, pelo menos, o valor do ano passado, assegurando a aquisição pelo IVDP da quantidade necessária para o assegurar; fixe um preço de referência para a pipa de vinho generoso, que tenha em conta os custos de produção que não param de crescer; assegure um apoio de emergência aos pequenos e médios viticultores; atribua à Casa do Douro todas as suas competências e poderes regulatórios, que em situações como a actual, reforçam a sua impotência; intervenha, no quadro da União Europeia, para parar de imediato o processo de liberalização do plantio da vinha; assegure que as medidas para destilação de emergência para o Douro tenham preços que tenham em conta os seus elevado custos de produção e garantam aguardentes para o benefício provenientes da região; garanta o controlo e a limitação de importações de vinho a granel; faça com que o Programa VITIS seja aplicado para apoiar somente candidaturas oriundas de pequenos e médios produtores, destinadas a reestruturação ou substituição de vinhas existentes.
Problema de fundo
Na conferência de imprensa participaram três pequenos viticultores da Régua e Mesão Frio, Fernando Mendes, da DOR de Vila Real, Ricardo Brites, da DOR de Viseu, e Gonçalo Oliveira, responsável pelas organizações regionais de Vila Real e Bragança e da Comissão Política do Comité Central.
Alertaram para o facto de as medidas anunciadas pelo Governo de pouco valeram aos produtores e, por si só, em nada contribuíram para resolver o problema de fundo que afecta a RDD. Antes pelo contrário.
«Como se antevia, a destilação de emergência não revolve o problema criado pela importação de mosto e vinho nos últimos anos, situação agravada pela decisão de cortar novamente a quantidade de mosto a transformar em vinho do Porto», acusam os comunistas.
Também a decisão do Governo em usar verba própria do IVDP (resultante das taxas pagas pelos produtores) para reforçar o valor pago por litro de vinho a destilar, desviando assim 3,5 milhões de euros destinados à tão necessária promoção do vinho e diversificação do mercado, «não apenas desvia meios destinados a combater o problema da continuada quebra de consumo de vinho do Porto – também causada pelas sanções comerciais a países com importância para a exportação», como «põe os viticultores a pagar a própria medida», adianta o PCP.
Sobre o anúncio do ministro da Agricultura de «aumentar enormemente» a fiscalização da entrada ilegal de mostos a granel, o Partido considera que são «palavras de circunstância sem tradução no terreno e que chegam tarde», até porque Portugal é o 5.º maior importador de vinho a granel do mundo, mas várias regiões vinícolas estão confrontadas com problemas similares ao da RDD, «o que demonstra bem que a natureza do problema é outra e não tem origem apenas na importação ilegal».
Agrupamentos de baldios sem apoios
A Federação Nacional dos Baldios (BALADI) alertou em Julho o Governo para a falta de compromissos previstos nas duas resoluções do Conselho de Ministros aprovadas em 2023 e 2024, que «poderá pôr em causa, ulteriormente, o trabalho efectuado no quadro do projecto piloto nos terrenos baldios do Norte e Centro do País», concebido, em 2019, pela BALADI, Secretaria de Estado das Florestas e Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas. Segundo uma nota de imprensa da Federação, em causa está a «delonga» no pagamento de um fundo ambiental com uma verba de cinco milhões e 400 mil euros para garantir a continuidade e o desenvolvimento dos Agrupamentos de Baldios da 2.ª Geração até 2027.