Os donos-disto-tudo e nós
Escreve a Forbes (2.1.24) que as 50 famílias mais ricas de Portugal detêm, juntas, um «património empresarial de quase 40 mil milhões de euros, o que corresponde a 16,5% do PIB nacional», que em 2022 se situou nos 242,3 mil milhões de euros. As 10 primeiras da lista – encabeçada pelas famílias Amorim (Galp e Corticeira Amorim), Soares dos Santos (Jerónimo Martins/Pingo Doce), Guimarães de Mello (Grupo José de Mello) e Azevedo (Sonae/Continente) – reservam para si «uma fatia de 20,3 mil milhões de euros», ou seja, praticamente metade do total acumulado pelas 50 mais ricas.
Mas a revista que se ocupa de fortunas e dos seus detentores, de cotações bolsistas e activos financeiros, dá mais informações interessantes.
Diz, por exemplo, que o património dos 50 mais ricos valorizou, nos últimos anos, mais de 65%: «Quando a Forbes Portugal realizou o mesmo estudo em 2019, antes da pandemia, portanto, os 50 portugueses presentes na lista acumulavam uma riqueza conjunta de 24 mil milhões de euros, o que representava então 12% do PIB.» E revela ainda os sectores de onde provêm as principais fortunas. O caso das primeiras quatro, atrás referidas, é particularmente revelador: actuam em diversos ramos industriais, na saúde, na energia e na grande distribuição. Este último (representado por duas famílias entre as quatro mais ricas) foi mesmo um dos que mais crescerem «em tempos de pandemia e que acabou por ganhar com a inflação», informa a publicação.
Deixemos a Forbes e fixemo-nos antes na realidade que aborda: virando-a do avesso, se preciso for; desvendando o que ali se oculta; observando-a não através da lente destas 50 famílias e do seu desempenho económico, mas de milhões de outras, crescentemente desapossadas de uma riqueza cada vez mais concentrada.
Só em 2022, os lucros combinados da Jerónimo Martins e da Sonae atingiram 1014 milhões de euros, cerca de 3 milhões a cada dia, enquanto a Galp arrecadou, sozinha, 1104 milhões – mais 84% do que no ano anterior. Nesse ano, precisamente, a inflação atingiu os 8% e milhões de portugueses viram cair a pique o seu poder de compra (e, com ele, as suas condições de vida), à medida que disparavam os preços dos combustíveis e dos alimentos.
A tendência manteve-se em 2023: lucros obscenos para uns, dificuldades crescentes para a maioria. E assim promete continuar no ano que agora se inicia. Isto, claro, se PS, PSD, CDS, Chega e IL mantiverem força bastante para continuarem a limitar aumentos de salários e pensões, a travar a fixação e redução dos preços de bens e serviços essenciais, a impedir a taxação de fortunas e rendimentos de capital. Ou seja, a servir os donos-disto-tudo.
É também isto que se decide a 10 de Março. E na luta de todos os dias.