0,24% de socialismo
Há coisas que não são possíveis de quantificar. Como o tentar saber quanto resta de socialismo neste PS, mesmo neste PS à esquerda de outro PS que ainda ficaria à sua direita. A recente polémica artificial sobre a compra de acções dos CTT pelo Governo em 2021 vem dar-nos um número que permite responder a essa pergunta: 0,24%.
É que por muito que a direita mais assumida grite e esbraceje contra o radical socialismo deste gesto, o volume de acções comprado pelo Governo é ridículo e não serve nenhum outro propósito que o de valorizar as acções dos CTT, contribuindo para enriquecer a família Champalimaud, então o maior accionista dos CTT.
Da mesma forma que esta compra, pelo PS, não é mais que um fingir que se está a inverter uma privatização desastrosa. Porque os 0,24% não são nada e nada permitem controlar. Porque mesmo que o Governo tivesse alguma intenção de comprar os 1,95% que determinou o ministro das Finanças, esse valor continuaria a não permitir nada. Aliás, mesmo que o Governo tivesse a mais mínima intenção de comprar 13% dos CTT, tornando-se então o maior accionista, essa percentagem continuaria a manter a empresa sob gestão privada, pois é inferior à do conjunto dos capitalistas presentes no capital (mesmo sem ter em conta o capital disperso em bolsa). Como o PCP lhes disse na altura e continua a dizer.
Aquilo que o Governo deveria ter feito – como o propôs o PCP, e o exigiam os trabalhadores e os utentes – era ter renacionalizado os CTT que estão a ser destruídos pela gestão privada. Mas essa medida não cabe claramente nos 0,24% de socialismo que ainda por ali restam. O que cabia nos restantes 99,76% era um acordo secreto, feito entre o Governo e a família Champalimaud, para prolongar a concessão por ajuste directo, para alterar a lei postal por decreto-lei sem sequer passar na Assembleia da República e para afastar o presidente da ANACOM que tão exigente se revelava perante a degradação dos Correios. E como é lógico, nem o Chega, nem a IL, nem o PSD, nem a Comunicação Social Dominada se indignaram com estes acordos.