Esclarecimento e mobilização em defesa de quem trabalha
O PCP esteve, durante o dia de ontem, em locais de trabalho por todo o País. Muitos foram os militantes que contactaram e esclareceram trabalhadores sobre os quatro projectos de alteração à legislação laboral que se discutiram, no mesmo dia, na Assembleia da República. Numa destas acções, na Matutano do Carregado, em Alenquer, esteve Paulo Raimundo.
Reforçar direitos no trabalho nocturno e por turnos é imperativo
Os quatro projectos (ver caixa) pretendiam repor o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, a revogação do regime de caducidade da contratação colectiva, a reposição dos valores de pagamento do trabalho suplementar e o reforço dos direitos dos trabalhadores em regime de trabalho nocturno e por turnos. Na visita à Matutano, ficou clara a justeza desta última iniciativa, a qual, entre outros aspectos, pretendia limitar o trabalho nocturno e por turnos a situações justificadas.
Pouco antes das 7H30, em declarações ao Avante!, duas trabalhadoras relatavam as dificuldades do regime de trabalho daquela fábrica. «Trabalhamos fins-de-semana, mas se depois não for preciso, paramos segunda, terça e quarta. Os volumes de trabalho baixaram. Não se justifica a laboração contínua», afirmou Ana. «Estamos a falar de horários de laboração contínua e, nesta empresa, onde se frita batatas, não há necessidade disso», revelou Teresa, acrescentando serem comuns situações de «pessoas com muitos anos de casa que acabam por se despedir por causa do regime de laboração».
«Neste momento não há trabalho que justifique a laboração contínua. Pode haver picos, mas para isso pode-se recorrer às horas extraordinárias como acontecia há quatro anos», explicou aquela trabalhadora.
Travar desregulação das vidas
Para lá de uma desvalorização salarial provocada pelo aumento do custo de vida, é também a precariedade que preocupa quem trabalha na Matutano. Dos 350 operários, uma percentagem assinalável é composta por trabalhadores temporários. Aliás, tal ficou evidente à chegada ao local. É tamanha a utilização de mão-de-obra precária que a primeira estrutura que se observa para lá dos gradeamentos, está ocupada pela empresa de trabalho temporário a que a Matutano mais recorre.
Com rumores de acordos de rescisão a serem propostos aos trabalhadores com mais anos de casa, ritmos e horários incompatíveis com a vida pessoal, receio de marcar presença na luta por represálias impostas pelos vínculos precários – é assim que os colegas de Ana e Teresa trabalham todos os dias. Mas esta não é apenas a vida de quem labora na Matutano. É, sim, a de milhares de trabalhadores de todo o País. Os problemas enumerados por Ana e Teresa não serão muito diferentes daqueles que outras trabalhadoras de outra fábrica poderiam relatar. Foi por estes que o PCP levou quatro propostas de alteração à legislação laboral à Assembleia da República e que esteve, nos locais de trabalho, a esclarecer e a mobilizar.
Foi também esta a realidade que o Secretário-Geral do PCP atestou na Matutano. «Um último projecto que apresentámos hoje é sobre o trabalho por turnos, que tem uma dimensão brutal no nosso País – mais de um milhão e 800 mil trabalhadores. É o trabalho nocturno, por turnos, com tudo o que isso implica na desregulação da vida e nas questões de saúde física e mental», afirmou, em declarações à imprensa, depois de distribuir dezenas de panfletos a quem saía do turno da noite e aos que entravam para o primeiro turno do dia dia.
«Estamos aqui na Matutano, uma empresa que tem laboração contínua exactamente para alertar que há sectores que não justificam o trabalho por turnos, sectores em que não se justifica a laboração contínua», constatou, argumentando que a outra grande questão central é a «valorização de quem trabalha nessas condições».
PCP leva defesa dos direitos laborais à AR
Inseparável da acção de contactos com trabalhadores ontem levada a cabo pelo PCP em vários pontos do País, nas quais se incluiu a presença do Secretário-Geral manhã cedo junto às instalações da Matutano no Carregado, esteve a apreciação no Parlamento em agendamento potestativo da bancada comunista de quatro diplomas seus com incidência directa em matéria laboral.
Submetidos a plenário igualmente no decurso do dia de ontem, já depois do fecho da nossa redacção, os projectos de lei foram elaborados com o propósito de reverter normas gravosas da legislação laboral e, simultaneamente, reforçar direitos dos trabalhadores.
Eliminar a caducidade dos contratos colectivos de trabalho, revogando para o efeito o respectivo regime, eis o objectivo de um dos textos legislativos com que foram confrontadas as restantes forças políticas com assento parlamentar.
Outro dos diplomas tinha em vista o reforço dos direitos dos trabalhadores no regime de trabalho nocturno e por turnos, clarificando, nomeadamente, o carácter excepcional do mesmo e que a ele corresponde o período das 20h00 às 7h00 do dia seguinte.
Não menos importante é o projecto de lei que repõe o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador. Removido da legislação em 2003 por um governo PSD/CDS, assim se manteve por vontade do PS nas alterações por este aprovadas ao Código do Trabalho em 2009.
Em debate, de cujo resultado daremos conta na próxima semana, esteve ainda outro projecto de lei orientado para contrariar as alterações para pior introduzidas na legislação laboral por sucessivos governos. Falamos da reposição dos montantes e regras de cálculo do pagamento extraordinário, trabalho suplementar e em dia feriado. Para o PCP, no caso concreto do trabalho suplementar, essa reposição deve ser de 50% da retribuição na primeira hora, 75% nas horas e fracções subsequentes e 100% quando prestado em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em dia feriado, para todos os trabalhadores.