À mão des(armada)
Há quem, para nos poupar a este cortejo de notícias que qualquer investigação sobre potenciais actos corruptivos suscita, se perfile para pôr termo, sem mais delongas, ao que perturba aquela dinâmica empreendedora que o atavismo burocrático e, pior, a transparência obrigam.
O lobbing aí está, na ordem do dia, sendo o que é, ainda que vendido pelo que não é. Com o lobbing fica tudo mais escorreito, rápido e eficaz. O que é ilegal, opaco, criminoso fica por lei legitimado. Poupa-se nas investigações, reduz-se o leque de práticas ilícitas, não se mancha o nome de quem suborna. Só vantagens incluindo para o défice pelo que se reduz de meios para investigar, celas por ocupar, julgamentos por realizar.
Um género de simplex no domínio do favorecimento afastando arreliadoras suspeitas, prescindindo de diligentes pressões ou pedidos de favor. De uma penada fica arredado aquela imensidão de maçadas, escolhos, pontas soltas, rabos de palha.
Para lá dos rendilhados legislativos, dos articulados encriptados, dos enternecedores preâmbulos, ungidos de benévolas intenções, o que em substância sobrará é um manual de fazer com o que hoje é punível passe a acto lícito. Um género de alquimia capaz de transformar corruptores em credenciados «facilitadores» ou «lobbistas», essa nova categoria profissional florescente, e de fazer do crime uma arte, uma forma de bem fazer o que era suposto não se poder fazer. Com a vantagem de prescindir de telefonemas, mensagens encriptadas, almoços ou encontros velados. Só poupança de recursos e tempo ganho, porque neste domínio tempo é dinheiro.
Para leitores mais distantes destes meandros exemplifique-se. Imagine-se a intenção de assalto a uma instituição. Em condições normais um acto complexo, recheado de riscos, a exigir avaliação sobre como entrar, não tropeçar num segurança, escapar a uma câmara de vigilância, não deixar rasto sempre com a incerteza se a ousadia do acto terá compensação correspondente. Fosse o lobbing aplicável ao caso, atendidas as devidas distâncias que há entre um deplorável assalto à mão armada e um louvável acto de empreendedorismo, e tudo se resolveria sem sobressaltos, com recurso a um facilitador que não só franquearia as portas como previamente daria conta do que se apropriar.