Países exigem mudanças nas Nações Unidas e mais voz aos países em desenvolvimento

A abertura da 78.ª Assembleia Geral das Nações Unidas, entre os dias 18 e 26, teve como tema central «Reconstruir a confiança e reavivar a solidariedade global. Acelerar a acção sobre a Agenda 2030 e o seu desenvolvimento sustentável rumo à paz, à prosperidade, ao progresso e à sustentabilidade para todos».

ONU deve cumprir o seu papel de construtora de um mundo mais justo, solidário e fraterno

Entre as múltiplas intervenções dos Estados-membro da ONU, o presidente do Brasil, Lula da Silva, denunciou a falta de vontade política «daqueles que governam o mundo» para vencer a desigualdade. «A desigualdade deve inspirar indignação. Indignação com a fome, a pobreza, a guerra, a falta de respeito ao ser humano», afirmou, insistindo que apenas «movidos pela força da indignação poderemos actuar com vontade e determinação para vencer a desigualdade e transformar efectivamente o mundo ao nosso redor». E convidou a ONU a cumprir o seu papel de construtora de um mundo mais justo, solidário e fraterno.

No mesmo sentido, a China defendeu o aumento da representação dos países em desenvolvimento, o multilateralismo e a reforma do sistema financeiro, económico e de segurança. O vice-presidente chinês, Hang Zheng, garantiu que a China, «como o maior país em desenvolvimento, é um membro natural do Sul Global e sempre partilhou o mesmo destino com os muitos países em desenvolvimento». Acentuou o respeito de Pequim pela soberania nacional de cada país e ratificou o apoio ao sistema internacional com a ONU como núcleo.

Pela voz do seu presidente, Miguel Díaz-Canel, Cuba condenou o cerco imposto pelos EUA e denunciou esse bloqueio como uma guerra económica extraterritorial, cruel e silenciosa, acompanhada de uma poderosa maquinaria política de desestabilização, com fundos milionários aprovados por Washington. O chefe do Estado cubano rejeitou as medidas coercivas unilaterais impostas pelos EUA a Cuba e também a países como Zimbabué, Síria, Irão e República Popular Democrática da Coreia.

A Rússia, através do seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Serguéi Lavrov, acusou os EUA, «império da mentira», de não cumprir os compromissos com o resto do mundo e de, com os aliados, instigar novos conflitos para dividir a humanidade e evitar «a emergência de um mundo multipolar». Lavrov reiterou que está a nascer uma nova ordem mundial. «Os contornos do futuro estão a ser criados numa luta «entre a maioria mundial, que advoga uma repartição mais equitativa dos benefícios globais e da diversidade civilizatória, e os poucos que aplicam métodos neocolonialistas de subjugação para aferrar-se ao seu indescritível domínio».

Já o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, exortou a ONU a centrar esforços em prol de um futuro pacífico, próspero e sustentável para o mundo e para as gerações vindouras. Assinalou que, hoje, grande parte da humanidade enfrenta guerras e conflitos, miséria e fome, enfermidades e desastres ambientais. Nestas condições, após uma devastadora pandemia global, disse, alcançar os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável definidos pela ONU parece estar cada vez mais distante. Considerou, contudo, que esses males, divisões e problemas aparentemente insolúveis podem e devem superar-se, contando a comunidade global «com os meios e o desejo» para tal.

 

«Os nossos países não podem continuar a ser laboratórios de receitas coloniais»

Em paralelo com a semana de alto nível da Assembleia-Geral das Nações Unidas, decorreram na sede da ONU, em Nova Iorque, diferentes encontros multilaterais.

Reuniram-se representantes do G77 e China, dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), da Organização de Cooperação de Xangai, do Grupo de Amigos em Defesa da Carta da ONU, do Movimento de Países Não Alinhados, da Organização do Tratado de Segurança Colectiva, da Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América-Tratado de Comércio dos Povos (ALBA-TCP), entre outros mecanismos e fóruns.

O presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, intervindo na 47.ª reunião ministerial do G77 e China, defendeu este grupo como porta-voz legítimo das posições do Sul Global, perante a falta de uma resposta internacional coordenada aos problemas actuais. Face aos desafios monumentais, «é mais urgente que nunca a obtenção de consensos, a reflexão construtiva, a unidade de ideais, o alinhamento do pensamento ao serviço do desenho e promoção de uma nova ordem económica internacional», afirmou.

Na qualidade de presidente temporário do G77 e China, denunciou que nas últimas décadas cresceram a instabilidade e as trocas desiguais, num quadro de crise sistémica agravada pela pandemia. Mais: os progressos para pôr fim à pobreza extrema retrocederam três ou quatro anos e os países mais pobres destinaram mais recursos para o serviço da dívida do que para a saúde pública, ao mesmo tempo que um por cento dos mais ricos apoderaram-se de quase dois terços da riqueza gerada a nível global desde 2020.

O dirigente cubano insistiu no seu apelo para um novo e mais justo contrato global e avisou: «Os nossos países não podem continuar a ser laboratórios de receitas coloniais e de renovadas formas de dominação que utilizam a dívida, a arquitectura financeira vigente e as medidas coercivas para perpetuar o subdesenvolvimento e encher os cofres de uns poucos».

 

Reformar o Conselho de Segurança da ONU

A necessidade de reformar o Conselho de Segurança da ONU foi realçada pelos ministros dos Negócios Estrangeiros da África do Sul, Brasil e Índia, após uma reunião realizada em Nova Iorque, à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas.

Os ministros enfatizaram que, embora a reforma integral do sistema da ONU continue a ser uma tarefa internacional crítica, promover a reforma do Conselho de Segurança deve continuar a ser uma prioridade urgente e máxima. Expressaram a sua decepção pela paralisação observada nas negociações intergovernamentais sobre a reforma do Conselho de Segurança, «que carecem de transparência nos métodos de trabalho e não conduziram a avanços tangíveis na Assembleia Geral da ONU». E reafirmaram o seu compromisso de trabalhar para ampliar o número de membros do Conselho de Segurança visando incluir representantes dos países em desenvolvimento de África, América Latina e Ásia, tanto permanentes como não permanentes. Isto, para conseguir um Conselho de Segurança «reformado, representativo, justo, receptivo e eficaz, que reflicta as realidades globais modernas».

Os três países participam no fórum trilateral IBSA (Índia, Brasil, África do Sul), criado em 2003 para promover a cooperação internacional entre esses Estados, além de serem membros dos BRICS.

 



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