O desafio
Há 75 anos, entre 25 e 28 de Agosto de 1948, realizou-se na cidade polaca de Breslávia (Wroclaw), ainda parcialmente destruída, o Congresso Mundial dos Intelectuais pela Paz. Entre as centenas de delegados, provenientes de 45 países, contavam-se algumas das mais destacadas figuras da ciência, da técnica, das artes e das letras daquela época (e de todas as épocas): Pablo Picasso e Henri Walon; Ilya Ehrenburg e Anna Seghers; Aimé Cesaire e Irène Joliot-Curie. E muitos outros, de igual dimensão e prestígio.
«De peso» foi também a representação portuguesa, que integrava o físico Manuel Valadares, o escritor Alves Redol, o compositor Fernando Lopes-Graça, o psiquiatra João dos Santos, a médica Hermínia Grijó e a bióloga Maria da Costa. Entre as delegações mais numerosas contavam-se a soviética, a norte-americana, a francesa, a britânica, a italiana e, naturalmente, a polaca.
«Levantamos a voz em favor da paz, do livre desenvolvimento cultural dos povos, da sua independência nacional e da sua estreita cooperação», escreveu-se no Manifesto do Congresso, que das ruínas de Breslávia dirigiu ao mundo um luminoso apelo: organizar em cada um dos países, e a nível internacional, a luta em defesa da paz.
A resposta foi expressiva: em poucos meses havia já comités de defesa da paz em dezenas de países; em Abril de 1949 milhares de pessoas reuniram-se em Paris e em Praga no primeiro Congresso Mundial dos Partidários da Paz; em Março de 1950 foi lançado o Apelo de Estocolmo, que recolheria centenas de milhões de assinaturas contra as armas nucleares; no final desse ano seria constituído o Conselho Mundial da Paz.
Os promotores e participantes daquele congresso não podiam adivinhar a importância histórica que o acontecimento de que eram protagonistas viria a assumir. Mas foram, sem dúvida, capazes de compreender os desafios do tempo em que viviam, marcado já pela imposição de uma «guerra fria» apontada contra a avalanche libertadora e emancipadora que então se verificava e sustentada no monopólio da arma nuclear e numa acelerada corrida aos armamentos. A paz por que lutavam, conquistada na dura luta contra o nazi-fascismo (essa forma tão brutal de imperialismo), ganhava então novos significados: implicava direitos e justiça social para os povos, soberania e igualdade entre os Estados.
Se regressamos hoje a este Congresso e a tudo o que dele emanou é por aquele que é seguramente o seu mais perene ensinamento: o de que é possível unir amplos sectores sociais, políticos, ideológicos, religiosos e personalidades das mais variadas áreas num mesmo combate por uma paz justa e democrática capaz de travar – e derrotar! – os que desde há muito condenam os povos à miséria, à opressão e à guerra.
Saibamos estar à altura do desafio como outros, a seu tempo, fizeram.