Interesses imobiliários e da banca falam mais alto do que o direito à habitação

O problema da habitação é hoje uma preocupação central na vida de milhares de famílias, nomeadamente entre os jovens. A situação é grave e não se perspectiva que melhore com as medidas que o Governo submeteu ao Parlamento e a maioria absoluta que o suporta sufragou.

A habitação é um direito, não uma mercadoria

Lusa

A proposta que aprova medidas no âmbito do plano de intervenção «Mais Habitação» esteve em debate dia 19, tendo sido aprovada, na generalidade, apenas com o voto favorável do PS, a abstenção do PAN e Livre e o voto contra das restantes bancadas. O diploma baixou à comissão para debate na especialidade.

Em apreciação estiveram ainda iniciativas legislativas de vários partidos. Foi o caso do PCP, com propostas dirigidas todas elas em defesa do direito à habitação. Desse conjunto de iniciativas dos partidos da oposição, apenas o projecto de resolução comunista orientado para o reforço dos meios do Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) obteve luz verde, com os votos a favor de PS, PCP, BE, PAN e Livre e a abstenção dos restantes partidos.

Já os dois projectos de lei da bancada comunista com medidas muito concretas para protecção da habitação foram chumbadas sem apelo nem agravo pelos votos contra de PS, PSD e IL. Pela parte do PCP, não faltaram assim soluções para um problema que afecta um número crescente de famílias e que adquiriu, em muitos casos, contornos dramáticos.

Premiar especuladores
O que faltou mesmo foi abertura e vontade política do Governo para as acolher. Nada que surpreenda, se atendermos a que as opções por aquele tomadas têm revelado um iniludível compromisso com todos aqueles que têm ganho muito com a especulação da habitação, designadamente a banca, os fundos imobiliários e os grandes proprietários.

Cai por isso por terra a afirmação feita pela titular da pasta da Habitação de que o objectivo do Governo é «garantir que as famílias têm direito a uma habitação digna».

Daí a crítica severa ao programa «Mais Habitação», com o PCP a acusar o Governo de se recusar a enfrentar os grandes interesses no sector imobiliário e financeiro.

O deputado comunista Duarte Alves, citando palavras do Secretário-geral do PCP a este propósito, considerou mesmo que o pacote de medidas do Governo «mais podia levar o nome de «Mais Transferências»: «mais transferências para a banca e para os grandes interesses imobiliários, já que o que traz é um aumento das borlas fiscais para premiar os especuladores». Exemplificando, apontou a baixa da tributação autónoma sobre rendimentos prediais, «sem qualquer distinção pelo valor da renda»; a isenção de IRS e IRC até 2030 de todos os alojamento locais que passem para habitação; a isenção de imposto (IRS e IRC) de qualquer venda de património ao Estado, «mesmo que beneficie de uma valorização especulativa».

Proteger a habitação
Mas as críticas da bancada comunista não se esgotaram neste plano. Das medidas preconizadas pelo Governo do PS ressalta ainda a inexistência de soluções para proteger os inquilinos e a habitação das famílias – «muitas delas empurradas para o endividamento por via do crédito à habitação», como observou o deputado Bruno Dias na conferência de imprensa que o PCP realizou na antevéspera do debate para divulgar o conteúdo das suas propostas.

Tal como não há soluções efectivas para assegurar o aumento da disponibilidade de habitação pública, o que levou a bancada comunista a considerar que também neste capítulo o Governo falha redondamente ao recusar assumir as suas responsabilidades, preferindo empurrar essa obrigação para as autarquias.

A presidente do Grupo Parlamentar do PCP concluiu por isso que a situação actual exige soluções que «garantam o acesso à habitação a custos compatíveis com os rendimentos das famílias e a protecção da habitação morada de família, seja em situação de arrendamento, seja para quem contraiu empréstimo à habitação, ou ainda para que ninguém fique sem a sua casa».

Nesse exacto sentido vão as propostas do PCP: regular preços, alargar a oferta de habitação pública, combater a especulação e os impactes da subida dos juros.

Estas, sim, são medidas que vão no sentido certo, pensadas com o único objectivo de garantir o direito à habitação. Porque, como sublinhou Paula Santos, a «habitação é um direito para viver e não uma mercadoria para especular», é «base para a organização da vida pessoal e familiar».

 

Soluções urgentes e necessárias

Não é por falta de propostas concretas que o gravíssimo problema da habitação – dificuldade em aceder a ela ou mantê-la - não se resolve. Da parte do PCP não têm faltado as soluções, como de novo ficou patente neste processo legislativo. Eis as suas principais propostas:

- Criação de um regime especial de protecção dos inquilinos, limitativo do valor dos novos contratos, que garante a estabilidade no arrendamento, elimina o balcão dos despejos e restringe as situações de despejo;

- Criação de um regime especial de protecção da habitação própria, colocando os lucros da banca a suportar o aumento das taxas de juro; garantia de renegociação mediada dos contratos de crédito à habitação, permitindo o alargamento do prazo de amortização; aplicação de uma moratória de capital no pagamento do empréstimo; dação em cumprimento, considerando a dívida extinta; conversão do empréstimo em arrendamento com possibilidade de retoma do crédito.

- Alargamento da oferta pública de habitação através da mobilização do património público para fins habitacionais, proibindo a sua alienação; apoio a programas de habitação sem fins lucrativos; criação de uma linha de apoio para a recuperação e reabilitação de habitações devolutas e criação de um regime simplificado de posse administrativa pelo IHRU de imóveis devolutos, quando os proprietários não recorram a esse mecanismo, para disponibilização para arrendamento no regime de renda condicionada;

- Fim dos regimes fiscais de favorecimento, nomeadamente o fim do regime fiscal para os residentes não habituais.

- Definição clara do IHRU como o organismo do Estado promotor de habitação pública e dinamizador das políticas de construção e reabilitação urbana.

- Eliminação da possibilidade de penhora ou execução de hipoteca sobre a habitação quando se comprove a inexistência de rendimentos suficientes para assegurar a subsistência do executado ou do seu agregado familiar, incluindo no âmbito de processos de execução fiscal.

 



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