Frieden Schaffen

Anabela Fino

As tradicionais marchas da Páscoa na Alemanha ficaram este ano marcadas pela situação na Ucrânia, numa altura em que cresce o número de vozes a exigir que o governo do chanceler Olaf Scholz desenvolva esforços para um cessar-fogo e uma solução negociada do conflito. «Cada dia adicional de guerra significa mais mortos e feridos. O governo federal deve agir e fazer tudo ao seu alcance para obter um cessar-fogo e negociações para acabar com a guerra na Ucrânia», lê-se num comunicado da Rede de Cooperação para a Paz.

Posição semelhante advogam os mais de 200 signatários da carta aberta intitulada «Façam aPaz» («Frieden Schaffen»), em que antigos altos dirigentes políticos do SPD, dirigentes sindicais e representantes do movimento pacifista alemão apelam a Scholz, também ele do SPD, para pressionar por negociações rápidas para pôr fim à guerra.

A guerra tornou-se «numa sangrenta guerra de trincheiras na qual só há perdedores», diz o texto, sublinhando que a cada dia que passa aumenta o perigo de uma escalada das hostilidades.

«A sombra da guerra nuclear paira sobre a Europa. O mundo não deve cair noutra grande guerra», alertam os signatários, entre os quais figuram o antigo chanceler Willy Brandt, o antigo dirigente da Confederação alemã dos sindicatos (DGB), um antigo presidente do parlamento alemão, um antigo comissário europeu e um antigo presidente da Igreja evangélica na Alemanha. No elenco, torna-se impossível não notar a flagrante ausência de «Os Verdes», antigo partido pacifista que hoje se assume como o mais intrépido defensor da transferência de armamento para a Ucrânia, pressionando publicamente Scholz para que adopte uma postura mais dura em relação à Rússia.

Quem também reagiu mal ao apelo para «pôr fim às matanças e explorar as possibilidades de paz» foi o embaixador da Ucrânia na Alemanha, para quem «este apelo à paz é uma piada de 1 de Abril» e de «puro cinismo face às numerosas vítimas da agressão russa».

A aceitação das posições belicistas parece no entanto estar a perder terreno, não obstante a avassaladora pressão mediática que nesse sentido se faz sentir em toda a Europa. No caso concreto da Alemanha, uma sondagem revelava, em fins de Janeiro, que mais de 80% dos alemães consideravam ser mais importante pôr fim à guerra através de negociações do que ver a Ucrânia «ganhar», e a petição Manifesto pela paz, lançada em Fevereiro por Sahra Wagenknecht, do Die Linke, e pela publicista Alice Schwarzer, recolheu cerca de 800 000 assinaturas.

Já a alemã Von der Leyen, sempre divorciada dos interesses europeus e enfeudada a Washington, e mais agora que, consta, está na corrida à liderança da NATO, continua a usar a Ucrânia para lançar e atiçar a tensão sino-americana. Enquanto o negócio render, a Paz pode esperar.




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