Corrupção: a mão por detrás do arbusto

Vasco Cardoso

Na torrente de notícias sobre corrupção que, cumprindo uma agenda meticulosamente preparada, inundam o debate público há, em regra, uma grave omissão: a responsabilização do grande capital. Toda a narrativa em torno da sucessão de casos que vão preenchendo a agenda mediática - e que fazem fermentar uma cultura marcada por valores cada vez mais reaccionários – é centrada na responsabilização dos «políticos» e do «Estado». A corrupção é apresentada como uma decorrência quer do funcionamento das instituições democráticas, quer da existência de serviços, funções e empresas públicas. Esta gigantesca operação, que está longe de se cingir ao nosso País, mata dois coelhos com uma cajadada só.

Claro está que toda a mentira para «atingir profundidade» como dizia Aleixo «tem que trazer à mistura qualquer coisa de verdade». E não falta por aí quem se aproveite da utilização de responsabilidades políticas e cargos públicos em proveito próprio, esquemas dos mais diversos para subtrair ao erário público recursos que são de todos, portas giratórias entre funções governativas e altos cargos em administrações de empresas, e até mesmo, os mais descarados roubos que não podem deixar de causar indignação e revolta, sobretudo quando alastra a exploração e a pobreza.

Mas sendo tudo isto verdade o facto é que, na base desta realidade, está uma sociedade dominada pelo grande capital. Que tem na política de direita e nos partidos que a promovem, instrumentos fundamentais ao seu serviço. Privatizações, paraísos e benefícios fiscais, livre circulação de capitais, domínio monopolista dos preços e das regras de mercado, o lucro como primeiro e único objectivo da sociedade. A corrupção é uma característica intrínseca do capitalismo e, ao contrário do que procuram fazer crer, assume carácter de política de Estado em situações como a da ditadura fascista que oprimiu o povo português durante 48 anos.

O que procuram esconder é que os principais beneficiários e promotores da corrupção são os grupos económicos e as suas teias de poder e influência. Esses, que em vez de se sentarem no banco dos réus, se aproveitam das trágicas consequências que os seus interesses promovem para reforçarem ainda mais o poder que já hoje detêm.




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