A luta funciona

António Santos

Foram precisos 40 dias de greve ininterrupta para 40 mil trabalhadores da Universidade da Califórnia (UC) conquistarem, na semana passada, aumentos salariais entre os 25 e os 80 por cento. A direcção da Universidade, que até 2017 se recusava a reconhecer a existência do sindicato, foi obrigada a ceder a todas as reivindicações da plataforma sindical que promoveu a greve: aumento de 27 por cento no abono de família; aumento das licenças parentais para oito semanas; isenção de taxas educativas; suspensão indeterminada das propinas extraordinárias dirigidas aos estudantes estrangeiros; passes de transportes públicos gratuitos e alargamento da cobertura dos seguros de saúde, entre muitas outras conquistas.

Os novos contratos, que abrangem professores assistentes, tutores, leitores e investigadores têm, no entanto, uma duração de apenas dois anos e meio, pelo que os trabalhadores da academia californiana já antecipam nova luta. «Temos que aprender que a organização e a capacidade para a luta não podem começar quando as coisas ficam feias e terminar quando as coisas melhoram», explicou-me Kathleen McJewel, que partilha as funções de delegada sindical com as de estudante de doutoramento, investigadora e professora assistente da Escola Superior de Educação de Gevirtz do polo de Santa Bárbara. «Quem acha que a greve durou muito tempo não sabe o tempo que ela demorou a preparar. Estivemos quatro anos a prepará-la. Quatro anos de perseguições, ameaças e, por vezes, incompreensão. A UC chamava a polícia quando nos via a distribuir papeis. Tivemos seguranças privados a seguir-nos até casa. Tive colegas a dizer-me que a minha carreira académica estava terminada. Agora que vencemos, toda a universidade trata as nossas vitórias como conquistas de senso comum e parece que toda a gente está de acordo. Mas daqui a dois anos vamos voltar a ser intimidados, isolados e pressionados para aceitar um contrato que não nos interessa».

Três sindicatos organizaram a greve: o UAW 2865, o UAW 5810 e o SRU-UAW, mas a greve contou com a solidariedade de sindicatos dos mais variados sectores: «Quase todas as semanas tínhamos piquetes: nos armazéns da logística; nos estaleiros de obras; nos portões. A nossa mensagem era: não furem a nossa greve. E muitos sindicatos deram mesmo ordens aos seus sócios para não trabalharem com a UC enquanto durasse a greve. Não se cruza um piquete de greve».

Para além da greve e dos piquetes, os trabalhadores recorreram a manifestações de massas, de que se destaca a de 17 de Novembro, as conversas individuais com alunos e outros trabalhadores e a interrupção, com palavras de ordem, dos eventos públicos organizados pelo patronato.

«Esta é uma vitória histórica, mas não é pela sua duração, nem por ter sido a primeira, nem sequer pela dimensão dos aumentos que conseguimos», explicou-me Kathleen, «é histórica, porque mostrámos à América inteira, a todos os trabalhadores, que não estamos condenados, que podemos lutar e nem sequer temos de nos contentar com aumentos em linha com a taxa de inflação. Se os patrões estão cada vez mais ricos, nós podemos ter aumentos tão impressionantes como os lucros deles», concluiu.

 



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