A exploração

João Frazão

Somos obrigados a voltar ao tema da imigração e das condições de escravatura em que muitos deles se encontram, não tanto pela operação policial que levou à detenção de mais de três dezenas de pessoas, mas por aquilo que dela decorre.

Em primeiro lugar temos de insistir na perplexidade que aqui já registámos em duas anteriores ocasiões. Havendo trabalhadores migrantes no nosso País, sendo eles mal pagos, trabalhando em condições sub-humanas, algumas vezes em situação de sequestro, não trabalharão em nenhuma herdade em concreto? Não apanham azeitona, vigiam regas, fazem mondas, cuidam de frutos, ou tratam de animais? E não são essas azeitonas, as plantas que eles amanham, os frutos que apanham, os animais que ajudam a engordar que alimentam os lucros das explorações agrícolas onde trabalham, de novo, de sol a sol? Não menorizando o abjecto papel das redes de tráfico de seres humanos, não aceitaremos que passem incólumes aqueles que se apropriam da riqueza criada por estes e por outros trabalhadores.

O que nos leva à questão seguinte, uma vez que, tendo ouvido Marques Mendes dizer que «isto é quase escravatura, é exploração», importará lembrar (não a ele que sabe bem do que fala e do que falamos nós, mas a incautos que possam cair no conto vigário) que explorados são todos que trabalham por conta de outrem e produzem riqueza que é apropriada pelo capital, na parte do trabalho não pago.

E que, em síntese, justifica ainda a última anotação. É que só se compreende que, sucessivamente, venham a público estas situações, de que são exemplos os casos de Odemira e das centenas de timorenses que, nos últimos meses, chegaram ao País sem quaisquer condições, exactamente porque é sobre a exploração destes e de todos os trabalhadores que se ergue o edifício desumano do capitalismo que, por estes dias, fala de direitos humanos noutras paragens, para que ninguém repare nos ataques que aqui lhes continua a perpetrar.

E é contra essa exploração que se continua a erguer, todos os dias, a luta de classes.




Mais artigos de: Opinião

Instigadores da guerra

Tal como se verificou em todas as guerras – da Jugoslávia à Síria –, que com êxtase apoiou, o Parlamento Europeu, ou melhor, a maioria dos deputados que integram os seus grupos parlamentares – que têm, no essencial, sustentado o rumo da União Europeia e as suas políticas –, estão de novo na dianteira do suporte à...

Três notas e um míssil

O recente episódio do míssil-russo-que-caiu-na-Polónia-mas-afinal-era-ucraniano, que animou as hostes mediáticas durante uns dias, não deve ser encarado com ligeireza, sendo útil que suscitasse algumas reflexões. Aqui ficam três. 1. Entre os que – dizem-nos – são nossos «amigos» e «aliados», há quem sonhe com a Terceira...

Carro vassoura

No âmbito da discussão e aprovação do OE para 2023, Luis Montenegro, sem nenhuma ideia de fundo verdadeiramente alternativa que pudesse contrapor à proposta do PS, numa tirada de raro rasgo político, lá voltou a cair numa das suas contradições insanáveis, ao tentar apresentar-se como oposição à própria essência da...

Como se brinca em Portugal?

A Escola Superior de Educação de Coimbra, o Instituto de Apoio à Criança e o site Estrelas e Ouriços realizaram, pela segunda vez, um inquérito a pais sobre a forma como as crianças até aos dez anos brincam. O primeiro tinha sido realizado em 2018 e as conclusões do segundo foram apresentadas no dia 24. Apesar dos 1600...