Congresso da CNA debate o futuro da agricultura e o desenvolvimento do País

A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) aprovou no seu 9.º Congresso, que se realizou domingo, em Viseu, uma proclamação com 12 medidas urgentes e estruturais para defender a produção nacional, a agricultura, as florestas e o meio rural.

2022 foi um ano terrível para os agricultores

O Congresso decorreu no Pavilhão Multiusos de Viseu sob o lema «Concretizar o Estatuto, Defender a Agricultura Familiar, Lutar pela soberania alimentar» e contou com a participação de mil agricultoras e agricultores, delegados das filiadas na CNA de todo o País e muitos convidados nacionais e estrangeiros, entre os quais a ministra da Agricultura e da Alimentação. O PCP fez-se representar por João Frazão, da Comissão Política, e Filipe Costa, do Comité Central. O Presidente da República enviou uma mensagem ao Congresso.

Importante momento de demonstração de força, solidariedade e esperança no movimento camponês na construção da soberania alimentar dos povos foi a presença de organizações camponesas europeias filiadas na Coordenadora Europeia Via Campesina, da qual a CNA é membro, que realizou sua Assembleia Geral, entre os dias 4 e 7 de Novembro, em Viseu.

Respostas tardias

Em análise e debate, durante todo o dia, estiveram as consequências da pandemia de COVID-19, as subidas brutais dos custos de produção, a seca, os incêndios, a guerra, a instabilidade dos mercados internacionais, a falta de concretização do Estatuto da Agricultura Familiar, os prejuízos causados por animais selvagens e fenómenos extremos e a aplicação da Política Agrícola Comum (PAC).

«Tudo isto faz de 2022 um ano terrível para os agricultores, principalmente para os pequenos e médios e para a Agricultura Familiar», lamentou Pedro Santos, da Direcção Nacional (DN) da CNA, na abertura dos trabalhos.

Acusou, por isso, o Ministério da Agricultura e o Governo de não darem uma «resposta atempada e cabal» aos problemas e reagirem «sempre tarde e a más horas». «Aos aumentos dos custos dos factores de produção» o executivo PS «foi aplicando paliativos, quando, por pressão dos agricultores, foi obrigado a fazer alguma coisa. Mas ainda não fez o que lhe competia: a regulação dos preços do gasóleo ou o estabelecer de tectos máximos para os preços dos adubos e pesticidas, ou mesmo criar um programa para a disponibilização destes produtos a preços acessíveis», acusou.

Laura Tarrafa, também da DN, reclamou a intervenção do Estado na regulação dos mercados, de forma a «garantir justiça na cadeia de valor». «Portugal aprofunda o défice da balança comercial dos produtos agrícolas e agroalimentares, que em 2021 cresceu para os 3 845,9 milhões de euros, e coloca a alimentação da população nas mãos de terceiros», alertou, ilustrando: «Se um país decidir que não exporta trigo, o mais certo é não comermos pão».

Neste sentido, é «urgente» assumir como desígnio nacional a diminuição dos défices agroalimentares nacionais e não pensar só na exportações. «É urgente priorizar a produção para o mercado interno, por exemplo com a implementação de um programa de compras públicas de produtos locais e da Agricultura Familiar alargado e apoiado, da promoção dos mercados locais e circuitos curtos de comercialização», defendeu a dirigente.

No final, Laura Tarrafa falou da situação do Estatuto da Agricultura Familiar, aprovado na sequência da iniciativa da CNA, mas «boicotado, à partida, pelos que o criaram» – o PS.

 

12 medidas urgentes

Face ao agravamento dos problemas que se vêm debatendo há décadas, no Congresso foi apresentadae aprovada, por unanimidade, uma proclamação com 12 medidas «urgentes e estruturais», que «dependem das opções políticas dos governos».

As reivindicações passam por defender a produção com escoamento a preços justos (1); combater os elevados custos dos factores de produção (2); uma aplicação da PAC mais justa para os pequenos e médios agricultores (3); concretizar plenamente o Estatuto da Agricultura Familiar (4); combater os prejuízos provocados por animais selvagens (5); defender a floresta e os baldios (6); concretizar as eleições na Casa do Douro, devolvendo-a aos viticultores durienses (7); aumentar a produção nacional e diminuir a dependência externa (8); defender o acesso à terra e o rejuvenescimento da agricultura (9); mais e melhores serviços públicos nos territórios rurais (10); valorizar as mulheres agricultoras (11); um só Ministério para a Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural (12).

«Cabe aos agricultores, aos produtores florestais, em particular aos pequenos e médios, aos compartes dos baldios, lutar e reclamar a aplicação urgente destas medidas» e que «sejam implementadas tendo como norte a concretização da Soberania Alimentar em Portugal, a defesa da produção nacional, agrícola e florestal, a defesa dos pequenos e médios agricultores e produtores florestais, a defesa do meio rural», destaca o documento.

 

Outras e melhores políticas agro-rurais

Os trabalhos na parte da tarde arrancaram com duas sessões de debate, sobre «Agricultura Pecuária» e «Floresta e Baldios», onde os agricultores, produtores florestais e compartes falaram dos seus problemas concretos e colocaram questões sobre as quais a CNA constrói o seu caminho de proposta para outras e melhores políticas agro-rurais.

Na Resolução do 9.º Encontro, posteriormente aprovada por unanimidade, refere-se que o subsector da pecuária tem passado por crises gravíssimas, com implicações brutais nas várias produções. «As explorações pecuárias foram das mais afectadas com a situação da seca, obrigando os produtores a recorrer à compra de alimentos concentrados para alimentar os animais. Os aumentos dos custos de produção e a diminuição das produtividades desferiram um rude golpe num subsector já muito fragilizado», acentua o documento.

O seu 4.º ponto é inteiramente dedicado à Floresta, considerado como um sector de enorme importância estratégica para o desenvolvimento do nosso País, na vertente económica, ambiental e social. «Para além de uma avalanche legislativa, pouco ou nada mudou na floresta portuguesa desde o último Congresso», a não ser na estrutura governativa, com a tutela das Florestas a ser retirada do Ministério da Agricultura para estar agregada ao Ministério do Ambiente, considera a Confederação, lamentando o «apoio incondicional às grandes empresas do sector e esmagamento e eliminação dos pequenos proprietários».

Por seu lado, aCNA defende a promoção de práticas mais equilibradas, mais sustentáveis, de produção silvícola e o chamado «uso múltiplo» das florestas com a produção de madeiras, mas também com a recolha organizada ou espontânea de lenhas e cobertos, com outras actividades associadas à Floresta como a pastorícia e a pecuária extensivas, aqui incluindo a apicultura. Confirma, igualmente, as «imensas potencialidades» da propriedade comunitária e dos vastos territórios Baldios, e da sua posse, gestão e fruição pelos Compartes.

Na Resolução são ainda desenvolvidos os pontos «Rendimento, preços e medidas de apoio», «Comércio internacional», «Nova PAC e o Plano Estratégico Nacional», «Ambiente e alterações climáticas», «Inovação, digitalização e transferência de conhecimento», «Valorização da mulher agricultora», «Prejuízos causados por animais selvagens», «Concretização do Estatuto da Agricultura Familiar, «A propriedade e uso da terra dos pequenos e médios proprietários», «Soberania alimentar» e «Alianças da CNA e perspectivas de luta “Sempre com os agricultores!”».

 

Moções e reivindicações

Um conjunto de moções, com diferentes temáticas, foi igualmente aprovado: «Por um rendimento condigno para pequenas e médias explorações agrícolas, pecuárias e florestais»; «Semeamos soberania e solidariedade alimentar: as mulheres agricultoras e rurais têm direito a uma vida digna!»; «O ambiente e a Agricultura Familiar»; «Direitos dos camponeses e soberania alimentar, com o Estatuto da Agricultura Familiar», «Pelo pagamento de indemnizações aos agricultores prejudicados por javalis e outros animais selvagens. Pelo controlo sanitário e da densidade das populações destes animais».

Na moção «Por outra Política Agrícola Comum (PAC) que respeite a soberania alimentar de Portugal e promova o desenvolvimento das Zonas Rurais», refere-se que, terminadas as negociações da nova PAC para o pós 2022 e aprovado que está por Bruxelas o plano estratégico a aplicar em Portugal, o PEPAC, «são muitas e diversas as preocupações dos agricultores familiares quanto ao futuro».

«As regras decididas em Bruxelas com a anuência dos nossos governantes e as opções tomadas pelo Ministério da Agricultura, que serão postas em prática a partir de 2023, não respondem de forma cabal aos problemas da agricultura nacional e não promovem um desenvolvimento equilibrado de todo o território nacional», refere o texto, lembrando que a nova PAC vai continuar a «deixar os agricultores para trás, já que corta nos apoios às explorações com menor dimensão», a «atribuir ajudas sem obrigatoriedade de produzir» e, por outro lado, «concretiza o processo de convergência interna do valor das ajudas, que constitui um verdadeiro bónus às muito grandes explorações».

Impactos negativos

Na vertente ambiental, alerta-se para a «tentativa descarada» de branquear «modelos de produção superintensivos e consumidores de recursos que vão continuar a ter impactos negativos no meio-ambiental». As críticas estendem-se à «complexidade e a burocracia» associada às medidas previstas no PEPAC.

O 9.º Congresso da CNA reclamou, entre outras medidas, que a orientação da PAC e do PEPAC inclua os princípios da soberania alimentar, promovendo o desenvolvimento da Agricultura Familiar; a dinamização dos circuitos curtos de comercialização; a valorização do papel da mulher agricultora e rural com vista à promoção da igualdade e revitalização dos territórios rurais.

 



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