«Quem brinca com o fogo pode-se queimar»

Ângelo Alves

EUA buscam uma linha de confronto directo com a China

Nas relações internacionais raramente há coincidências. É por isso que não deixa de ter um importante e perigoso significado a decisão da Presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, a democrata Nancy Pelosi (a 3.ª mais importante figura de Estado nos EUA), de liderar uma visita do Congresso do EUA a vários países da região indo-pacífico, precisamente na semana em que se assinalam os crimes de Hiroshima e Nagasáqui, perpetrados pelos EUA em 1945.

A visita a Singapura, Malásia, Coreia do Sul e Japão, com as questões da «segurança» incluídas na “bagagem”, já seria só por si clarificadora das intenções dos EUA: Inflamada que está a situação no leste europeu e concretizada a intenção de prolongar a guerra durante meses ou mesmo anos, o tempo é agora o de centrar atenções no principal «adversário estratégico» e na região asiática. O objectivo de conter, confrontar e, se possível, enfraquecer a República Popular da China está a ganhar centralidade. Tal facto não estará desligado do facto de que, do ponto de vista económico e geopolítico, a estratégia no leste europeu visando a Federação Russa não só não está a surtir os efeitos desejados do ponto de vista económico – na Europa, mas também nos EUA onde a economia entrou agora em recessão técnica combinada com alta inflação – como não enfraqueceu as relações da Rússia e da China com outros países e importantes economias.

Nada de novo. Esta visita não é propriamente inesperada, surge na sequência de uma série de outras iniciativas que provam estar em curso a intensificação de uma autêntica guerra comercial, económica e geoestratégica dos EUA contra a China. Guerra que tem tido vários desenvolvimentos, alguns muito recentes, como a aprovação pelo Congresso dos EUA do CHIP’s and Sciente Act, ou outros que há muito estão em desenvolvimento como os projectos do AUKUS (aliança militar que envolve a Austrália, o Reino Unido e os EUA), o QUAD (de igual natureza que envolve os EUA, Índia, Japão e Austrália), ou ainda as sucessivas provocações política e militares envolvendo a Ilha da Formosa (ou Taiwan como é conhecida) e o estreito com o mesmo nome. Nas vésperas da visita de Pelosi os presidentes Biden e Xi Xiping realizaram uma conversa telefónica, a pedido do primeiro. Simultaneamente, e durante vários dias do final de Julho, 26 países, na sua esmagadora maioria membros da NATO, realizavam exercícios militares no Pacífico numa clara linha de militarização e presença militar da NATO na região. Trata-se de provocações de grande monta, num preocupante paralelismo com aquelas que estiveram na origem do conflito no leste europeu.

Entretanto, confirmou-se que, ao contrário do «itinerário» oficialmente anunciado, se concretizou na terça-feira a «visita» de Nancy Pelosi a Taiwan, fazendo esta provocação atingir um nível inédito. Tal decisão é um passo perigosíssimo que confirma que os EUA buscam claramente uma linha de confronto directo, incluindo militar, com a China. É simultaneamente um sinal de que as palavras de Biden no referido telefonema não valem muito. Avisos não faltaram. Xi Xiping deixou bem claro a Biden: «quem brinca com o fogo pode-se queimar». Pelosi cometeu a irresponsabilidade de pôr em causa o princípio básico de «uma só China». As consequências podem ser terríveis, tal como o foram as de Hiroshima e Nagasaki, ditadas pela insana sede de poder do imperialismo.

 



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