Cartilhas

Jorge Cordeiro

Não se tome pelo título a pretensão de trazer à liça aquela cartilha que durante décadas tanta luz fez sobre as letras e a escrita e que propiciou durante gerações o aprender a ler. A imagem aqui só tem razão de importação a propósito da mensagem de Ano Novo do Presidente da República que no seu apelo a «um virar de página» suscitou uma miríade de interpretações e uma não menor quantidade de esforçados exercícios de colagem à citada expressão. Aberto o livro, virada à página, aí andam, entre a azáfama e alguma algazarra, os que regateando a titularidade da obra se apressam a antecipar o que na página seguinte querem ver lido. Uns vendo na contra-página uma premonitória visão de ciclo político, outros de almejada previsão de poder absoluto, iludindo uns e outros que neste folhear da obra que Marcelo evocou, cada um conhece e partilha o essencial que nele se percorre.

Ainda que correndo o risco de aviltar o que quer a obra, quer o autor desejem aqui se deixa o inevitável reparo quanto ao andamento da ambicionada narrativa. Se este «virar de página» tem por objectivo responder ao que o Presidente deixou no ar quanto «ao que podemos e dever fazer em 2022» para «garantir previsibilidade para as pessoas e os seus projectos de vida» aqui se deixa uma simples sugestão: mais que um virar de página desse livro que o atrai, mudemos de obra e autor. Fixemo-nos pois nessa obra exigente mas inadiável, de abrir caminho a um virar de política que garanta a partir dos salários e das reformas, do acesso à saúde e à educação salvando o SNS e defendendo a Escola Pública, da estabilidade no emprego e na habitação, da efectivação dos direitos dos trabalhadores ou dos direitos dos pais e das crianças, esse realizar de um futuro melhor. Talvez uma revisitação ao que a Constituição consagra em matéria de direitos, fazendo-a cumprir, seja literatura mais recomendável do que aquela que foi invocada.




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