Unidade, firmeza e solidariedade marcaram greve na Amarsul
«Se não continuarmos, vão fazer connosco o que quiserem a partir daqui», observou uma trabalhadora no Ecoparque do Seixal, assegurando nova resposta à administração se esta continuar intransigente.
A acção policial deu cobertura a uma ilegalidade patronal
O lixo acumulado nas ruas dos nove concelhos da Península de Setúbal foi mostrado como resultado da grande adesão dos trabalhadores da Amarsul à greve realizada entre 29 de Novembro e 3 de Dezembro. Mas quem reteve a informação de que os trabalhadores, organizados no STAL e no SITE Sul, aguardam há mais de um ano pela resposta da administração ao caderno reivindicativo?
À reportagem do Avante!que, no dia 2, esteve nos ecoparques do Seixal e de Palmela, este «detalhe» foi diversas vezes recordado por delegados sindicais e membros da Comissão Intersindical da Amarsul.
Ana Lúcia, Carlos Almeida, José Lourenço e Rui Soares estavam nos piquetes de greve e, nas suas declarações, a principal atenção, naturalmente, foi para a intervenção policial, desencadeada na véspera. Mas relataram também como foi recebida com acrescida indignação a marcação de uma reunião da administração com representantes sindicais, no dia 30. «Afinal, não queriam negociar, não tinham nenhuma proposta, só quiseram falar dos serviços mínimos», como se não estivessem a ser respeitados.
O tribunal arbitral do Conselho Económico e Social tinha já esclarecido que as pretensões da administração não se justificavam e que, entre as funções incluídas nos serviços mínimos, não constava um operador de controlo e pesagem nos ecoparques de Palmela e do Seixal. E fora a administração a admitir que, sem este trabalho, as viaturas da recolha não poderiam sequer entrar nas instalações.
Continuaram sem resposta as reivindicações, nomeadamente: aumento dos salários e dos subsídios de refeição e de transporte; redução do horário de trabalho; fim da precariedade e passagem a efectivos dos trabalhadores com vínculo temporário; respeito pela contratação colectiva; reversão dos cortes no subsídio de turno; criação de subsídios de insalubridade, penosidade e risco e de risco rodoviário.
Os contratos através de empresas de trabalho temporário (Autovision e Kelly) abrangem uma centena de trabalhadores, a desempenhar funções permanentes, que se deveriam somar aos efectivos da Amarsul (312, segundo o Relatório e Contas de 2020). Os «temporários» também fizeram greve, e foram também alvo de pressões, quer das hierarquias, no local de trabalho, quer com telefonemas e mensagens.
O descontentamento com a recusa de valorizar os trabalhadores, deixando sem solução os problemas apontados, foi-nos referido como principal factor da unidade e da firmeza dos trabalhadores nesta luta, decidida num plenário geral, a 9 de Novembro.
Por outro lado, o recurso à força policial foi visto, afinal, como «uma demonstração de fraqueza da administração».
Para hoje, no ecoparque de Palmela, foi convocado novo plenário geral, a fim de analisar a posição patronal e tomar decisões sobre próximos passos na luta dos trabalhadores.
Motoristas municipais solidários
A forte adesão que a luta teve, desde o início, inviabilizou a deposição de resíduos. Os piquetes de greve conversavam com os motoristas que, mesmo assim, eram dirigidos para os ecoparques, e eles voltavam para trás. «Sentiram que isto também é uma luta deles, todos queremos melhores condições», comentou José Lourenço, assinalando que «nós nunca impedimos a entrada» de camiões.
No dia 30, terça-feira, uma força da GNR e «responsáveis de câmaras municipais, como Barreiro, Montijo e Alcochete», obrigaram os motoristas a entrarem com os carros no ecoparque de Palmela. Para as descargas serem feitas em segurança, respeitando os serviços mínimos, acabou por ficar acordado com o piquete de greve que passaria a entrar apenas um camião de cada vez.
No ecoparque do Seixal, os motoristas da Câmara Municipal de Almada «foram pressionados por uma engenheira, que veio cá» no dia 1, para fazerem as descargas. Houve resposta do piquete de greve e os motoristas continuaram a decidir que «não temos condições» para descarregar.
Foram-nos relatados outros episódios, vistos como tentativas de provocar confrontos com os trabalhadores do piquete, para justificar uma carga policial.
Ao final dessa tarde, com pressões das hierarquias e escolta da PSP, que apartou o piquete, os motoristas foram obrigados a entrar com os camiões no ecoparque. «A polícia veio impedir o piquete de falar com os trabalhadores que vêm descarregar o lixo, mas esse é um direito legal dos piquetes de greve», salientou o coordenador da União dos Sindicatos de Lisboa, Luís Leitão.
«Os motoristas faziam-nos sinais de “desculpem”, percebeu-se que foram forçados, não queriam furar a nossa greve», relatou uma trabalhadora, que nos alertou para o problema das tendinites, doença profissional de que já sofre e que, garantiu, afecta mais pessoas na triagem.
Mesmo com a polícia nas instalações do Seixal, os piquetes permaneceram, com os trabalhadores em greve a revezarem-se, «cumprimos o horário aqui». Assim foi até ao último minuto da luta, que terminou às 24 horas de dia 3.
Foi também junto dos piquetes que tiveram lugar expressões de solidariedade, fosse de delegações sindicais e da Secretária-geral da CGTP-IN, Isabel Camarinha (na noite de dia 1), fosse de deputados e dirigentes do PCP, que informaram sobre as perguntas colocadas na Assembleia da República e sobre notas emitidas pela Direcção da Organização Regional de Setúbal do Partido. Na tarde de dia 2, no ecoparque de Palmela, estiveram Armindo Miranda, da Comissão Política do Comité Central, e Carlos Fernandes e Eduardo Vieira, membros do CC. «Não é novidade esta presença, é este o vosso Partido, mesmo que alguns ainda o não tenham descoberto», disse o responsável da DORS, numa breve saudação.