A refinaria de Matosinhos e a soberania energética
No âmbito da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia, os ministros portugueses têm apresentado junto das diferentes comissões parlamentares do Parlamento Europeu as principais prioridades para este semestre. Na semana passada, o Ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes (JMF), foi à Comissão da Indústria, da Investigação e da Energia (ITRE) e tivemos a oportunidade de o questionar, no contexto da chamada «transição energética», sobre o encerramento da refinaria de Matosinhos. Concretamente, perguntámos se os fundos europeus alocados a esta matéria seriam gastos apenas no encerramento de unidades produtivas funcionais e eficientes ou se sobrariam verbas para fazer investimentos que contribuam, de facto, para uma maior soberania energética no quadro de uma transição para modelos mais sustentáveis. Ora, JMF respondeu, do alto da sua sabedoria e de conhecimento do país, dizendo que não compreendia sequer a questão da soberania energética já que Portugal não é um país produtor de petróleo. Não tendo sido regimentalmente possível esclarecer JMF, naquele momento, fazemo-lo agora:
1. Primeiramente, não são só os países produtores de petróleo que têm soberania energética. Se dependemos de combustíveis fósseis (e, até ver, isto continua a ser a realidade do País), a existência de uma refinaria que serve as nossas necessidades torna-nos menos dependentes de quem, no estrangeiro, o possa fazer por nós; consequentemente, ser mais independente significa ter mais soberania.
2. Se se quer assumir que o encerramento se deve a uma transição para modelos mais sustentáveis, então talvez estejamos a pôr o carro à frente dos bois: num contexto ainda de dependência de combustíveis fósseis, deixar de refinar em Portugal implica passar a importar combustíveis já refinados. Ou seja, alguém continuará a poluir por nós com o agravamento da necessidade do transporte dos refinados. Nem o ambiente agradece!
3. Outro facto que JMF parece desconhecer é que a refinaria de Matosinhos alimenta outras indústrias de base nacional, nomeadamente no norte do país, e que podem correr o risco de desaparecer, como sejam os benzenos, as parafinas, o xileno e o tolueno de alguns medicamentos, ou os asfaltos e betumes, ou os solventes usados nos óleos alimentares e nas tintas, mas também as ceras minerais usadas em colas e velas. Com uma cajadada disfarçada de ambiental, encerra-se a refinaria e destrói-se uma parte da indústria portuguesa. Abençoados fundos: as multinacionais exportadoras agradecem!
4. Por fim, lamentamos que, entre as prioridades apresentadas, não conste a reversão do sector energético para a esfera pública, reorientado para a satisfação das necessidades do País, e não subjugado aos interesses do grande capital nacional ou estrangeiro. Só com o controlo público deste sector é que a questão da soberania energética assume centralidade. É o que permitiria o aproveitamento adequado das energias renováveis e o investimento em tecnologias mais limpas para a modernização dessas indústrias, articulando os valores ambientais com a defesa dos interesses nacionais. E aí os portugueses agradeceriam!