A denúncia

Margarida Botelho

A Rádio Renascença, preocupada com uma suposta falta de transparência na informação sobre os casos de COVID nas escolas portuguesas, criou um e-mail para onde qualquer pessoa pode denunciar um suposto caso em qualquer escola. A Renascença assegura que confirma as denúncias antes de as colocar no mapa que disponibiliza no seu site.

Não se questiona, até prova em contrário, o profissionalismo dos jornalistas destacados para tal tarefa. Mas questiona-se – e muito! – os objetivos desta decisão da Renascença. Supostamente, o que a RR quer é «transparência», mas o resultado é o oposto: medo, desconfiança, insegurança. De uma penada, a Rádio Renascença quer pôr em causa a credibilidade do Serviço Nacional de Saúde e da escola pública, as entidades que têm de intervir caso se confirme alguma infecção entre a comunidade educativa.

Qual é a relevância da informação que a Renascença se propõe sistematizar com base em denúncias que até podem ser anónimas? Quais são as consequências de determinada comunidade ficar em estado de alerta com supostos casos de infecção na sua escola, procurando infectados, casos zero, supostas violações ao confinamento, etc? Quem se responsabiliza pelo estigma criado em torno de crianças e das suas famílias? Ou por casos de alarme social, que levem por exemplo a afastar crianças da frequência da escola, quando as autoridades de saúde não o recomendam?

A tentação de identificar publicamente infectados não é nova. Todos se lembrarão de certos autarcas que há meses pediam às autoridades de saúde listas de doentes para os «controlar». Este mapa da Rádio Renascença não anda longe disso. Tudo o que promova o alarme, o diz que disse, a estigmatização de doentes, não combate o coronavírus: agrava o problema de saúde pública que atravessamos e deve por isso ser combatido.




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