Gigantes nos lucros e indignas nos salários
NEGOCIAÇÃO A EDP, a Brisa e a ANA mantêm as suas propostas salariais em «míseros zero vírgula qualquer coisa por cento», suscitando indignação nos trabalhadores, que lhes geram os lucros de milhões.
As propostas patronais estão em «zero vírgula qualquer coisa»
Os resultados anuais da Brisa, anunciados no dia 17, e da EDP, no dia 20, mereceram forte reacção dos sindicatos, face à posição das administrações destas empresas nas negociações da actualização salarial para o corrente ano.
Accionistas
acima dos lucros
Pelo segundo ano consecutivo, a EDP vai pagar em dividendos muito mais do que os lucros que alcançou, o que levou a Fiequimetal/CGTP-IN a interrogar «por que razão se mantém a distribuição de lucros a um nível fora do razoável, mas não se discute um aumento digno de salário para os trabalhadores».
Numa nota publicada dia 22, tal com num comunicado aos trabalhadores, a federação assinalou que a EDP obteve em 2019 «um lucro muito considerável, de 512 milhões de euros, e vai pagar 695 milhões em dividendos».
No entanto, «aos trabalhadores – verdadeiros criadores desses milhões e que investem na empresa, todos os dias, a sua vida – foi apresentada uma proposta de actualização salarial de 0,3 ou 0,5 por cento, ou seja, valores entre 5 e 15 euros», que são «manifestamente insuficientes e indignos, vindos de uma administração que se diz de excelência e de uma empresa que se gaba de ser sustentável e familiarmente responsável».
A Fiequimetal e os seus sindicatos na EDP (SIESI, SITE CSRA, SITE Norte e SITE Centro-Norte) deixam um aviso: «Não será com valores irrisórios, como os que tem apresentado, que a administração pode esperar que as negociações terminem rapidamente».
Não podem
ignorar
Na sexta reunião de negociação com a Fepces/CGTP-IN, os representantes das empresas do Grupo Brisa persistiram «no argumento único da taxa de inflação prevista pelo Banco de Portugal para 2020, para justificarem as propostas “mal amanhadas” que apresentam», protestou o Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços (CESP), num comunicado que divulgou na semana passada, apelando à mobilização para «dar a resposta adequada».
O critério da inflação prevista serve para justificar a proposta patronal, para actualização dos salários em 0,6 por cento.
Mas o CESP lembra outros números, que não podem ser ignorados, nos resultados anuais da Brisa Concessão Rodoviária, principal unidade do grupo: os ganhos de produtividade, o aumento do tráfego e da receita (acima de seis por cento) e o crescimento do lucro líquido em 22,6 por cento, para 204,5 milhões de euros.
Com estes resultados, o sindicato considera que «fica claro o irrealismo das propostas» patronais. As própria empresas afirmam que, em 2019, «o acréscimo de 1,8 por cento na tabela salarial originou encargos adicionais de três por cento nos custos com pessoal», mas o sindicato vê agora confirmado que «não foram estes encargos adicionais que impossibilitaram os lucros fabulosos».
Falta
de respeito
A ANA Aeroportos demonstra «uma inqualificável falta de respeito» para com os seus trabalhadores, ao insistir em «apresentar uns míseros zero vírgula qualquer coisa por cento» nas negociações salariais, afirma-se num comunicado conjunto que os sindicatos Sitava (da Fectrans/CGTP-IN), Sindav e Sintac emitiram no dia 20.
O valor terá sido de 0,7 por cento, segundo um dirigente do Sitava, citado nessa tarde no Dinheiro Vivo.
A empresa gestora dos aeroportos, privatizada em 2012 a favor da multinacional Vinci e que é hoje a sua principal subsidiária, «tem um dos melhores e mais rentáveis negócios do nosso País», assinala-se no comunicado conjunto.
Não são ainda conhecidas as contas de 2019, pelo que a afirmação funda-se noutros números, realçando os sindicatos que preferiam analisar os resultados operacionais, relativamente aos quais «parece existir um manto de penumbra, um tabu».
Recorde-se que a ANA, numa concessão por 50 anos, rendeu ao Estado 3080 euros, mas nos primeiros cinco anos (de 2013 a 2017) permitiu à Vinci arrecadar 587 milhões, ou seja, quase 20 por cento do que pagou para explorar os aeroportos até 2062.
Em 2017 e 2018, os dois últimos anos com resultados divulgados, os lucros subiram de 247 para 282 milhões de euros.
Os sindicatos consideram que a posição patronal, «além de extremamente injusta, configura em si própria um verdadeiro atentado à dignidade dos trabalhadores», que são «os principais obreiros» dos resultados da empresa.