Atracção fatal
Cavaco Silva, confrontado com a notícia de que a sua campanha para as presidenciais de 2011 terá sido financiada em mais de um quarto de milhão de euros por um «saco azul» do antigo Banco Espírito Santo (BES), fez duas afirmações curiosas, a saber: «Nunca acompanhei os financiamentos das campanhas em que participei» e «Nunca tive nenhuma amizade com Ricardo Salgado».
Considerando que ninguém imputou a Cavaco qualquer responsabilidade no alegado esquema utilizado por dez altos responsáveis do BES para disfarçar de donativos individuais o que afinal era um financiamento empresarial, proibido por lei, parece no mínimo estranho que o ex-presidente, ao invés de estar preocupado com o apuramento dos factos, como seria expectável, esteja mais preocupado em fazer crer que é totalmente alheio aos apoios que lhe foram concedidos.
Ou seja, para Cavaco o que parece ser relevante não é a eventual ilegalidade cometida pelas dez personalidades, mas o facto de ser agora do domínio público que os senhores Ricardo Salgado, José Manuel Espírito Santos Silva, Rui Silveira, Joaquim Goes, António Souto, Amílcar Morais Pires, Pedro Fernandes Homem, Manuel Fernando Espírito Santo Silva, António Ricciardi e Mário Mosqueira do Amaral (falecido em 2014), passaram cheques de 25 mil euros cada um, mais coisa menos coisa, para favorecer a sua recandidatura a Belém. É que, como Cavaco sabe e ninguém ignora, «não há almoços grátis».
Ou seja, o que esta história revela, mais do que o lodaçal em que o clã BES se movia, é que mesmo sem ter «amizade com Ricardo Salgado» e mesmo tendo «uma forte aversão a pedir dinheiro para campanhas eleitorais», o capital nunca faltou a Cavaco, e não certamente por acaso.