Recuperar o controlo público dos CTT

João Oliveira (Membro da Comissão Política)

A pri­va­ti­zação dos CTT e a con­cessão do ser­viço pú­blico postal aos grupos eco­nó­micos que to­maram conta da em­presa são exem­plos fla­grantes e dra­má­ticos do re­tro­cesso que as op­ções da po­lí­tica de di­reita im­põem ao País e das cum­pli­ci­dades po­lí­ticas entre PS, PSD e CDS que sus­tentam tais op­ções.

PSD/​CDS en­tre­garam os CTT aos pri­vados e o PS re­cusa-se a re­verter essa de­cisão

Pela pri­meira vez em 500 anos o Es­tado não tem na sua mão a em­presa res­pon­sável pela ga­rantia do ser­viço pú­blico postal, porque o go­verno PSD/​CDS en­tregou os CTT a um con­sórcio de grupos eco­nó­micos, pondo fim a um pro­cesso de­li­be­ra­da­mente pre­pa­rado du­rante mais de duas dé­cadas, e o Go­verno PS se tem re­cu­sado a re­verter essa de­cisão.

Com o passar do tempo, a de­gra­dação do ser­viço postal e a de­pre­dação da em­presa pelos grupos eco­nó­micos que se tor­naram seus ac­ci­o­nistas tem-se tor­nado evi­dente e re­vela com cris­ta­lina trans­pa­rência a sua es­tra­tégia: des­man­telar pro­gres­si­va­mente os re­cursos da em­presa afectos à pres­tação do ser­viço postal onde ele é menos ren­tável, con­cen­trar re­cursos nos sec­tores e ope­ra­ções mais lu­cra­tivos da em­presa – in­cluindo o «Banco Postal» –, as­se­gurar o má­ximo lucro ime­diato, mesmo que isso im­plique a venda de pa­tri­mónio ao des­ba­rato e o pre­juízo das po­pu­la­ções.

A re­a­li­dade aí está a con­firmá-lo com o aban­dono pelos CTT de cada vez mais par­celas do ter­ri­tório na­ci­onal, quer com o en­cer­ra­mento de de­zenas de es­ta­ções de cor­reios, quer com a dis­tri­buição postal cada vez mais ir­re­gular e em muitos casos en­tregue a pri­vados, quer com a en­trega do ser­viço a co­mer­ci­antes ou a juntas de fre­guesia; com o de­sa­pa­re­ci­mento de cen­tros de dis­tri­buição postal e a sua cen­tra­li­zação; com a re­dução drás­tica do nú­mero de car­teiros, a ca­rência de tra­ba­lha­dores na es­tru­tura e a so­bre­carga in­su­por­tável dos que restam, com o re­curso sis­te­má­tico a «giros em dobra».

En­quanto as po­pu­la­ções são con­fron­tadas com a si­tu­ação in­sus­ten­tável do ser­viço postal, as cons­tantes fa­lhas na dis­tri­buição, o atraso sis­te­má­tico do cor­reio, a len­tidão e falta de pes­soal no aten­di­mento, as me­didas to­madas pela ad­mi­nis­tração dos CTT pre­o­cupam-se em ga­rantir a dis­tri­buição de cho­rudos di­vi­dendos aos seus ac­ci­o­nistas.

Op­ções a serem ven­cidas pela luta

Se não forem en­tre­tanto to­madas me­didas de re­cu­pe­ração do con­trolo pú­blico dos CTT e do ser­viço pú­blico postal, o País ar­risca-se a chegar a 2020 – ano em que ter­mina o con­trato de con­cessão do ser­viço pú­blico postal à em­presa CTT – numa si­tu­ação em que a em­presa foi des­man­te­lada e o Es­tado não tem qual­quer pos­si­bi­li­dade de as­se­gurar a pres­tação do ser­viço pú­blico, fi­cando com­ple­ta­mente nas mãos das em­presas pri­vadas que po­derão exigir o pa­ga­mento e as con­di­ções con­tra­tuais que bem en­ten­derem para o fazer.

É ur­gente que o Es­tado re­cu­pere o con­trolo pú­blico dos CTT, re­to­mando a gestão da em­presa e re­cu­pe­rando as con­di­ções para prestar o ser­viço pú­blico postal que o País, as po­pu­la­ções e os seus tra­ba­lha­dores exigem. Esse é o ele­mento de­ci­sivo em torno do qual a luta dos tra­ba­lha­dores dos CTT e das po­pu­la­ções tem de con­vergir.

E se o Go­verno PS re­cusa romper com as op­ções da po­lí­tica de di­reita, con­si­de­rando que os in­te­resses dos grupos eco­nó­micos que to­maram conta dos CTT são in­to­cá­veis, ven­dendo a ilusão de que é pos­sível con­vencê-los a co­locar o País e as po­pu­la­ções em pri­meiro lugar, aban­do­nando a sua es­tra­tégia e os seus ob­jec­tivos de lucro má­ximo, então também essa opção do Go­verno PS tem de ser ven­cida pela luta.



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