Urgente travar na Pietec o despedimento colectivo
RESISTÊNCIA Os trabalhadores da corticeira Pietec demonstram que o despedimento é ilegal, exigem intervenção do Governo e do PR e desmascaram o real objectivo da laboração contínua.
A laboração contínua é manobra para pagar menos
No sábado, dia 8, começaram a sentir-se os efeitos do despedimento colectivo de 41 trabalhadores da empresa de Santa Maria da Feira, parte do Grupo Piedade, adquirido em 2015 pela multinacional francesa Oeneo (segundo maior produtor mundial de rolhas de cortiça, a seguir ao Grupo Amorim).
Para ontem, dia 12, ao final da tarde, junto à sede da associação patronal APCOR, em Santa Maria de Lamas, o Sindicato dos Operários Corticeiros do Norte convocou uma «concentração solidária», onde também iria estar em foco o caso da Corticeira Couto.
Dirigentes do sindicato da Feviccom/CGTP-IN e vários trabalhadores da Pietec deslocaram-se no dia 4, terça-feira, a Lisboa, para entregarem um conjunto de documentos no Ministério do Trabalho, organizando um protesto público na Praça de Londres.
A viagem resultou ainda num encontro informal com o Presidente da República, na zona de Belém, à hora do almoço. Horas mais tarde, o sindicato e a federação colocaram por escrito o pedido de intervenção e empenho do PR para travar o despedimento.
Exploração premiada
O sindicato colocou a origem do problema no momento da mudança de dono da Pietec. Num plenário, no final de Abril deste ano, foram denunciados os abusos de vínculos laborais precários e a prática de condições de trabalho, incluindo salários, piores do que o que é comum noutras empresas do sector.
Na fábrica de rolhas, os novos patrões tentaram impor um regime de laboração contínua, que não está previsto no contrato colectivo de trabalho nem nos contratos individuais. A medida não foi aceite pelos trabalhadores, quer no parecer da comissão sindical, quer em abaixo-assinado.
Apesar da falsidade dos argumentos patronais e das ilegalidades denunciadas à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), os ministérios do Trabalho e da Economia autorizaram a laboração contínua e atribuíram mesmo à empresa a classificação de «projecto de interesse nacional». Agora, o sindicato afirma que os horários comunicados aos trabalhadores são totalmente diferentes dos que estiveram na base da autorização oficial.
O despedimento colectivo, desencadeado formalmente no início de Setembro, culminou as pressões para romper a resistência dos trabalhadores, embora a administração justificasse a medida com o fim da produção de rolhas em macrogranulado.
Desde então, ocorreram várias greves e concentrações e durante alguns dias foi mantida uma vigília junto aos portões da fábrica. Nas reuniões com a administração, esta chegou a admitir que poderia recuar no despedimento, caso houvesse uma aceitação expressa da laboração contínua. Apenas três trabalhadores cederam.
Com o regime de laboração de 24 horas, todos os dias, a empresa deixa de pagar trabalho extraordinário aos fins-de-semana, à custa da saúde e da desorganização da vida dos trabalhadores, como destacou o Secretário-geral da CGTP-IN, que esteve no protesto de dia 4. Arménio Carlos, citado pela agência Lusa, assinalou que «continuamos a ter uma legislação que, com a cobertura do Governo, está a facilitar comportamentos desta natureza», de empresas que não querem pagar a compensação adequada pelo trabalho em dias de descanso semanal.
Intervir na Couto Cortiças
A degradação da saúde da trabalhadora que a empresa Fernando Couto Cortiças insiste em despedir foi salientada no dia 5, na comissão de Trabalho da Assembleia da República, por dirigentes sindicais (do SOCN, da Feviccom e da União dos Sindicatos de Aveiro) e por Rita Rato, deputada do PCP, como motivo para acção urgente.
Numa audição realizada por iniciativa do Partido, tomada a 24 de Setembro e que inclui também ouvir a inspectora-geral da ACT e o ministro do Trabalho, a deputada reafirmou que o PCP, na acção institucional, vai continuar a denunciar a situação e a exigir que a lei se cumpra, e fora da AR, vai manter a acção de solidariedade com a trabalhadora.
Fátima Messias, da Comissão Executiva da CGTP-IN e coordenadora da federação sindical do sector, sublinhou que «os mecanismos habituais já não chegam para esta situação excepcional» e alertou que «a empresa vai tentar que o tempo acabe por esmagar esta coragem» que a trabalhadora tem demonstrado.
Cristina Tavares contestou o despedimento por extinção de posto de trabalho, em 2016, e o Tribunal da Relação do Porto confirmou a sua razão, em Maio, obrigando a empresa a reintegrá-la. Em Setembro, o sindicato e a trabalhadora trouxeram a público a denúncia de graves práticas de assédio moral e discriminação, por parte da empresa. Seguiram-se iniciativas de solidariedade para com a trabalhadora e contactos institucionais.
A 26 de Novembro, o sindicato revelou que, na sequência da primeira das visitas da ACT, a empresa fora autuada em 31 mil euros. No dia 28, a administração comunicou à trabalhadora que estava suspensa, para processo disciplinar com vista a despedimento com justa causa.
Este caso deveria merecer a condenação da APCOR, porque mancha todo o sector, criticou Rita Rato na audição.
Precisamente frente à sede da associação patronal, este caso – único pela violência patronal e pela coragem da operária na defesa do posto de trabalho – iria voltar a estar em destaque na «concentração solidária» de ontem.