Terrorismo económico

Luís Carapinha

Entraram em vigor as «mais duras san­ções» dos EUA contra o Irão, alar­gando as me­didas dis­cri­mi­na­tó­rias an­te­ri­ores ao acordo in­ter­na­ci­onal sobre o pro­grama nu­clear ira­niano de 2015, se­lado pela re­so­lução 2231 do CS da ONU. Acordo de que os EUA se re­ti­raram em Maio de forma uni­la­teral, sob o falso pre­texto de in­cum­pri­mento do Irão, con­fir­mando o his­to­rial do im­pe­ri­a­lismo norte-ame­ri­cano em não honrar a pa­lavra e que­brar com­pro­missos. A nova ronda san­ci­o­na­tória visa es­sen­ci­al­mente as ex­por­ta­ções de crude e o sector fi­nan­ceiro. Washington pre­tende re­duzir a zero a venda de pe­tróleo ira­niano e as­fi­xiar a eco­nomia de Te­erão. Com­porta também a sua afron­tosa apli­cação ex­tra­ter­ri­to­rial com a ameaça de pu­nição de qual­quer em­presa ou país que trans­grida as exi­gên­cias dos EUA, hi­po­cri­ta­mente ama­ciada com a sus­pensão tem­po­rária da «proi­bição» de compra de pe­tróleo ira­niano em re­lação a oito países, in­cluindo a China (e Taiwan...), Índia, Japão e Tur­quia, mas não os grandes da UE. O rol de san­ções não es­gota o pa­cote de «má­xima pressão» sobre o Irão que con­templa ou­tras me­didas sub­ver­sivas e de apoio à se­dição in­terna. Ou seja, a ex­plo­ração do ter­ro­rismo eco­nó­mico como parte do ar­senal de ter­ro­rismo de Es­tado.

A ava­lanche de vi­o­la­ções do di­reito in­ter­na­ci­onal e o es­pe­zi­nha­mento dos prin­cí­pios da Carta das Na­ções Unidas mostra que a Casa Branca não se detém nos meios para forçar o ob­jec­tivo de uma mu­dança de «re­gime» e a ins­tau­ração de um poder vas­salo no Irão ou, mesmo, a pro­moção da sua di­visão ter­ri­to­rial. É a mesma agenda te­ne­brosa que levou à in­vasão do Iraque, ao caos na Líbia e à guerra ter­ro­rista que ainda pros­segue na Síria, apesar de ser claro que os ob­jec­tivos da ope­ração do im­pe­ri­a­lismo neste país não vin­garam (não sem também o con­tri­buto do Irão). Que mantém a ocu­pação da Pa­les­tina pelo poder si­o­nista e abriu a frente de guerra no Iémen, no meio de in­crí­veis atro­ci­dades e uma si­tu­ação hu­ma­ni­tária ca­la­mi­tosa. Está em jogo o fa­mi­ge­rado plano do Grande Médio Ori­ente, es­co­rado no tri­ân­gulo EUA-Is­rael-Arábia Sau­dita e a ba­talha pelo con­trolo dos re­cursos e ge­o­po­lí­tica da com­plexa re­gião. Convém, em par­ti­cular, não es­quecer o golpe da CIA que depôs em 1953 o pri­meiro-mi­nistro Mos­sa­degh para re­verter a na­ci­o­na­li­zação do pe­tróleo ira­niano, re­con­du­zindo a dé­cadas de poder di­ta­to­rial do Xá no Irão. O que está hoje em causa não é o ca­rácter do re­gime ira­niano, mas o prin­cípio da so­be­rania dos povos e de normas bá­sicas do di­reito in­ter­na­ci­onal.

O Irão pro­mete re­sistir. Por ra­zões di­versas, Rússia, China e UE coin­cidem na re­jeição das san­ções e mantêm o apoio ao acordo nu­clear. Trump e a ac­tual Ad­mi­nis­tração pa­recem apos­tados em afrontar tudo e todos em prol da su­pre­macia e ex­cep­ci­o­na­li­dade norte-ame­ri­canas. É um jogo muito pe­ri­goso para o mundo. Ao con­trário do que su­gere a per­for­mance con­jun­tural, sob efeito de do­ping, da eco­nomia dos Es­tados Unidos, a ofen­siva de­sen­freada de Washington é um sinal de fra­queza. A es­piral ar­ma­men­tista, a de­riva re­ac­ci­o­nária e o re­curso a me­didas ex­tremas e de ex­cepção são parte da res­posta en­saiada à nova fase da crise es­tru­tural do ca­pi­ta­lismo, após a grande re­cessão de 2007/​8, e à tra­jec­tória de de­clínio re­la­tivo. Em que a dí­vida pú­blica dos EUA de mais de 20 bi­liões de dó­lares, au­men­tando em média cerca de 100 mil mi­lhões de dó­lares a cada mês, é uma au­tên­tica bomba ao re­tar­dador.




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