A força das palavras
No fim-de-semana duas figuras que se situam à direita na zona do PS (o que não é dizer pouco) opinaram sobre temas aparentemente diferentes mas que bem vistas as coisas têm bastante em comum. Sérgio Sousa Pinto (Expresso, 5.5.18) escreve que «as palavras não importam»; António Barreto (DN, 6.5.18) sobre «a corrupção e as suas variedades».
SSP verbera um jornalista que tratou o Forte de Peniche de «Auschwitz portuguesa». Não se trata, efectivamente, da mesma coisa, como seria o caso se o assunto fosse o Tarrafal, ou S. Nicolau, ou outros campos de concentração do fascismo português. Mas para SSP o problema desse equívoco jornalístico reside essencialmente nas palavras que, na sua opinião «hoje não importam». E o inevitável exemplo que junta era de prever: as palavras «esquerda» e «direita», que acha «instrumentalizadas sem decoro».
Diz Barreto (e aplica-se a ele próprio): «um dos problemas da corrupção é o de que os seus responsáveis nunca acham que são corruptos». Embora mencione a «corrupção política», o que sobretudo faz é abordar as formas de favorecimento que «nas palavras de hoje» são o sentido corrente da palavra e que a empobrecem. No Portugal contra-revolucionário tão corrupto é o indivíduo que trafica influências e recebe dinheiro como o político que leva a cabo o mafioso processo das privatizações ou a destruição da Reforma Agrária. O combate a travar, nesses termos, não se confina a processos judiciais que apanham alguns indivíduos «com mais azar», ou à invocação da «ética». Implica a luta contra um sistema e uma sociedade que têm a corrupção no seu próprio cerne. Por muito que custe a SSP, não há equívoco na força da palavra esquerda. Que não se fica pela «ética» e que tem, na sua razão mais funda, a luta por uma sociedade que arrume com a apodrecida sociedade capitalista.