Dignificar a contratação colectiva e pôr cobro à desregulação dos horários que prejudica a vida dos trabalhadores
DIREITOS PS, PSD e CDS inviabilizaram quatro diplomas do PCP para revogar normas gravosas da legislação laboral. A batalha por esse objectivo, porém, não vai parar.
Porque é que não se defende aqui os direitos dos trabalhadores?
LUSA
A continuidade dessa luta dos trabalhadores pela defesa dos seus direitos é a grande certeza que fica deste agendamento potestativo do PCP em que estiveram em discussão iniciativas suas em defesa de direitos inscritos na contratação colectiva e do próprio direito da contratação colectiva.
Os projectos de lei acabaram chumbados pelos votos contra daqueles três partidos em dois deles ou pela conjugação do voto contra de PSD e CDS com a abstenção do PS nos dois textos restantes (regime de adaptabilidade e banco de horas da lei geral do trabalho em funções públicas e do código do trabalho). Todas as outras bancadas votaram a favor excepto o PAN, que se absteve num dos diplomas.
«Tal como [os trabalhadores] conseguem nas empresas e sectores defender, repor e conquistar direitos, vão acabar por conseguir revogar as normas gravosas da legislação laboral», foram as palavras finais da intervenção com que o deputado e membro dos organismos executivos Francisco Lopes abriu o debate, numa afirmação de confiança nos trabalhadores, que, frisou, «têm sempre nas suas mãos a defesa e progresso dos seus direitos».
Foi de direitos, pois, que se ocupou este debate no dia 14, centrado em propostas concretas do PCP dirigidas para acabar com a caducidade dos contratos colectivos e repor o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, bem como para revogar mecanismos do Código do Trabalho e da lei do trabalho em funções públicas (adaptabilidades, bancos de horas grupais ou individuais) que levaram à desregulação dos horários de trabalho.
«Normas gravosas introduzidas pelo governo PSD/CDS em 2003, pioradas pelo Governo PS de maioria absoluta em 2009, agravadas pelo governo PSD/CDS em 2012 e mantidas até agora pelo actual Governo minoritário do PS com o apoio do PSD e do CDS», lembrou ainda Francisco Lopes, que qualificou de «inaceitável» quer a introdução da norma da caducidade das convenções colectivas quer a desregulação dos horários de trabalho.
A primeira, pela permissão de condições laborais piores do que as previstas na lei, pondo em causa o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador. A segunda, porque a desregulação dos horários – sinónimo de abuso da laboração contínua, trabalho nocturno e por turnos, horários concentrados, bancos de horas – significa sempre «mais horário, menos salário, não saber a que horas se sai e muitas vezes não saber sequer com antecedência a que horas se vai entrar ou sair do trabalho».
Discurso enganador
Problemas que as bancadas do PSD e do CDS não reconhecem e a que em bom rigor são insensíveis. Isso mesmo ficou de novo patente pelo discurso que conduziram ao longo do debate, em que desconsiderarem as questões laborais, primaram pelo ataque cerrado às propostas numa linguagem impregnada de anticomunismo. Empregaram repetidas vezes palavras como «modernidade», «avanços tecnológicos», mas percebeu-se que o seu uso apenas serve para camuflar concepções tão arcaicas como a exploração.
«O PCP quer retomar legislação que está obsoleta», «insiste em reverter reformas», «tem visão passadista», «anda em busca da revolução perdida», «só sabe protestar, reivindicar», «quer pôr em causa a estabilidade da legislação», foram algumas das expressões de baixo recorte que ficam deste debate oriundas das bancadas do PSD e do CDS, muito empenhadas em endossar para a concertação social qualquer discussão sobre questões laborais.
«Para o discurso politiqueiro do PSD e do CDS sobre esta matéria não há tempo nem paciência», desabafou no final o deputado comunista António Filipe, frisando que para o PCP a defesa dos direitos dos trabalhadores é uma «questão central da vida nacional e é com toda a seriedade que a quer tratar».
Antes, em resposta às sucessivas referências daqueles partidos, mas também do PS, de que o lugar indicado para discussão destas matérias é na concertação social, Rita Rato contestara já tal posição sustentando que naquele fórum a discussão está «viciada», nele os «trabalhadores estão num plano inclinado, sempre em desvantagem».
E a este propósito, indagou: «Não foi nesta sala que se discutiu a introdução dos bancos de horas e da caducidade? Não foram deputados aqui sentados que votaram a caducidade? Então, porque é que não se vota aqui a retirada da caducidade? Porque é que não se defende aqui os direitos dos trabalhadores?»
Em cima do muro?
«Como é que se explica aos trabalhadores que todo o mal que lhes foi feito nos últimos anos seja para manter em matérias centrais? Como é que se explica que a situação do País melhore, que se verifique avanços significativos, que aumentem os lucros das empresas, e que os direitos dos trabalhadores possam ficar na mesma ou, inclusivamente, possam piorar por imposição patronal?», questionou António Filipe, defendendo que «não é pura e simplesmente aceitável».
Daí que a posição de aparente equidistância do PS, mas objectivamente pendente para um dos lados – «o PS não vai a reboque de outros partidos», «tem agenda própria, programa, ritmo e é isso que fará: nem o que uns querem nem o que outros insistem», disse Wanda Guimarães –, não tenha passado incólume na avaliação final da bancada comunista, com António Filipe a reafirmar a ideia de que «nesta matéria não há lugares em cima do muro».
«Ou se dá um passo significativo, aprovando medidas que alterem a desregulação dos horários de trabalho e dignifiquem a contratação colectiva ou, a não ser assim, o que se está a dizer é que tudo o que foi feito pelo PSD e pelo CDS de agressão aos direitos dos trabalhadores é para continuar», sublinhou da tribuna o vice-presidente do Grupo comunista na intervenção de encerramento.
Esta é, porventura, a principal leitura a reter deste agendamento do PCP e da clarificação que proporcionou (ver caixa), sem mais delongas nem artifícios oratórios, sobre o posicionamento de cada uma das bancadas num tema central.
E a opção de PS, PSD e CDS, não foi por ficar do lado da parte mais frágil da desigual relação laboral, da defesa dos direitos de quem trabalha, foi sim manter o statuo quo, prolongar os mecanismos que garantem à parte mais forte reforçados meios para acentuar a exploração e acumular mais lucro.
Em síntese, foi isto que resultou desta votação. E por isso, só poderá ser encarada como conversa demagógica qualquer referência daqueles partidos aos problemas da natalidade, da demografia ou das famílias.
Frases
«Os derrotados na sua estratégia de corte e regressão de direitos, agarram-se agora com unhas e dentes à manutenção das normas gravosas da legislação laboral para que estas possam servir o mesmo objectivo.»
Francisco Lopes
«Os trabalhadores, em função das votações, sabem quem está do seu lado e de que lado está cada um dos partidos.»
António Filipe
«O entendimento de modernidade para o PSD e o CDS é as trabalhadores das IPSS descansarem 52 dias por ano e trabalharem muito mais do que 300 dias.»
Rita Rato
«Onde está a modernidade quando não é possível articular a vida pessoal e familiar com a vida profissional?»
Paula Santos
«Os direitos dos trabalhadores têm sido violados pelo patronato desde 2014, nomeadamente os feriados municipais e de Carvaval.»
Carla Cruz