A loucura
O historiador Manuel Loff, no Público, apresentou Donald Trump como «um empresário com a ética de um predador sexual». Certeiro, na realidade individual de Trump – um empresário sem quaisquer escrúpulos – e na estrutura política da criatura – um predador sem peias e de imoralidade insana, portanto, um produto acabado do mais feroz capitalismo.
Não são adjectivos a mais e substituem, com proveito, a verborreia que por aí vai a classificar o homem, entretendo-se uns a dizer que «dividiu a América a meio» enquanto outros se multiplicam em hermenêuticas casuísticas a «desvendar» o que se esconde por detrás da actuação burgessa de Trump.
Os hermeneutas de Trump diagnosticam padecimentos no sistema democrático norte-americano, discorrendo sobre o «alastramento da pobreza nos EUA», o «desencanto dos trabalhadores desempregados» e a «capacidade mobilizadora dos grupos evangélicos», extraindo daí a «inesperada vitória de Trump» e caucionando a tese da «América dividida».
Os EUA estão divididos desde a sua génese colonial, aprofundaram essa divisão na sangrenta guerra da secessão para impor uma América alinhada com o ascenso industrial a uma América agrária e esclavagista e andaram dois séculos a sedimentar uma «terra da liberdade» assente no individualismo feroz e na lei da força, que lentamente se foi transformando na força da lei ao serviço dos do costume – os mais fortes, pois claro.
A história dos EUA é toda ela predatória, sem obstar alguns traços emancipadores contra a opressão da burguesia europeia florescente e, tendo apenas dois séculos e meio de vida, é também, de longe, o país que mais guerras desencadeou, em que participou ou promoveu, impondo-se como grande potência planetária apenas após a II Guerra Mundial, donde emergiu ao lado dos vencedores (aliás, a única guerra moderna onde saiu vencedor e lutou pelo «lado certo») e iniciou a consolidação do seu império com os planos Marshall em 1947, de apoio (e controlo) aos países capitalistas europeus destruídos pela hecatombe (incluindo metade da Alemanha nazi, que recebeu rios de dinheiro sem retorno, ao contrário do que a actual Alemanha unificada impõe aos «países sob resgate» da UE...). Tudo isto já está no Google, à mão de quem se quiser informar.
A estultícia é o método de comunicação do presidente Trump, expressa nos tweets frenéticos que inventou como estranho método de comunicação, crescendo as vozes nos EUA que lhe apontam a demência como motivo para a sua destituição, o que se junta ao inquérito que se aperta à sua volta sobre o conluio eleitoral com a Rússia de Putin.
Terá – ou não – sido isso que o levou a declarar Jerusalém capital de Israel, para desviar as atenções do inquérito à sua pessoa.
Mas foi esta, de certeza, a mais grave e perigosa loucura do seu alucinante mandato.