Prostituição é escravatura e exploração sem limites
SEMINÁRIO A «Prostituição: uma grave forma de violência e exploração. A situação na Europa e em Portugal», esteve em debate, dia 20, em Lisboa, visando a alteração de mentalidades. O PCP voltou a defender a aplicação do Plano de Combate à Exploração na prostituição, aprovado na Assembleia da República em 2015.
A prostituição tem vindo a aumentar em Portugal
No seminário – promovido pelos deputados do PCP no Parlamento Europeu (PE), em colaboração com o Grupo da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica – foram desmontados os falsos argumentos, usados em Portugal, pelos que pretendem a alteração do quadro legal com vista à legalização/regulamentação da prostituição.
Contribuindo para a reflexão sobre a problemática da prostituição, de outros países europeus intervieram Ana Rubin (Partido de Esquerda Sueco), Karin Werkman (activista feminista e investigadora – Holanda), Kajsa Ekis Ekman (jornalista, escritora, activista – Suécia), Marie Merklinger (Organização Space Internacional e co-fundadora da rede alemã «Sexkauf e Abolição»), Angela Vallina (deputada da Esquerda Unida no PE – Espanha), Pierrete Pape (actvista do Lobby Europeu das Mulheres-Bélgica) e Monika Plazoola (do País Basco – Espanha).
João Pimenta Lopes e João Ferreira (deputados do PCP no PE), Alexandra Silva (presidente da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres), Sandra Benfica (da Direcção Nacional do Movimento Democrático de Mulheres), Rita Rato (deputada do PCP na Assembleia da República) e Andreia Araújo (do Conselho Nacional e da Direcção da Comissão para a Igualdade entre Homens e Mulheres da CGTP/IN) foram os convidados nacionais do seminário que encerrou com a intervenção de Fernanda Mateus, da Comissão Política (CP) do Comité Central (CC) do PCP.
Lutar contra a exploração
Ângelo Alves moderou os trabalhos. Na intervenção de abertura, o membro da CP do CC sublinhou que aquela iniciativa teve, entre outros objectivos, incorporar na reflexão do Partido «elementos para a sua iniciativa e intervenção política», nomeadamente no plano institucional no PE e na AR, de forma a «defender todos os seres humanos, na sua esmagadora maioria mulheres, que são envolvidos e vítimas da prostituição e do proxenetismo».
Recusando «a resignação, a legalização e a regulamentação de uma forma de exploração particularmente violenta e mortal», Ângelo Alves destacou que a «sempre rica realidade» mostra que a prostituição «está actualmente ligada a dois tipos de fenómenos inerentes ao sistema dominante em que vivemos, o capitalismo».
«Por um lado, à exploração de classe, à exclusão social, ao aumento das desigualdades, aos conflitos militares e aos problemas do neocolonialismo e do sub-desenvolvimento. Por outro, a multimilionários negócios criminosos, como o tráfico de pessoas e de crianças, o tráfico de drogas, a corrupção e a lavagem de dinheiro, entre outros», referiu, lembrando que «o aprofundamento da crise estrutural do capitalismo tem conduzido a um aumento das actividades criminosas e da chamada economia subterrânea».
Recordou ainda que o PCP assenta a sua reflexão sobre o tema da prostituição num princípio básico: «Nunca desistiremos de lutar contra todas as formas de exploração de um ser humano sobre outro ser humano».
Segundo Fernanda Mateus, o PCP assume que a «gravidade da evolução da prostituição em Portugal, na Europa e no Mundo exige que se aprofunde, de forma continuada, o estudo da realidade da prostituição e se promova as medidas de combate e prevenção deste grave flagelo que escraviza muitos milhões de mulheres e crianças nas redes de tráfico de seres humanos e, também, aprisiona mulheres na prostituição a que alguns apelidam de “consentida”, “voluntária”, “por opção” quando se trata, igualmente, de uma aviltante exploração».
Neste sentido, considerou «necessário» que seja «estudada e avaliada» a «evolução da realidade da prostituição nos diversos países, dos seus enquadramentos legais, incluindo as consequências da legalização da prostituição para as mulheres prostituídas», mas também as «formas de exploração pelo proxenetismo (quem explora a actividade da prostituição)» – associadas ou não ao tráfico de seres humanos – que «crescem e se ampliam exponencialmente, com escandalosos crescimentos das suas receitas».
Propostas concretas
Mais adiante, a dirigente comunista acusou os sucessivos governos de, ao longo de décadas, nada fazerem em relação à prostituição, que em Portugal tem vindo «a aumentar associada às redes internacionais criminosas, mas também a outras formas de exploração pelo proxenetismo».
Entre 2010 e 2015, diversas organizações referiram o aumento da prostituição das mulheres sujeitas a uma espiral de pobreza persistente, que se agravou neste período, a que se associaram novas situações desesperantes de «sobrevivência» resultantes do desemprego, dos cortes nos apoios e prestações sociais, que tiveram como pano de fundo o empobrecimento generalizado.
Entre outras medidas, o PCP considera fundamental que seja dada prioridade a que a prostituição seja assumida pelos poderes políticos como uma grave violência sobre as mulheres, inscrevendo-a nas prioridades de combate e prevenção a todas as formas de violência sobre as mulheres; a adopção de um Plano de Combate à Exploração na prostituição (aprovado na AR em 2015), garantindo, nomeadamente, o acesso imediato das pessoas prostituídas a um conjunto de apoios que lhes permita a reinserção social e profissional.
PCP contra legalização da prostituição
A legalização/regulamentação da prostituição em Portugal, que em geral têm uma generosa cobertura por parte dos órgãos de comunicação social, foi um dos temas fortes do Seminário.
O PCP «rejeita este caminho de subversão do enquadramento legal da prostituição em Portugal», que «dá cobertura» a «uma sórdida exploração, ao aumento do tráfico de seres humanos que lhe está associada, ao branqueamento de capitais associados a outros criminosos tráficos», salientou Fernanda Mateus.
«Quem disso tenha dúvidas encontra a resposta nas nefastas consequências da legalização da prostituição na Alemanha e na Holanda», enfatizou, adiantando que a prostituição «é um problema social que acompanha e se aprofunda no quadro do capitalismo» e que se tem tornado um «flagelo social com mais forte incremento em contextos de crise, de agudização das desigualdades e da pobreza».
Para o PCP, acrescentou, «a prostituição integra as facetas mais degradantes e desumanas da natureza exploradora e predadora do capitalismo em que se inscreve a fome, a subnutrição, a negação do acesso aos cuidados de saúde, o trabalho infantil, o trabalho escravo ou o comércio de órgãos. É um crime contra a humanidade!»
Combate de todos
Fernanda Mateus referiu ainda que este é um «combate» que diz respeito a todas «as mulheres que lutam pela eliminação de todas as formas de dominação, exploração e violência», mas também de todos «os que são explorados e violentados por diversas formas». «É, por isso, necessário ampliar a consciência do que verdadeiramente está em causa», apelou.
João Pimenta Lopes
«Legalizar a prostituição é legalizar todo um negócio, criminoso, em seu redor. É legalizar o proxeneta e as redes de prostituição. É legalizar o organizador do mercado, e as redes imobiliárias para o sexo. É legalizar o dito turismo sexual. E é escancarar as portas para que se faça também o caminho para a legalização do tráfico de seres humanos e do esclavagismo».
João Ferreira
«O proxenetismo não é actividade empresarial. Às mulheres vítimas da prostituição deve ser facultado apoio e protecção específicos, não uma “carteira profissional” que legitime e perpetue a violência a que estão submetidas. Para nós, a prostituição é um atentado à dignidade humana, uma violação dos direitos humanos».
Alexandra Silva
«A prostituição não é ilegal em Portugal. Ninguém pode ser objecto de perseguição legal por prostituição. O que algumas pessoas querem não é a legalização da prostituição, que não é ilegal, é a legalização do lenocínio/proxenetismo, induzindo em erro as pessoas menos informadas».
Sandra Benfica
«A prostituição não é um acto individual de uma pessoa que aluga o seu corpo por dinheiro, é antes um sistema organizado para o lucro, um sistema intrinsecamente violento, discriminatório e profundamente desumano. Funciona como um negócio e cria um mercado. Nele as prostituidas são o elo mais fraco. Nele não há “liberdade”, “zonas seguras” ou “direitos”para elas».
Rita Rato
«O combate ao tráfico de seres humanos é inseparável da luta de combate à pobreza e exclusão social, tendo como aspectos centrais o desenvolvimento económico; a valorização do trabalho e dos trabalhadores; aumento dos salários e das pensões; maior justiça na distribuição da riqueza; aposta num sistema público de segurança social forte, num serviço nacional de saúde público, universal e gratuito, e numa escola pública e democrática que garanta a igualdade de direitos e de oportunidades para todos.
Andreia Araújo
A prostituição não pode ser considerada como trabalho e muito menos como trabalho digno, mas sim como uma inaceitável fonte de exploração das mulheres, que constituem a maioria das vítimas, de condenação a uma vida sem futuro de tantas jovens e crianças vítimas de tráfico, num negócio altamente rentável para aqueles que o promovem.
«Com mais de 40 anos, não consegui encontrar trabalho. Fui obrigada a entrar na prostituição. Criei uma página de Internet, com um perfil e um preço exorbitante. Passado 30 minutos, recebi uma mensagem. Ele atou-me e bateu-me. Foi uma experiência horrível. Passados mais de três anos encontrei finalmente um emprego, que apenas durou 12 meses. Na altura em que a legalização da prostituição foi aprovada na Alemanha, em 2002, dizia-se que havia programas para ajudar as pessoas a sair deste meio. Não encontrei nenhuma organização que o fizesse. Foi aí que o meu activismo se iniciou».
Angela Vallina
«Na Suécia quem paga para ter sexo é um criminoso. Sem negócios não há benefícios e sem benefícios não há prostituição».
Karin Werkman
«Na Holanda – o primeiro país a legalizar todos os aspectos da prostituição, em 2000 – seis mil pessoas são exploradas através deste negócio (16 pessoas por cada município). Na cidade de Roterdão, segundo um outro estudo, metade das pessoas que se prostituem estão ilegais».
Ana Rubin
«O modelo nórdico para a prostituição descriminaliza todos os que são prostituídos, presta serviços de apoio para ajudá-los a sair e faz com que a compra de pessoas por sexo seja uma ofensa criminal, a fim de reduzir a demanda que impulsiona o tráfico sexual».
Kajsa Ekis Ekman
«A prostituição não é um “trabalho” como qualquer outro. Para mulheres e meninas na prostituição, a taxa de mortalidade é 40 vezes maior do que a média. (...) Segundo um estudo liderado por Melissa Farley, realizado a 800 prostitutas de nove países, 71 por cento já tinham sofrido assaltos físicos, 63 por cento haviam tido coito forçado ou violação e 89 por cento disseram que queriam sair da prostituição. Que outra profissão pode ser comparada a isto?».
Pierrete Pape
«A prostituição perpetua a discriminação e o machismo, o que tem um grande impacto nos mais jovens».
Mónica Plazoola
É urgente e fundamental uma mudança de mentalidades na nossa sociedade. Não podemos avançar na mudança estrutural da sociedade sem lutar contra o patriarcado e o capitalismo. «Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres» (lema da 4.ª acção internacional da Marcha Mundial das Mulheres).
MDM denuncia crimes incompatíveis
com a dignidade humana
Na Europa, mais de 76 por cento das vítimas de tráfico são mulheres e, pelo menos, 15 por cento são mulheres. «Transformadas em mercadorias – compradas, vendidas, oferecidas, trocadas e descartadas – são exploradas nos criminosos negócios do trabalho escravo, da mendicidade e, sobretudo, da prostituição», afirma o MDM, adiantando que «as mulheres e crianças são 95 por cento do total de pessoas traficadas para fins de prostituição» e que «a forma mais comum de tráfico de seres humanos é a exploração sexual (67 por cento), seguida da exploração laboral (21 por cento)».
Inquietante realidade
Segundo o Observatório do Tráfico de Seres Humanos de 2016, em Portugal, das 182 presumíveis vítimas de tráfico sinalizadas, 27 eram menores e 141 adultas, das quais 123 eram mulheres, sendo que estes casos estão associados, na sua totalidade, à prostituição.
«Crescentemente têm vindo a ser sinalizadas vítimas de origem portuguesa levadas a aceitar ofertas de trabalho que escondem formas sofisticadas de recrutamento de pessoas para o tráfico doméstico e transnacional», adverte o MDM, acrescentando: «Os jovens constituem 20 por cento das vítimas de tráfico na Europa. Estima-se que 67 por cento são aliciados em locais públicos e nas redes sociais».
Tráfico de seres humanos
Com o objectivo de chamar a atenção para o combate às políticas geradoras da exploração das mulheres e das meninas, vítimas de gente sem escrúpulos e de um negócio altamente lucrativo, que vive da exploração dos corpos e sonhos das pessoas, o MDM inaugurou, dia 18, no Armazém 22, em Vila Nova de Gaia, a exposição «Tráfico de mulheres – escravatura dos tempos modernos» e estreou a peça de teatro «Mulheres – Tráfico», um trabalho documental a partir de relatos verídicos de mulheres traficadas, integrado no projecto «Agir Contra o Tráfico de Mulheres».