E tão só
Um tal André Ventura que, pelos vistos, se esmerou na Faculdade de Direito para afeiçoar o reaccionarismo, apareceu no concelho de Loures a dizer bojardas sobre a comunidade cigana e falando como «candidato à Câmara» pelo PSD e o CDS.
Obteve a notoriedade que pretendia nos órgãos de Comunicação Social, que lhe registaram a afirmação de que os ciganos «vivem de subsídios do Estado» e a sugestão de que devia haver penas perpétuas de prisão, entre outros raciocínios deste quilate.
Também obteve o imediato repúdio de quase todos os partidos, incluindo o CDS, que até lhe retirou o apoio à candidatura.
Em contrapartida, a criatura granjeou três apoios elucidativos.
O líder do PNR (a extrema-direita partidária), burgesso que ironizou com uma frase fatal: «Ao que parece, alguns dos “meus” ainda andam pelos partidos do sistema».
O fadista monárquico e chauvinista encartado, Gonçalo da Câmara Pereira, que disse algo sem a mínima relevância, como de costume.
E Pedro Passos Coelho que, após os desventurados dislates do Ventura, veio a público reafirmar-lhe o seu apoio, justificando que este «já esclareceu o que quis dizer».
O que a criatura disse, debitando asneiras, mentiras e falsidades sobre ciganos (mas também podia ser sobre outra minoria), foi ao estilo do populismo rasca que caracteriza esta gente: não apresentam factos ou argumentos e denigrem como «politicamente correcto» qualquer argumentação que se lhes oponha. Acresce que a relevância de que beneficiou este senhor veio apenas do destaque que lhe deram na Comunicação Social.
A gravidade do episódio está no apoio expresso por Passos Coelho ao sr. Ventura após as barbaridades que este proferiu, tornando-se o criador declarado desta criatura mas, pior do que isso, passando a ser o introdutor da boçalidade como argumento no debate político nacional, com o peso do apoio do PSD.
Temos, assim, o populismo de extrema-direita introduzido no debate político eleitoral pela mão de Passos Coelho. É um facto, que não demonstra como Passos Coelho está desnorteado (o único Norte deste homem foi sempre o poder, tout court), mas evidencia que o actual «líder da oposição» não tem sombra de escrúpulos – políticos, éticos, morais – que o possam deter, na sanha de alcançar os seus objectivos.
Os comentadores mui finos já preparam terreno, dizendo por aí que «a chegada» da extrema-direita «era uma questão de tempo», sem cogitarem que a extrema-direita nunca teve terreno favorável em Portugal, deste que o fascismo foi derrubado com a Revolução dos Cravos, em 1974...
Dizer, a propósito do sr. Ventura que Passos caucionou, que era uma «chegada anunciada», é um raciocínio em uso no universo troglodita da extrema-direita. E tão só.