Desabono
Cada um abona-se como pode ou como entende e ninguém tem nada com isso, mas lá que há abonos que não lembram ao diabo, lá isso há. É o caso do sr. Salgado, ex-presidente do defunto BES hoje a braços com a Justiça, que para atestar a sua idoneidade pessoal arrolou, entre outros, o sr. Silva, seu ex-empregado, a quem em tempo que já lá vão deu a (solicitada) bênção para fosse exercer como secretário-geral da UGT.
Diz-se que o sr. Silva é muito apreciado como sindicalista, sobretudo pelos patrões, mas nesta hora de aperto talvez fosse mais conveniente para o sr. Salgado resguardar-se de certas afirmações levianas, tão do agrado do sr. Silva, que foi ao tribunal garantir que o homem a quem se deve o facto de até Setembro de 2016, na sequência da resolução do BES que os portugueses estão a pagar com língua de palmo, terem saído da instituição 1062 trabalhadores através de reformas antecipadas, rescisões por mútuo acordo e despedimento colectivo, esse homem, dizia-se, ter revelado sempre uma «grande sensibilidade» para com os problemas dos trabalhadores. Ou que o facto de esse homem, na circunstância o sr. Salgado, «não exercer represálias sobre dirigentes sindicais, alguns dos quais membros do PCP e que chegaram a cargos de direcção», nas palavras do sr. Silva, fosse um caso tão insólito e extravagante que até os tribunais, tal como o dirigente da UGT, devem registá-lo para a posteridade como um caso de estudo, a exigir apurada análise para tamanha e incompreensível complacência.
«Ele não é nenhum assassino, que eu saiba, se é criminoso ou não essa é uma decisão que caberá aos tribunais» diz-se que disse ainda o dito abonador sindicalista, que assim de uma penada justifica o abono e tira o cavalinho da chuva, just in case, não vá o diabo tecê-las. E para que não restassem dúvidas, o sr. Silva foi ainda à TVI garantir que só abonou a «pessoa», o «carácter» e que «tudo o resto» lhe escapou.
Num caso em que o «resto» é tudo, o sr. Silva foi igual a si próprio: desabonou-se e não abona ninguém.