Os «salários» de Pedro e Paulo
A grande injustiça na distribuição do rendimento em Portugal não está localizada nas diferenças salariais dentro das empresa, que são gritantes diga-se, mas noutros instrumentos de remuneração do capital que permitem a distribuição dos lucros, conduzindo a uma cada vez maior polarização da riqueza. Mas a desproporcionalidade salarial existente em empresas como a EDP, a GALP, o BCP, a Jerónimo Martins e outras, em que os gestores se auto remuneram com salários que chegam a ser 100 vezes superiores à média dos restantes trabalhadores do grupo – como noticiava o DN no dia 2 de Maio – exige denúncia e combate.
O PCP foi o primeiro partido em Portugal a exigir a fixação de um limite aos salários pagos aos gestores do sector privado, alinhando-os, tal como é exigível ao sector público, com o que é pago aos titulares dos órgãos de soberania. Uma posição que possibilitou que a discussão não ficasse apenas centrada no sector empresarial público, cujas regras remuneratórias a política de direita se encarregou de alinhar com o que de mais grave se pratica no sector privado e que o Governo PS quer preservar.
A reacção foi a que se esperava com o esbracejar dos que nunca vêem condições na economia e nas empresas para aumentar os trabalhadores mas que são os primeiros a insurgir-se contra qualquer limite às remunerações dos conselhos de administração e outros órgãos/funções de topo. Era o que faltava, o Estado ditar como é que a riqueza é distribuída dentro de uma empresa! É um assunto que cabe aos accionistas decidir, dizem!
Na verdade, os «salários» dos gestores deveriam ter aspas, porque salários, de facto, não o são. São sim, uma forma acrescida, ou encapotada, de remuneração do capital. Veja-se, segundo a mesma edição do DN, os casos de Paulo Azevedo ou Pedro Soares dos Santos, da SONAE e Jerónimo Martins, respectivamente, cujos chorudos «salários» se somam ao bolo dos lucros que as respectivas famílias arrecadaram como «accionistas» da empresa.