Ficção política

Luís Carapinha

Os EUA comandam uma desenfreada corrida belicista

A barragem desinformativa anti-russa tomou conta da agenda política e comunicacional dominante. Mais além da parafernália e delírio propagandísticos, e independentemente de considerações críticas de substância que há a fazer sobre a evolução e vicissitudes do capitalismo russo, retenha-se que esta é essencialmente uma campanha oportunista e funcional aos objectivos agressivos dos EUA e das potências imperialistas, num tempo de grande turbulência sistémica em que as feridas do tombo capitalista mundial de 2007/8 estão longe de sarar. Não é pois perdoável que a Rússia se atreva a resistir ao status-quo e a ser cooptada pelos desígnios da ordem mundial prevalecente que naturalmente tem como centro os EUA. Os EUA, UE e NATO bombardeiam e retalham a Jugoslávia, fazem gato sapato da Carta da ONU e direito internacional; um presidente norte-americano que invadiu o Afeganistão e o Iraque com base em mentiras proclama a cruzada contra Ialta e a ordem internacional fundadora saída de 1945, mas é Moscovo, por natureza, a potência revisionista. Desde a desintegração da URSS, a NATO não cessa a expansão para Leste, os EUA comandam uma desenfreada corrida belicista, desenvolvem um sistema ofensivo global antimíssil e adoptam a doutrina de (primeiro) ataque demolidor, mas é Pútin e a Rússia que ameaçam a unidade europeia e a pacífica ordem assente no sacrossanto elo transatlântico. EUA e UE promovem forças neofascistas e conluiam-se no golpe de Estado na Ucrânia e deflagrar da guerra no Donbass, mas é a Rússia a potência invasora. Como ontem a Líbia, a Síria é hoje outro exemplo da macabra hipocrisia dominante. São inapagáveis os nexos entre as agências do imperialismo e o ISIS e demais organizações da constelação terrorista islâmica que intervêm decisivamente na guerra de esfacelamento da Síria. EUA e Turquia são forças invasoras e as acções da coligação internacional liderada por Washington são terrorismo de Estado e uma frontal violação do direito internacional. Mas os culpados da tragédia síria são os mesmos de sempre: o regime de Assad e seus aliados, antes de mais a Rússia. Na espiral de perversão e inversão da realidade, até as eleições dos EUA terão sido predeterminadas por Pútin. Trump surge assim quase como um corpo estranho, exterior ao sistema e código genético da potência hegemónica, em que um presidente pode ser democraticamente eleito com menos três milhões de votos do que o concorrente. Com tal insidiosa campanha de russofobia quase se esquece o registo de ingerência, desestabilização e guerra de que os EUA são destacados artífices no mundo. Incluindo os objectivos estratégicos da ofensiva contra a Rússia. O folclore anti-Pútin poupará diligentemente os epígonos da escola de Gaidar e as posições do capital financeiro no aparelho do poder russo. O alvo não é o poder em si da oligarquia ou a restauração capitalista. Não podendo para já realizar o cenário da Maidan russa e o objectivo inconfessável de desintegração, o imperialismo aposta na escalada de pressões, procurando atiçar o velho chauvinismo russo.




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