Da Grécia e da mentira…

Ângelo Alves

Dizem as no­tí­cias que o Eu­ro­grupo reuniu para ana­lisar a si­tu­ação na Grécia e que o «tabu» da dí­vida grega foi que­brado. As no­tí­cias lançam a pos­si­bi­li­dade de «re­es­tru­tu­ração» da dí­vida grega e a ideia da «fle­xi­bi­li­dade».

Mas trata-se de uma men­tira. O Eu­ro­grupo nada de­cidiu sobre a dí­vida grega. O que de­cidiu e ana­lisou foi, ao invés, o pros­se­gui­mento de um ca­minho que apro­fun­dará ainda mais o grau de en­di­vi­da­mento e sub­missão da Grécia aos di­tames da União Eu­ro­peia e do FMI. O que foi de facto de­ci­dido e «ana­li­sado» foi o cum­pri­mento in­te­gral por parte do go­verno grego das me­didas de aus­te­ri­dade con­tidas no cha­mado «me­mo­rando de en­ten­di­mento» im­posto ao povo da Grécia. Mais pre­ci­sa­mente o Eu­ro­grupo «ana­lisou» se os 5400 mi­lhões de euros de cortes nas pen­sões e de au­mentos de im­postos de­ci­didos pelo go­verno Sy­riza/​Anel chegam, nesta fase, para «des­blo­quear» a se­gunda tranche do «em­prés­timo» à Grécia – cujo valor é também de 5400 mi­lhões de Euros – que a Grécia «pre­cisa» para «pagar» aos seus «cre­dores». Ou seja, e sim­pli­fi­cando, o povo grego paga mais cinco mil e qua­tro­centos mi­lhões de euros. O Es­tado «re­cebe» esse mesmo valor de «em­prés­timo» que por sua vez en­trega aos mesmos que lhe «em­pres­taram» esse mesmo valor. Contas feitas quem perde cinco mil e qua­tro­centos mi­lhões de euros é o povo grego. Como sempre aliás. Como o de­monstra o facto con­fir­mado há dias de que 95 por cento dos 216 mil mi­lhões de euros «em­pres­tados» à Grécia foi parar aos co­fres dos mega-bancos eu­ro­peus, ou seja, aos «cre­dores».

Quanto à dí­vida… Fala-se va­ga­mente de re­a­va­li­ação, de re­visão, etc… mas só de­pois de 2018, e se a Grécia con­ti­nuar a cum­prir es­cru­pu­lo­sa­mente as or­dens dos «cre­dores». Ou seja, o Eu­ro­grupo acei­tará mudar o mé­todo e o ritmo da ex­torsão (nunca o valor), mas só de­pois de a Grécia se en­di­vidar ainda mais. Pelo ca­minho, são apro­vados me­ca­nismos au­to­má­ticos de ainda mais ex­plo­ração e em­po­bre­ci­mento da Grécia (não vá a re­a­li­dade fazer das suas) e ga­rante-se que o «fundo de pri­va­ti­za­ções» (o ba­canal de pri­va­ti­za­ções em que quem dita as regra são os «cre­dores») está «ope­ra­ci­onal» em Se­tembro.

Não! O Eu­ro­grupo não mudou nada, tal como nada mudou na Grécia e na União Eu­ro­peia. Quem achar o con­trário ou está en­ga­nado ou está a mentir.




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