«O rei vai nu»

Henrique Custódio

As televisões da praça ofereceram ao País, como presente de Natal, uma algazarra sobre «as dificuldades» da reversão das privatizações.

É deplorável ver noticiários, jornalistas e comentadores televisivos, todos à uma, de circunspecção franzida, elaborando sobre «custos», «onerações», «legitimidades», «compromissos» «do Estado» e etc. da anunciada reversão das privatizações nos transportes públicos de Lisboa e do Porto e da manutenção na esfera pública da TAP «privatizada».

O que quase ninguém refere – fingindo que o ignoram – é que as ditas «privatizações» ocorreram na flagrante ilegitimidade, o que as coloca no campo da ilegalidade.

Começando pela TAP, é bom lembrar que os acordos assinados entre o secretário Monteiro (fero rabejador das «pegas» às empresas públicas) e os Barraqueiros nacionais e estrangeiros «privatizando» a empresa aérea nacional o foram um dia depois de o Governo do PaF ser demitido e não ter qualquer autoridade que o legitimasse. Acresce que o programa eleitoral do PS de António Costa declarava com clareza há meses que não consentiria, sendo Governo, que a TAP saísse da esfera pública e do controle maioritário do seu capital pelo Estado. O Neeleman e o Pedrosa da golpaça sabiam disto tudo – sabiam mesmo que todos os partidos eram contra a privatização da TAP, à excepção dos minoritários do PaF, pelo que bem podem agora chorar obrigações contratuais num contrato que é uma ilegalidade do princípio ao fim - como eles sempre souberam e, naturalmente, melhor do que ninguém.

Os casos do Metropolitano, Carris e STCP de Lisboa e do Porto são tirados a papel químico do caso TAP, no que toca à ilegitimidade do Governo PaF para celebrar contratos de concessão já sem autoridade oficial para isso e contra o parecer e a vontade manifestos de toda a oposição. Com um pormenor: o Tribunal de Contas havia já travado todas as concessões com um parecer negativo, o que não impediu o forcado Monteiro de pegar os «bichos» à cernelha, embrulhá-los nas «chocas» e forçar encurralá-los nas concessões atamancadas a mata-cavalos.

O verdadeiramente extraordinário destes dislates é a solenidade posta no caso pela mão-cheia de jornalistas e comentadores televisivos (atenhamo-nos a estes) que chusmam pelas programações, fingindo levar a sério casos que lhes deviam segregar repulsa e denúncia informativa, tão flagrantes são as ilegalidades e ilegitimidades cometidas pelo Governo Passos/Portas nestas pseudo-privatizações e tão exposta ficou a sanha privatizadora da agremiação, sem respeito por nada – nem os interesses do País, nem o Estado de direito, nem sequer a representatividade do sistema constitucional-democrático que nos rege.

«O rei vai nu» desta história é o sistema informativo das televisões.




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