Ei-los
A Assembleia da República vota hoje o programa de Governo e a moção de rejeição que será apresentada por PDS e (talvez) CDS. Sem pretender fazer futurologia, dado que esta crónica é escrita na véspera, é caso para dizer, parafraseando Santana Lopes, que «está escrito nas estrelas» que o País vai assistir a mais uma lastimável encenação da direita sobre a «legitimidade» do novo Governo, a «excelência» das políticas do anterior executivo e, naturalmente, o «apocalipse» que já se perfila no horizonte com o País nas mãos do PS atrelado à «esquerda radical».
Acantonados na ficção das eleições para primeiro-ministro e no direito a governar – apesar de todos à uma terem exigido que os deputados, cá está, do PS viabilizassem o governo PSD/CDS, e de há dias Passos Coelho ter reconhecido que afinal foi mesmo eleito para deputado – os partidos da coligação têm vindo a afinar a narrativa que se propõem repetir à exaustão na esperança que se torne verdade oficial com o sempre solícito apoio da opinião publicada.
Insistindo na tecla de que o País está muito melhor e em recuperação graças ao anterior executivo, ei-los a pedir com dramatismo na voz «não estraguem!», como se fosse motivo de regozijo ter aqui chegado com uma economia anémica depois do brutal aumento de impostos, da brutal recessão, do brutal empobrecimento da maioria da população, do brutal aumento do desemprego, da brutal escalada da emigração, mesmo com juros inusitadamente baixos e com a ajuda da queda do preço do petróleo.
Ainda os ministros não tinham tido tempo de aquecer as respectivas cadeiras ministeriais e já se erguiam as vozes dizendo que a má prestação da economia – em estagnação de facto, como revelam os últimos dados do INE – era fruto do medo dos investidores e dos consumidores. Fazendo de conta que as contas batem certo, acenaram o papão dos juros da dívida, apesar de os mesmo continuarem a cair numa clara demonstração de que os famigerados «mercados» se movem por azimutes que não distinguem a Lapa do Largo do Rato.
Numa altura em que a cada dia se vai percebendo a dimensão da burla dos «cofres cheios» e a par e passo se descobre a dimensão do compadrio e favoritismo que pautou a actuação do governo Passos/Portas – da escandaleira da TAP ao Novo Banco, passando pela omissão dos 490 milhões de euros atribuídos como benefícios fiscais pelo Ministério das Finanças nas contas de 2013, sendo que 79 por cento das isenções concedidas a SGPS (holdings de grupos) foram atribuídas aos dois maiores beneficiários, entre muitas outras irregularidades de milhões, como acaba de revelar o Tribunal de Contas sem identificar os contemplados – numa altura destas, repete-se, ter o descaramento, a sem-vergonhice, a indecência, o despudor de falar invocando o interesse nacional é, no mínimo, uma afronta ao País e aos portugueses.
A 24 de Janeiro, como a 4 de Outubro, terão a resposta que merecem.