Inquietação e ódio de classe
Vivemos sob o impacto dos resultados das eleições de 4 de Outubro, num quadro político novo e de desenvolvimento incerto em que, uma vez derrotadas as leituras e os cenários da noite eleitoral visando impor a continuidade do Governo PSD/CDS, os poderes dominantes desencadearam uma fortíssima campanha política e ideológica para impedir a interrupção do actual curso abertamente reaccionário e destruidor.
Não é de estranhar que, nesta campanha, os ataques ao PCP, do mais primário e cego ao mais sofisticado anticomunismo, ocupem o primeiro plano, pois se tornou evidente aquilo que sempre tem sido escondido e negado: o incontornável papel o PCP na luta por uma alternativa a décadas de política de direita. A surpresa e o susto são evidentes.
Disseram-se e escreveram-se em catadupa dislates que já raramente se viam. Soaram proclamações anticomunistas carregadas de ódio, dignas do tempo do fascismo. Ressuscitaram-se os espectros que desde Marx tiram o sono às classes exploradoras. Insistiu-se na falsificação do processo da Revolução portuguesa. O «perigo» de soluções governativas em que o PCP possa de algum modo estar envolvido foi agitado em todas as suas modalidades, a começar pela catástrofe económica e financeira resultante da reacção dos «mercados» e das «instituições» estrangeiras a quem a política de direita tem vendido Portugal.
E enquanto uns, que nada conhecem da história do PCP e da sua capacidade para, mesmo nas mais complexas situações, encontrar os caminhos que melhor sirvam os interesses dos trabalhadores, especulam surpreendidos com o que chamam de «viragem táctica» e até de «abraço de urso» do PCP ao PS; outros, esperando talvez poder perturbar as suas fileiras, vêem na coerente intervenção do PCP para soluções que fechem as portas ao criminoso caminho que o Governo PSD/CDS tem protagonizado, o abandono do seu programa eleitoral e mesmo da sua natureza de classe e identidade revolucionária.
Não vamos polemizar com aqueles que, tanto de um ponto de vista de direita, com tiques fascistas, como de «esquerda», verbalista e pseudo-revolucionária, disparam sobre o PCP todo o tipo de atoardas. A história, a coerência revolucionária do PCP, o reconhecido respeito dos comunistas portugueses pela palavra dada falam por si. Mas é oportuno chamar a atenção para duas questões de fundo.
Duas questões
A primeira. A luta pelo socialismo é um processo complexo, irregular e acidentado, com etapas e fases intermédias e comportando surpresas e viragens inesperadas. E mais ainda nos tempos duros que vivemos, em que no quadro do aprofundamento da crise estrutural do capitalismo crescem os perigos do fascismo e da guerra. Mas não há fatalidades. Grandes perigos coexistem com grandes potencialidades transformadoras e revolucionárias. São as massas e a sua luta que decidem do curso da História. Da luta de classes acabam sempre por sair soluções para os problemas colocados pelo desenvolvimento social.
Esta realidade está presente na situação política portuguesa. A derrota eleitoral do PSD/CDS e as possibilidades abertas pela nova arrumação do quadro político-partidário, têm a marca decisiva, não apenas da excelente campanha política de massas que a CDU realizou, mas sobretudo da luta persistente e corajosa travada pela classe operária e pelas massas populares. Aqueles que procuraram transformar a derrota do PSD/CDS numa vitória e diminuir o alcance do avanço da CDU, estão confrontados com a realidade dos factos: quer queiram ou não, em Portugal há uma grande força, o PCP, que conta e contará sempre decisivamente na evolução do País e que está preparado para assumir todas as responsabilidades que o povo português queira atribuir-lhe. É isso que justamente inquieta a classe dominante.
A segunda questão é inseparável da primeira. No que tem sido dito e escrito sobre o PCP há muito de surpresa, preocupação e insegurança. Mas há sobretudo pendor antidemocrático e ódio de classe. Surge mesmo quem reclame a ilegalização dos comunistas. Se tal acontece perante um simples diálogo para examinar possibilidades de entendimentos com objectivos ainda limitados, o que não tentaria uma reacção condenada à derrota se estivéssemos – e não estamos – perante a eminência da alternativa patriótica e de esquerda necessária para inverter o desastroso rumo actual da vida nacional.
A conclusão é óbvia. Os comunistas têm diante de si tarefas particularmente exigentes, não podem contar com soluções fáceis, têm de estar preparados para todas as situações. Mas unidos em torno do Programa do Partido «Uma democracia avançada, os valores de Abril no futuro de Portugal», intensificando a luta de massas e reforçando o seu grande colectivo partidário, estreitando a sua ligação com as massas, com confiança nos ideais do socialismo e do comunismo, acabarão por vencer todos os obstáculos que, como é o caso das campanhas anticomunistas, se erguem no seu caminho.