Nefelibatas

Henrique Custódio

Pires de Lima, o empresário cervejeiro que anda em pose-de-Estado desde que recebeu o penacho de ministro da Economia, disse o seguinte, para o novo presidente da PT:

«Falando de responsabilidade social, também foi bom, e espero que seja um compromisso que se possa depois comprovar na prática, agora vamos estar todos muito mais atentos, senhor Armando Pereira, ver as suas declarações públicas de que não vai fazer despedimentos na PT. É uma empresa que dá emprego a muita gente e que, seguramente, agradece poder ter esse sinal de conforto e segurança na hora que estamos a viver na economia portuguesa».

Descontemos o Português macarrónico do exultante ministro. Há pessoas que se dão mal com o improviso e Pires de Lima dá-se pessimamente – pelos vistos, ninguém ainda o advertiu.

Todavia, há proposições nítidas, no tête à tête do ministro com o administrador.

A primeira, coloca o governante «à espera» que as declarações públicas do Senhor Administrador – «de que não vai fazer despedimentos na PT» – «seja um compromisso que se possa depois comprovar na prática».

E se o «esperado» pelo ministro for um «compromisso» que «não se comprove na prática»?

A segunda, apresenta o ministro a esclarecer que a PT «é uma empresa que dá emprego a muita gente» e «seguramente agradece poder ter esse sinal de conforto e segurança».

Como?!... A empresa «agradece»? Qual empresa – a dos seus trabalhadores, que lhe garantem o funcionamento perpétuo, ou a da sua administração privada, que só visa extrair dividendos crescentes e cortar sempre nas despesas e na qualidade do serviço (que por acaso é público e vital para o País)?

E gaba-se este homem de «ser empresário». Imaginemos o que pensaria ele se, num negócio de alargamento cervejeiro, ouvisse um ministro da Economia a declarar-se «à espera» que «não faltasse à palavra» sobre «não fazer despedimentos» nesse alargamento e acrescentasse que «a empresa agradecia» esse «sinal de conforto e segurança»...

Nunca foi tão flagrante, no nosso País, a exibição do nível zero da incompetência governativa. Mas o exemplo multiplica-se pelo «Governo de coligação», que está recheado de pérolas vindas de toda a hierarquia e de que respigamos como «os jovens devem sair da zona de conforto e emigrar», dito por Passos Coelho e agora reinventado por ele como «mito urbano» (?), ou «Portugal está a bombar!» bombado por Paulo Portas, delirante a manobrar décimas que não querem dizer nada, ou ainda Coelho a ter a inaudita desfaçatez de gabar-se de ter sido ele a «desatar o nó» que impedia a concretização do «acordo» da UE que pôs a Grécia de gatas.

O Governo Passos/Portas é uma arregimentação de doutores de meia tigela, com o «patriotismo» na bandeira da lapela e uma visão predadora da governação. São uns nefelibatas do poder, pois circulam nele como se andassem nas nuvens.

Informo, em adiantamento, que «nefelibata» vem directamente do grego.

 



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