Sionismo senil?

Filipe Diniz

Realizam-se em Março eleições gerais em Israel. O partido de Netanyahu, o Likud, publicou já dois vídeos de pré-campanha que têm deixado estarrecidos os mais empedernidos sionistas.

No segundo, uma carrinha com indivíduos vestidos como militantes do ISIS. O condutor pergunta a outro automobilista o caminho para Jerusalém. Este responde: «o caminho é pela esquerda». Em fundo dos militantes ISIS ouve-se um rap: «Desde criança que sei que quero ser enterrado na terra onde jaz o meu avô. Desde criança que sei que quero ser soldado e pertencer à Fatah, Hamas e Abbas». Contra esta ameaça, há que votar Netanyahu, porque a referida «esquerda» é fraca e submissa. Trata-se dos trabalhistas, tão sionistas como o Likud.

Mas o primeiro vídeo é o mais marcante. Um casal está em casa à espera da babysitter. Quem lhes entra pela porta é o próprio Netanyahu, que se apresenta como Bibi-sitter (o tosco trocadilho resulta de «Bibi» ser o diminutivo pelo qual os seus admiradores o conhecem). Garante-lhes: «sou eu quem tomará conta dos vossos filhos». O casal despede-se: «Shalom» (paz). Netanyahu responde: «Não a qualquer preço».

Estes vídeos conseguem em minutos resumir questões essenciais: a falsa «bipolarização» sobre a qual este tipo de regimes constrói a sua fachada «parlamentar»; o genocídio e a guerra como meios insubstituíveis de defesa. Que Netanyahu tenha escolhido a defesa das crianças como arma de campanha diz tudo sobre a dimensão humana do personagem. Segundo dados fiáveis e documentados (por exemplo em rememberthesechildren.org) desde 2000 até à operação «Chumbo fundido» terão morrido mais de 2300 crianças palestinas, não se incluindo nesse número todas as que morreram em consequência da falta de cuidados médicos e de medicação resultantes do bloqueio israelita. No mesmo período, morreram 129 crianças israelitas.

Mas o que mais surpreende é o carácter caricato – para não se dizer imbecil – de tais mensagens pré-eleitorais. Será da baixa consideração em que o sionismo tem o seu eleitorado, ou dar-se-á o caso de o sionismo ter entrado na fase senil? Uma coisa é certa: quando Netanyahu for levado a julgamento pelos seus crimes (e esse dia há-de chegar), pode sempre apresentar estes vídeos e invocar inimputabilidade.




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