Desinvestimento que mata
As questões relacionadas com a Saúde voltaram ao centro da agenda parlamentar, faz hoje uma semana, 5, a propósito de iniciativas legislativas de todas as oposições sobre os cuidados de saúde primários.
Muitos doentes não vão à consulta ou ao tratamento porque não conseguem pagar o transporte
Pelo lado do PCP foram dois os diplomas submetidos a debate: um, visando o reforço desses cuidados de proximidade às populações; o outro, pelo reforço e valorização dos profissionais de Saúde no SNS. Ambos viriam a ser chumbados pela maioria PSD/CDS-PP, acontecendo o mesmo aos restantes diplomas do PEV, BE e PS.
Da parte das bancadas da maioria ouviu-se o habitual discurso de que «não há desinvestimento» e de que o Governo «tem feito todos os esforços» em termos de medicina geral e familiar, segundo Paulo Almeida, CDS-PP, chegando João Prata, do PSD, a alegar que já estariam a ser «postas em prática» pelo Governo as propostas agora apresentadas pelas oposições.
Um discurso sem conexão com a realidade que a deputada comunista Carla Cruz rejeitou com firmeza, pondo em evidência, desde logo, a circunstância de os problemas nos serviços de urgência e nos centros de saúde não serem «novos nem pontuais, mas sim estruturais».
E considerou que o Governo, com o seu «discurso de propaganda», o que faz é negligenciar os problemas com que se confrontam os doentes, como seja as longas horas de espera para atendimento, a falta de camas hospitalares, o não acesso a medicamentos que podem salvar vidas, as dificuldades económicas que impossibilitam a compra de medicamentos ou a ida a consultas.
Um caos, em suma, que no entender de Carla Cruz é o resultado do subfinaciamento do SNS, do desinvestimento nos cuidados de saúde primários, na desvalorização social e profissional do pessoal de saúde.
E a propósito desse desinvestimento nos cuidados de saúde primários, citou um relatório do Tribunal de Contas, de Agosto de 2014, onde se afirma que o financiamento destinado a esta área de prestação de cuidados de saúde entre 2009 e 2012 «é contrário à pretensão sucessivamente anunciada de uma aposta séria na dinamização dos cuidados de saúde primários».
As consequências destas opções, essas, para além das referidas, medem-se ainda pela diminuição da capacidade de resposta dos serviços devido ao encerramento de centros e extensões de saúde, pela falta de profissionais de saúde, pelo subfinanciamento que impede a assumpção dos objectivos inerentes aos cuidados de saúde primários, pela existência de mais de um milhão e quatrocentos mil portugueses sem médico de família, pelo abandono precoce de médicos e pela redução do número de horas que estes prestam no SNS.
Vidas por um fio
A deputada comunista Paula Santos saudou a «luta» de doentes com «Hepatite C» e seus familiares, interpretando-a como um factor decisivo para o acordo entretanto celebrado entre o Ministério da Saúde e uma farmacêutica para a distribuição de um medicamento inovador.
«Quanto é que custa uma vida humana para o Governo? A verdade é que, ao longo deste processo, as negociações decorreram por muito tempo e foi na sequência da luta das pessoas com a doença e dos seus familiares que resultou esta decisão», afirmou na passada sexta-feira a deputada do PCP, em declarações aos jornalistas no Parlamento.
A parlamentar comunista aludia à recente morte de uma doente que aguardava pela autorização para a toma do novo fármaco e aos protestos, na antevéspera, de um outro doente em plena comissão parlamentar de Saúde onde o ministro da Saúde, Paulo Macedo, estava a ser ouvido a pedido do PCP.
«É bem vinda a possibilidade de todos os doentes com Hepatite C terem acesso ao tratamento adequado», congratulou-se Paula Santos, que lembrou ainda ter a sua bancada apresentado recentemente uma proposta para a criação do «Laboratório Nacional do Medicamento», como forma de reduzir a dependência do País da indústria farmacêutica.