Em nome da oligarquia

Luís Carapinha

Sacrificaram o futuro da Ucrânia aos seus interesses

Se alguém desejar conhecer em pormenor como se desfaz e empurra para o abismo um país, então deverá fixar o exemplo da Ucrânia, especialmente ao longo do último ano. Deparar-se-á com uma verdadeira história de ódio e terror com carrascos e vítimas, onde não faltam as fotos de família e a galeria de criminosos, tal como na famigerada Cimeira dos Açores que anunciou o ataque assassino ao Iraque (em que posaram Durão, Bush, Blair e Aznar). Aliás de Durão Barroso, agora em nome da Comissão Europeia, bem se pode dizer que foi reincidente nestas altas andanças político-diplomáticas de armar a guerra e ajudar a destroçar soberanias e povos. Não precisou de posar na Maidan como muitos dos seus consortes, mas para a posteridade ficaram gravadas as ameaças por si proferidas ao poder constitucional da Ucrânia, como foi o caso na Cimeira de Vilnius da Parceria Oriental da UE, no final de 2013, perante a recusa de Kiev em assinar o Tratado de Associação com a UE, cujos termos equivalem de facto a uma acta de capitulação da soberania nacional ucraniana. Estava dado o mote para a «explosão» da Maidan e o assalto ao poder da tropa de choque neonazi, cuja organização durante anos a fio contou com o apoio dos EUA. Nas semanas e meses seguintes representantes e emissários dos EUA, UE e NATO multiplicaram as advertências e ameaças ao poder hesitante de Ianukóvitch para que não ousasse fazer uso da força legal, enquanto o centro de Kiev ficava à mercê da violência arruaceira e dos desmandos dos neofascistas. O cenário de golpe de Estado escolhido pelo imperialismo seria consumado em Fevereiro sob a «mediação» de uma alta-troika da UE.

É improvável que ao decidir levar o golpe até ao fim e instalar no poder em Kiev uma Junta liberal-fascista, Washington e Bruxelas não estivessem cientes das trágicas consequências para a Ucrânia que tal desfecho acarretaria. Sacrificaram o futuro da Ucrânia aos seus interesses estratégicos e agenda agressiva.

Desde então muita água já correu debaixo das pontes do país do Dniepre. Sem disparar um tiro, a Rússia fez regressar ao seu berço a Crimeia e a cidade de Sebastopol, sede da frota russa do Mar Negro. Sob a batuta do FMI, os liberais-tecnocratas e nacionalistas moderados ucranianos converteram-se ao ultranacionalismo feroz e xenofobia militante, abrindo as alas do poder à extrema-direita neofascista. Quando o poder ilegítimo foi confrontado com os protestos nas regiões do Leste e Sul e as reivindicações de federalização lançou as forças armadas, a guarda nacional e os batalhões neonazis contra o seu próprio povo. Enquanto o Donbass era fustigado com tanques, artilharia pesada e aviação, no país aprofundou-se o clima de perseguição e repressão política, de que são exemplos a chacina de 2 de Maio em Odessa e as agressões, detenções e assassinatos de comunistas, antifascistas e dirigentes opositores.

Porochenko prometeu, quando assumiu o poder, derrotar os «separatistas» e «terroristas» em dias, semanas. No pino do Verão, o alto comando militar de Kiev anunciou a conclusão vitoriosa até final de Agosto da operação no Donbass. Os prognósticos falharam. No meio de combates de grande ferocidade, a ofensiva do poder não atingiu os objectivos propostos. As baixas humanas e militares foram elevadíssimas (Porochenko reconheceu a destruição de 65% do arsenal mecanizado do Exército). O Governo sentou-se à mesa das negociações, mas a guerra não cessou no Donbass, cortado ao meio. Sob o fogo cruzado da guerra económica movida contra a Rússia, o perigo de um longo impasse junta-se às terríveis destruições. Com o Inverno à porta, sem gás e com a maioria das minas de carvão sob a alçada das repúblicas rebeldes, a economia nacional encontra-se à beira da bancarrota e as condições de vida dos ucranianos degradam-se dramaticamente. Em resposta, a junta e os media intensificam a campanha de irracionalismo. É este o preço do desastre na Ucrânia.

 



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