Soberania e desenvolvimento
O Grupo Parlamentar do PCP entregou anteontem na Assembleia da República um projecto de resolução intitulado «Renegociar a dívida, preparar o País para a saída do euro e retomar o controlo público da banca para abrir caminho a uma política soberana de desenvolvimento nacional». Dando resposta àqueles que são três dos principais constrangimentos que entravam a recuperação e o progresso do País – a dimensão das dívidas pública e externa, a submissão ao euro e a banca privada –, o projecto materializa uma componente essencial da política patriótica e de esquerda que o PCP propõe.
Sustentado na realidade objectiva do País – que, após 38 anos de política de direita e quase 30 de integração na CEE/UE, está «mais desigual, mais injusto, mais dependente e menos soberano» –, o projecto parte da constatação que a dimensão dos problemas existentes exige «não o aprofundamento da lógica de desenvolvimento capitalista, com o consequente domínio do capital monopolista» e suas consequências, mas uma ruptura com a política de direita e a concretização de uma política alternativa vinculada aos valores de Abril. Tal alternativa, lê-se ainda texto do projecto, só poderá progredir se o País dispuser das «condições adequadas»: são elas a renegociação da dívida, a libertação do País da submissão ao euro e o controlo público da banca.
Prazos, juros e montantes
No que respeita à renegociação da dívida pública, o PCP defende que ela abranja prazos, juros e montantes de forma a reduzir substancialmente o volume dos seus encargos anuais, compatibilizando o serviço da dívida com a promoção do desenvolvimento. A referência adiantada no projecto aponta para que os juros pagos anualmente sejam reduzidos «em pelo menos três quartos».
Na parte deliberativa do projecto, o PCP propõe especificamente que seja apurado formalmente a «real dimensão da dívida das administrações públicas e do sector empresarial do Estado, desagregando a sua origem, natureza, credores e evolução previsível. A suspensão do pagamento da dívida directa do Estado, com vista à sua renegociação, é uma possibilidade aberta pelo Partido.
A salvaguarda das condições contratadas com os pequenos aforradores e com a dívida na posse da Segurança Social e do sector público administrativo e empresarial do Estado e dos sectores cooperativo e mutualista, a reversão para o Estado das parcerias público-privadas e a nulidade ou anulação dos contratos swap são outras das propostas incluídas no projecto do PCP.
Travar a submissão e a chantagem
Com o segundo grande eixo do projecto, a preparação do País para a saída do euro, o PCP visa a recuperação da soberania monetária e a salvaguarda dos interesses e condições de vida dos trabalhadores e do povo e, ao mesmo tempo, travar a chantagem e a especulação, evitar a fuga de capitais e a perda de divisas e garantir a fluidez do comércio internacional e da vida económica do País.
Uma primeira proposta prende-se com o envidar de esforços para a realização de uma Conferência Intergovernamental para a revogação e suspensão imediata do Tratado Orçamental, a revogação da União Bancária, a revisão do papel do Banco Central Europeu, a abordagem do processo de dissolução da UEM e a criação de um programa de apoio aos países cuja permanência no euro se tenha revelado insustentável. O outro conjunto de medidas visa a criação de estruturas que preparem o País para a saída do euro e para a nova realidade monetária.
Dele faz parte, entre outras, a independência do Banco de Portugal face ao Banco Central Europeu, reassumindo plenamente as funções de banco central; a adopção das medidas necessárias para garantir a circulação e consolidação da nova moeda; a inserção dos actuais depósitos bancários e outras contas na nova realidade monetária; a implementação do regime de câmbio mais favorável, em cada momento, à defesa dos interesses nacionais; a criação de sistemas de regulação de preços máximos em bens e serviços; ou o encerramento definitivo do offshore da Madeira.
Banca ao serviço do País
Um outro grande objectivo do PCP plasmado neste Projecto de Resolução é o retomar do «controlo democrático sobre o sistema financeiro, reconstituindo um poderoso pólo de propriedade pública». Para este efeito, acrescenta-se, serão considerados ritmos e formas diversas de controlo público, como a «eventual aquisição vantajosa de influentes participações na estrutura accionista, a intervenção de emergência ou a nacionalização».
Entre as medidas concretas destaca-se o desenvolvimento de um conjunto de medidas de efectiva supervisão, fiscalização e inspecção «permanentes e minuciosas de bancos e outras instituições»; a implementação de medidas que, a partir do diagnóstico efectuado, «abram caminho a um processo progressivo de controlo público da banca»; a assumpção pelo Estado de responsabilidades de administração directa de bancos e outras instituições financeiras onde tenham sido alocados fundos públicos; a profunda reorganização, a partir do controlo público, dos objectivos, funcionamento e estrutura do sistema bancário «em benefício dos sectores produtivos, dos pequenos e médios empresários, das famílias, das populações urbanas e rurais, da economia nacional e do País».